Superministério da economia pode dar certo, mas submeter ao ruralismo as questões ambientais e climáticas é sair do século XXI
A união de ministérios da área econômica pode dar certo, a dos ministérios da agricultura e meio ambiente não tem essa chance. O superministério da Economia exigirá de Paulo Guedes capacidade administrativa no setor público. Ele só tem experiência no setor privado. Guedes defende Banco Central independente e ao mesmo tempo está falando sobre assuntos privativos do Banco Central. A briga com a indústria pode levar à modernização da economia brasileira, mas só se for bem feita.
O futuro ministro Paulo Guedes precisará de bons quadros nas áreas satélites, capacidade de gestão, foco nas principais tarefas e inteligência na comunicação. Terá que ter habilidade para desarmar as bombas do campo minado que é a administração pública. Além das muitas funções da Fazenda, estarão sob o controle dele orçamento, gestão, planejamento, indústria, comércio internacional. Pode agir como um bom maestro ou ser engolido pela máquina.
Houve duas experiências de superpoderes. Delfim Netto foi o czar da economia e os ministros setoriais se submeteram a ele, com alguns atritos. Na democracia, o mandonismo czarista não funciona. O que dá certo é liderança eficiente. No governo Collor houve a única experiência semelhante à que será tentada agora. Deu paralisia administrativa e uma gestão caótica. Tudo vai depender de como será feito.
O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, superou durante a campanha momentos de estresse no câmbio com operações de swaps cambiais e não se ouviu uma palavra sobre o assunto do ministro Guardia. E isso porque, apesar de não ser independente de fato, o BC tem tido autonomia. O futuro ministro fala que sempre defendeu o BC independente, mas ao mesmo tempo deu entrevistas explicando como administraria as reservas em caso de crise cambial. Essa decisão caberia ao presidente do BC que não pode ficar sob a tutela do ministro, se for mesmo independente.
Paulo Guedes está correto quando fala que a indústria brasileira tema tendência de defender protecionismo e subsídios. Isso é mesmo uma agenda velha e persistente no Brasil. Atravessou incólume períodos autoritários e democráticos. Aqui neste espaço critiquei várias vezes as ideias de proteção e favorecimento de grupos. De fato, como diz Paulo Guedes, a ordem agora é a integração competitiva comas cadeias globais de suprimento. Isso é mais fácil falar do que fazer.
Produzir no Brasil tem um custo alto demais, por causa de impostos, burocracia, custos de capital e de trabalho. Ele tem prometido mudar tudo isso também, mas o que os industriais estão dizendo é que se forem tiradas todas as barreiras abruptamente as empresas podem não aguentar. Da mesma forma, os regimes especiais da tributação. A indústria diz que o risco é ficar sem eles e não ter uma ampla reforma tributária que reduza custos. No caso do velho lobby industrial brasileiro é preciso separar o que é choro do que vale ser avaliado.
Paulo Guedes terá que ter capacidade de separar o que é a trincheira da primeira guerra mundial e o que é reclamação procedente do setor produtivo. O potencial de conflito é enorme, a resistência dos lobbies é imensa. O governo. Temeres tá lutando há um ano para reduzir o subsídio ao xarope de refrigerante na Zona Franca de Manaus.
Juntar os ministérios da agricultura e meio ambiente, contudo, é de um risco extremo e pode ter efeito bumerangue. O país que for visto como desmatador, e atrasado na área ambiental, perderá mercado internacional. Por isso, submeter ao ruralismo as complexas questões ambientais e climática sé pedir para sair do século XXI. Mas essa transição está meio confusa. Abancada ruralista chegou a indica rum deputado do PP, deputado Jeronimo Goergen (PP-RS), para a pasta. Ele já chamou de “terrorismo” as multas do Ibama sobre agricultores e teve forte atuação para que o Congresso perdoasse dívidas do agronegócio no Funrural. O ideal seria a conciliação entre o agronegócio e o ambientalismo.
Mas durante a campanha o que foi dito pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, e os seus assessores sobre o assunto não deixaram margem a dúvidas de que não sequer a conciliação, mas a submissão. Isso sem falar que parte da agenda ambiental é urbana. No início da noite, a informação era que a ideia de junção estava sendo abandonada.
A primeira lição que o governo Bolsonaro terá que aprender, em qualquer área, é quais são os limites legais para a vontade do administrador público. O poder ilimitado ficou, felizmente, no passado.