Resultados do 1º turno mostram que políticos e partidos tradicionais terão que se reinventar
Pouco antes do começo do horário eleitoral, escrevi que, para além da óbvia disputa partidária, estávamos diante de um outro embate da maior importância: o da mídia tradicional contra a internet. Hoje não sei se “embate” é a palavra certa, porque não houve propriamente uma disputa – estamos falando, na verdade, de uma mudança de paradigma irreversível, de uma nova etapa na história da comunicação.
Diante dos resultados de domingo, resta pouca dúvida de que, hoje, a internet é a maior ferramenta eleitoral. Geraldo Alckmin, que tinha um latifúndio de espaço em rádio e TV, e uma das maiores máquinas eleitorais do país, não conseguiu 5% dos votos, ao passo que Jair Bolsonaro, com espaço minúsculo nas mídias tradicionais, quase leva a presidência de primeira, surfando nas redes sociais.
João Amoêdo, desconhecido do público, ausente dos debates, dono de míseros segundos de propaganda eleitoral, conseguiu ultrapassar nomes populares como Marina e Álvaro Dias na reta final, além de Henrique Meirelles, que só perdia em tempo de mídias tradicionais para Alckmin e Haddad.O fenômeno se repetiu, em maior ou menor grau, nas corridas para governador, senador, deputados. A maior surpresa aconteceu no Rio, onde um Wilson Witzel, ignorado pelas pesquisas, mas fortíssimo nos grupos de WhatsApp, foi vitorioso para o segundo turno.
Vai ser interessante observar os desdobramentos desses resultados. O grande motor das coligações espúrias, o tempo de televisão para a campanha, deixa de existir. Os partidos e políticos tradicionais vão ter que se reinventar, e começar a frequentar a internet, se quiserem se comunicar com o eleitor e se manter relevantes.
Com o fim da era da política em televisão e rádio chega ao fim também a era dos marqueteiros bilionários. Eles dão lugar ao pessoal que entende de redes sociais, que almoça e janta dados e se comunica por memes, e ao próprio eleitor, que nunca teve ferramentas tão poderosas ao seu alcance.Facebook e WhatsApp foram os canais preponderantes nessas eleições.
Há muito barulho sendo feito na mídia por conta de fake news mas, pessoalmente, continuo não acreditando que tenham a imensa importância que lhes é atribuída. Elas apenas reforçam o que as pessoas querem ouvir e, no fundo, não têm tanta diferença dos discursos e das promessas dos candidatos, fakes em sua essência desde que o atual sistema político foi implantado.
O que foi a apresentação de Dilma Rousseff ao eleitorado como uma gerente de inquestionável competência se não uma fake news descomunal? A diferença é que, para vender essa ideia, foram gastos R$ 1,4 bilhão, e a embalagem do produto foi feita de acordo com os cânones do marketing convencional, com seu viés de propaganda de margarina.
Dinheiro e poder pré-estabelecido deixam de ser determinantes na campanha, como prova a fragmentação inédita da Câmara. O eleitor tem uma força individual que nunca teve: ele pode influenciar parentes e amigos muito além da mesa de jantar ou dos encontros no botequim da esquina. Estamos diante de um fenômeno desconhecido, mas profundamente democrático.O risco é descobrir que a voz do povo não é a voz de Deus – ou que as intenções de Deus não são exatamente aquelas que esperávamos.