Lula venceu o debate por uma espécie de W.O. às avessas. Por estranha estratégia dos candidatos, o PT foi poupado de cobranças sobre o mensalão e o petrolão. Naquele mesmo dia havia acontecido um evento emblemático: o Ministério Público, que o ex-presidente acusa de perseguição, devolveu à empresa mais R$ 1 bilhão desviado da estatal. O partido foi poupado da crítica de o governo Dilma ter provocado a pior recessão do país, ter transformado 16 anos de superávit primário no maior rombo fiscal em duas décadas e iniciado a mais dolorosa onda de desemprego. Dilma foi invenção de Lula mas a ele nada é imputado.
Ele não estava presente no debate da Band, mas as acusações sobre as mazelas do país foram jogadas sobre o “governo atual”. O governo de Michel Temer está no fim, sem força e sem capacidade de alavancar seu candidato, o ex-ministro Henrique Meirelles. Era preciso deixar claro quem nos trouxe a esta situação. A impopularidade de Temer faz dele um alvo tão fácil quanto inútil. Na economia, ele pode ser acusado de não ter conseguido vencer o déficit público e de ter diminuído apenas ligeiramente o desemprego. Mas ele herdou os dois problemas. Como o atual presidente é carta fora do baralho, os candidatos que pretendem confrontar Lula ou Fernando Haddad não podem mais tratar o PT como se ele fosse uma abstração.
Exceto por alguns momentos, os candidatos foram muito fracos e imprecisos ao explicar em nome do que estão concorrendo para dirigir o país. Marina teve um desses bons momentos quando se definiu como “um milagre da educação”. Ao falar do programa da área, defendeu proposta que recebeu do “Todos pela Educação”, um dos vários movimentos que têm tentado aproveitar esse período eleitoral para entregar aos candidatos projetos específicos. Ciro, que tem o que dizer no assunto, acabou facilitando a vida de Jair Bolsonaro no elogio às escolas militares.
Alckmin falou do seu grande trunfo que é ter derrubado o número de homicídios em São Paulo no mesmo dia da divulgação dos dados anuais do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O país tem uma taxa de 30 mortos por 100 mil habitantes, e São Paulo tem a menor, 11,1. A do Rio Grande do Norte é 68. O Ceará teve o maior crescimento de homicídios, 48,6%. Apesar de ter uma boa história para contar, Alckmin soou burocrático e frio diante do tema dramático. Não aproveitou sequer para se contrapor à proposta de Jair Bolsonaro de armar a população. Ele poderia dizer que o Estado, quando faz bem seu papel, pode reduzir esses números. Alckmin precisa ter também uma boa resposta para o crescimento do poder da facção criminosa paulista.
Se não fosse por Guilherme Boulos, do PSOL, o candidato Jair Bolsonaro sairia sem passar por qualquer constrangimento. Foi acusado por Boulos de ser racista, homofóbico e machista e de ter funcionário fantasma pago pela Câmara cuidando de seus cachorros. Bolsonaro devolveu o tempo de resposta. Um erro. Não se devolve tempo, porque cada segundo é uma oportunidade de falar com o eleitor.
A falta de proposta concreta dos candidatos ficou evidente logo na pergunta inicial feita pelo jornalista Ricardo Boechat sobre a primeira ação que tomariam para enfrentar o gravíssimo problema do desemprego. Álvaro Dias, do Podemos, inaugurou as falas e foi o melhor exemplo do desrespeito ao eleitor. Em vez de responder a pergunta, ele falou de si mesmo. Deveria, ao menos, tocar no assunto. Os outros também não deram respostas satisfatórias, preferindo a própria retórica, mas pelo menos chegaram ao tema mesmo que superficialmente.
Meirelles, para falar bem de si e, ao mesmo tempo, fugir de elogio ao governo Lula, disse que o Banco Central nos oito anos em que foi presidente criou “10 milhões de empregos”. Lula foi o vencedor do debate por não ter se desgastado. Fechado numa cela em Curitiba, mantido pelo PT como o candidato ficcional, não teve seu legado atacado. Seu governo acertou na economia ao não destruir, no primeiro mandato, a herança que recebeu. A boa lembrança que evoca é por um crescimento forte de 2010, que, no entanto, se desfez nos anos seguintes, pelos erros da política econômica que iniciou no segundo mandato e pela má gestão da presidente cuja vitória garantiu. O PT deixou o país em recessão, com as finanças arruinadas e o desemprego disparado. E não tem sido cobrado por isso.