Míriam Leitão: Do pouco que até agora se sabe

Economistas de Bolsonaro preparam programa em segredo para, se ele ganhar, ser divulgado ao eleitor apenas depois das urnas.
Foto: Reprodução/Facebook
Foto: Reprodução/Facebook

Economistas de Bolsonaro preparam programa em segredo para, se ele ganhar, ser divulgado ao eleitor apenas depois das urnas

O pouco que se sabe do candidato que está na frente das pesquisas já está causando preocupação em alguns empresários. Jair Bolsonaro tem mostrado reservas em relação à China, sem explicar o que isso significa. O país é o investidor estrangeiro mais ativo na economia brasileira com projetos em energia e agora na conclusão do Comperj. O presidente da Vale alertou para a importância do país asiático como parceiro para a empresa e o Brasil. A Unica está preocupada com o abandono do Acordo de Paris. A reforma da Previdência é uma incógnita.

O que se sabe sobre a economia num eventual governo Jair Bolsonaro é excessivamente vago e estamos a 10 dias das eleições. O programa está sendo preparado por grupos temáticos sob o comando do economista Paulo Guedes, mas pouca coisa sai, até porque a estratégia é falar o mínimo possível para não atrapalhar a campanha. O Brasil fica assim na estranha situação de estar prestes a escolher um presidente — ontem ele disse na Polícia Federal que está com a mão na faixa — e sua equipe prepara um programa que será surpresa pós-urnas. Isso se houver concordância entre o candidato e os economistas, coisa que até agora não parece haver. “Não queremos flertar com o desconhecido”, disse ele ontem, mas na economia é exatamente isso que o pacto de silêncio dele e de sua equipe está oferecendo ao país.

Do pouco que se sabe, há esse temor sempre repetido pelo candidato em relação ao investimento chinês no Brasil. A China estaria “comprando o Brasil”, segundo ele. O país é o maior comprador de produtos brasileiros, o maior mercado da soja brasileira, portanto o agronegócio precisa manter essa relação estável e sem ruídos. O presidente da Vale, Fabio Schvartsman, empresa que opera em 16 portos chineses, disse que há uma dependência mútua entre Brasil e China, e que em qualquer governo a Vale continuará tendo uma boa relação com eles. É ao capital chinês que a Petrobras está recorrendo para concluir o investimento no Comperj. A expectativa da estatal é concluir em dois anos as obras da refinaria de Itaboraí, a partir do momento em que fechar o acordo com a CNPC chinesa.

O medo que Bolsonaro nutre pela China remete a um pensamento nacionalista ultrapassado e está em total divórcio com qualquer ideia liberal. Se ela compra uma participação numa hidrelétrica, ou numa refinaria, em que isso nos ameaça? Ela levaria fisicamente as usinas para a China? Qualquer país precisa ter um quadro regulatório estável e transparente para os investimentos, mas discriminar alguma empresa pela origem do capital é um debate resolvido desde que no governo Fernando Henrique, em 1995, foi retirada da Constituição a diferenciação entre empresa nacional e estrangeira.

Os produtores de etanol estão preocupados com a possibilidade de rompimento do Acordo de Paris porque isso reduz as perspectivas dos biocombustíveis, segundo disse a presidente da Unica, Elizabeth Farina. A reação dos usineiros mostra como a economia de baixo carbono tem muito mais aliados do que se pensa.

Em entrevista à “Folha de S. Paulo” ontem, um dos economistas que estão trabalhando para o programa de Bolsonaro, Luciano de Castro, disse que será dada uma guinada de 180º no setor de energia. Esse é um setor que precisa mesmo de muitas mudanças e correções, mas a primeira parte do seu projeto, que é a diminuição da presença do Estado na geração e privatização da Eletrobras, bate de frente com a teoria econômica do galinheiro e do ovo defendida recentemente por Jair Bolsonaro. Ao falar que não quer a privatização da Eletrobras, ele disse que se vender as galinhas do quintal ficará sem o ovo cozido de manhã. Outra parte do programa de energia feito para Bolsonaro é a de manter a política da Petrobras de paridade de preços internacionais, proposta da qual o candidato discorda.

A reforma da Previdência é uma incógnita. A que está no Congresso foi muito criticada e combatida pelo que será o núcleo político de Bolsonaro. Tanto Onyx Lorenzoni quanto Major Olímpio acham que ela é dura demais, quando outros críticos acham o oposto. Afinal, a idade mínima de 62 e 65 anos só estará em vigor em 2038. Se não for feita alguma reforma não há possibilidade de pôr ordem nas contas públicas. O que Bolsonaro tem dito em economia é sobretudo desconexo.

Privacy Preference Center