O próximo governo vai aumentar impostos. A questão é saber quais e de que forma. Alguns candidatos dizem que não vão aumentar, outros fazem ameaças vagas aos mais ricos. Outros dizem que reduzirão benefícios, o que é, na prática, elevar tributos. O tema é tabu no Brasil. O esforço deveria ser, qualquer que fosse a pessoa eleita, tornar o sistema tributário mais justo, menos confuso.
Alguns candidatos estão falando em taxar dividendos. O Brasil em 1995 optou por taxar mais na pessoa jurídica, deixando os dividendos sem tributação. Existem dois impostos sobre o mesmo fato gerador, o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). Depois o que sobra é transferido para os acionistas em forma de dividendos, e não há imposto. É justo ou não?
Fontes da Receita explicam que é uma forma de tributar e consideram que se tiver imposto sobre dividendos será preciso talvez reduzir a alíquota das empresas. Nos Estados Unidos, Argentina, entre outros países, houve redução do imposto sobre a empresa em si, mas a pessoa física de alto rendimento é mais taxada. Antes, o IRPJ nos EUA era como no Brasil, em torno de 35%.
— Lá atrás ficou entendido se concentrar o imposto na Pessoa Jurídica e deixar o dividendo isento. O problema é que veio a pejotização com lucro presumido, a ampliação do Simples e isso gerou muita confusão — explica-se na Receita.
Alguns candidatos estão falando em combater a “pejotização”. Ou seja, um profissional liberal que, em vez de ser contratado pela empresa, cria uma firma, paga os tributos da Pessoa Jurídica, distribui para si mesmo os dividendos e sobre eles não recaem impostos.
— A questão é que imposto é a alíquota e a base de cálculo, e o lucro presumido ficou até R$ 78 milhões o que é muito alto — explica um técnico.
O que ele está querendo dizer é que, no formato lucro presumido, as alíquotas do IRPJ e CSLL incidem sobre 35% e não sobre 100% da renda da empresa. Como o limite para usar essa forma de pagar impostos é alto, acaba gerando desigualdades. O ideal, se diz na Receita, seria calibrar os impostos para que haja mais igualdade entre o que paga um trabalhador de IRPF e o que tem empresa e recolhe o IRPJ. Para ser justo, no entanto, será preciso considerar duas coisas: as deduções da Pessoa Física e os outros impostos que as empresas pagam.
Há ainda o Simples. Era só para pequenas empresas e ampliou-se o limite. Nos Estados Unidos, o imposto mais leve, tipo Simples, vai até o faturamento de US$ 250 mil. Aqui no Brasil, em torno de US$ 1,5 milhão. Só com o Simples o governo deixa de arrecadar R$ 75 bilhões. Outros R$ 21 bilhões são o custo da Zona Franca. O gasto total da desoneração da folha de pagamentos chegou a R$ 25 bilhões. Se fosse concedido a todas as empresas do país, poderia se reduzir a contribuição previdenciária patronal de 20% para 17,5%, segundo cálculo da Receita.
As renúncias fiscais já estão na casa de 4% do PIB, entre R$ 250 bi e R$ 300 bilhões. Quando o governo deixa de cobrar, está dando para uma empresa, pessoa ou setor um dinheiro que viria para os cofres públicos. Se diminuir o desconto, estará aumentando impostos. Algumas renúncias fiscais são mais injustas do que as outras. Há uma que se chama REIQ, Regime Especial da Indústria Química, que beneficia uma única empresa.
A Receita Federal tem dito que o foco deveria ser essa redução das despesas tributárias. Está certa. Porém, na quinta-feira foi anunciada uma nova despesa tributária para o setor automobilístico, o Rota 2030. Houve intensa discussão dentro do governo, a Fazenda não queria, mas o MDIC comprou o lobby das montadoras. Quando viu que perderia, a Fazenda resolveu reduzir danos. A renúncia fiscal de R$ 1,5 bi ao ano será dada à indústria automobilística, mas ela só poderá descontar no IRPJ e CSLL e não em todos os impostos, como queria. A dúvida que permanece: por que mesmo dar, numa hora destas, mais desconto à indústria que faz carros?
O assunto é complexo, o terreno é árido, mas o debate é incontornável. O governo precisa arrecadar mais e o Brasil precisa ser menos injusto. Algum aumento de imposto haverá no próximo governo. É preciso escolher quem vai pagar mais.
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)