No próximo mandato, o Brasil vai completar 200 anos de vida independente e não há projeto sólido nas agendas dos presidenciáveis para superarmos nossos atrasos
O Brasil não está preparado, nem se preparando, para os desafios das próximas décadas, e os sinais são exibidos pelas pessoas que exercem o poder ou pretendem exercê-lo. A mudança climática já está acontecendo, mas o tema passa batido na agenda, que nesse assunto até retrocedeu. No próximo mandato, o Brasil vai completar 200 anos de vida independente e não há projeto sólido nas agendas dos presidenciáveis para superarmos nossos atrasos. O país está num mar de desemprego e os ministros do STF pedem pelos seus salários.
Na área fiscal, ambiental e de projeto para o país, a visão da maioria das nossas autoridades é pequena ou pelo espelho retrovisor. É urgente o olhar longo à frente. Os problemas são imensos, as propostas de solução, acanhadas. Muitas vezes, equivocadas.
Na área ambiental e climática, o Brasil teve um claro retrocesso desde que, em 2009, na COP-15, em Copenhague, exibiu um número bom de queda de desmatamento e uma atitude ativa de superação dos riscos do país e do planeta. Desde então, pioraram os dados e as atitudes dos governantes. Este está sendo o quarto ano mais quente da história. Os outros três foram nos quatro anos anteriores. A Califórnia enfrenta o seu maior incêndio. Nesses dados se baseou o “New York Times” para publicar, na sexta-feira, uma longa reportagem sobre os perigos deste tempo. “Para muitos cientistas, este é o ano que eles começaram a viver as mudanças climáticas, em vez de apenas estudá-la”, diz o jornal. Um dos cientistas ouvidos, da Nasa, alertou que não é mais o caso de fazer uma chamada de despertar, porque os fenômenos estão acontecendo neste momento com milhões de pessoas no mundo.
No Brasil, a agenda é flexibilizar as licenças ambientais, cancelar multas aplicadas aos desmatadores, reduzir áreas de preservação, subsidiar o diesel e chamar agrotóxico de remédio. Isso sem falar nas propostas do candidato Jair Bolsonaro para os indígenas, que seria prudente não considerar apenas exótico. É perigoso pelo apoio que ele tem.
A economia global pode viver um período de turbulências se o presidente americano continuar com sua guerra comercial. Quando o mundo tem problemas, o Brasil já sabe que precisa estar com indicadores econômicos mais sólidos. Nas contas externas, o Brasil está bem, mas o rombo das contas públicas é alto demais e nos fragiliza. Mesmo se não houvesse problemas externos seria urgente olhar para o nosso precipício fiscal. O Orçamento terá em 2019 o sexto ano de déficit primário, e o novo governante não terá o mínimo necessário para o funcionamento da máquina. Apesar disso, só na última semana dois novos gastos foram criados. O STF aprovou o aumento dos salários dos ministros e isso já desencadeou o efeito cascata. Calcula-se o gasto em R$ 4 bilhões. No Congresso, os parlamentares em passagem relâmpago por Brasília alteraram a MP da dívida rural para, de novo, aumentar a renúncia fiscal de R$ 1,7 bi para R$ 17 bilhões. É uma história longa, que conto de forma curta: a proposta original da renegociação da dívida dos pequenos produtores foi alterada para aumentar os benefícios dos médios e grandes. O governo vetou partes. O Congresso derrubou os vetos. A Fazenda consultou o TCU e decidiu mandar uma nova MP para que o benefício fosse apenas para os pequenos produtores. O Congresso, agora, mudou a proposta e incluiu uma novidade: a redução da dívida alcança até quem não pagar até dezembro. É perdão ao calote futuro.
A população brasileira chegou ao ponto da mais decisiva travessia demográfica. Daqui para diante vai aumentar rapidamente o número de idosos. Basta olhar os dados do IBGE. Diante disso, o país não faz a reforma da Previdência, não estabelece a idade mínima e alguns candidatos a governar o Brasil negam a existência do problema.
Tanto às questões imediatas, quanto às tendências de longo prazo, os líderes do país estão desatentos, quando não equivocados. O nível do debate político de agora, com raras e breves exceções, é uma exibição de bandeiras velhas. Como estará o Brasil ao fim do próximo governo quando completará 200 anos? O futuro deveria nortear os que tomam decisões ou pensam em governá-lo. E o futuro, como dizem os cientistas ouvidos pelo “NYT”, já está entre nós.