O Globo: Segunda Turma do STF absolve presidente do PT por corrupção e lavagem

Dois ministros votaram para condenar presidente do PT por caixa dois.
Foto: Lula Marques/AGPT
Foto: Lula Marques/AGPT

Dois ministros votaram para condenar presidente do PT por caixa dois

Poe Carolina Brígido e Mateus Coutinho, de O Globo

BRASÍLIA — A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) absolveu nesta terça-feira por unanimidade a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffman (PT-PR), da acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A parlamentar era suspeita de ter recebido R$ 1 milhão em espécie em recursos desviados da Petrobras para financiar sua campanha ao Senado em 2010. O dinheiro não foi declarado à Justiça Eleitoral. No entanto, para a maioria dos ministros, não ficou provado que a petista de fato recebeu os valores.

Além de Gleisi, foram absolvidos por unanimidade no mesmo processo o marido dela, o ex-ministro Paulo Bernardo, e o empresário Ernesto Kugler. Paulo Bernardo foi acusado de ter pedido o dinheiro para a campanha da mulher. O empresário teria sido responsável por pegar a propina com um operador do doleiro Alberto Youssef.

— Não há aqui qualquer vestígio de prova da entrega de dinheiro para os acusados, inexistindo de resto um único registro externo sequer aos depoimentos dos colaboradores — disse Ricardo Lewandowski, completando: — Não vislumbro em suma a presença de elementos externos as delações que possam conferir credibilidade as palavras dos colaboradores.

Dos cinco integrantes da Segunda Turma, dois votaram para condenar Gleisi por falsidade ideológica para fins eleitorais, popularmente conhecida como caixa dois. Para o relator da Lava-Jato na Corte, Edson Fachin, e o revisor do processo, Celso de Mello, ficou comprovado que a campanha da senadora recebeu os recursos. No entanto, o fato não se enquadraria nos crimes citados pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

No entanto, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Lewandowski absolveram a petista dos dois crimes apontados pela PGR e também do crime de caixa dois, apontado por Fachin. Gleisi é a segunda ré da Lava-Jato julgada pelo STF. O primeiro foi o deputado Nelson Meurer (PP-PR), que teve destino diferente: ele foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O relator afirmou que, para configurar corrupção passiva, o agente público deve ter poderes para oferecer um favor em contrapartida. No caso de Gleisi, era ainda não era senadora e tinha passado por um “hiato” na vida pública, entre 2006 e 2010. Portanto, não tinha condições de garantir a nomeação e manutenção de Paulo Roberto Costa em uma diretoria da Petrobras, como diz a denúncia.

— Tenho como provado nos autos o efetivo recebimento de valores no interesse da campanha da denunciada. Nada obstante, tenho por não configurar nos autos o crime tal como descrito na denúncia. A vantagem indevida obtida no delito de corrupção passiva deve estar relacionada com atribuições do agente público. O crime de corrupção passiva exige que a ação do funcionário corrupto seja inequívoca, com o propósito de comercializar a função pública — disse Fachin.

Os ministros absolveram Kugler dos crimes porque, para a Segunda Turma, a prestação de contas eleitorais é de responsabilidade do candidato. Quanto a Paulo Bernardo, não haveria provas de que ele realmente pediu o dinheiro para beneficiar a mulher.

O ministro Edson Fachin, durante sessão da Segunda Turma do STF – Jorge William / Agência O Globo
Gilmar Mendes aproveitou o julgamento para voltar a criticar os investigadores da Lava-Jato no Paraná e as delações premiadas da operação. Ele fez questão de relembrar o indiciamento por corrupção do ex-procurador da República Marcello Miller, que atuou no Grupo de Trabalho da Lava-Jato e é suspeito de favorecer os executivos do Grupo JBS nas negociações da colaboração com a PGR.

— Permanece uma pergunta, que constrange a todos e constrange esse tribunal. Se Miller recebeu dinheiro no caso Joesley, não terá recebido nos outros casos? Isso é altamente constrangedor, nós temos que reavaliar tudo isso, seguiu o ministro, ponderando que a gestão de Raquel Dodge vem adotando novos procedimentos para os acordos de colaboração premiada — disse Gilmar.

Gilmar chegou a afirmar que, com as delações, o STF acabou por alimentar um “monstro”, e que estas situações envolvendo delações premiadas precisarão ser reavaliadas.

O inquérito contra Gleisi chegou ao STF há mais de três anos, com a primeira leva de inquéritos da Lava-Jato. As investigações começaram com as delações premiadas do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Segundo os delatores, Paulo Bernardo pediu R$ 1 milhão a Paulo Roberto para abastecer a campanha da mulher. O dinheiro teria sido entregue por um intermediário de Youssef a Ernesto Kugler, um empresário ligado ao casal. A quantia teria sido repassada em quatro parcelas de R$ 250 mil.

Antes de começar a votação dos ministros, o subprocurador-geral da República Carlos Alberto de Vilhena Coelho reforçou a acusação de que Gleisi praticou corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Para ele, a parlamentar deveria ter “estancado a sangria” da corrupção que tomou conta da Petrobras, mas se omitiu.

— Neste país, o jogo político e democrático consiste em defender a manutenção de determinadas pessoas em cargos da administração pública. Enquanto parlamentar e líder do PT, do qual hoje é presidente, a senadora Gleisi Hoffmann podia, devia ter estancado a sangria que ocorria na Petrobras — disse Coelho na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).

Depois da sessão, os advogados Juliano Breda e Verônica Sterman, que defendem Paulo Bernardo, divulgaram nota comemorando o resultado do julgamento. “O STF fez justiça a Paulo Bernardo, absolvendo-lhe por unanimidade de uma acusação injusta. A decisão tem importância histórica porque comprova o abuso das denúncias construídas a partir de delações sem prova”.

— Desde o início da ação penal, a defesa da senadora apontava a fragilidade da acusação. O Supremo Tribunal Federal hoje reconheceu que não havia qualquer prova contra a Senadora e estabeleceu um marco importante acerca da impossibilidade de condenação de indivíduos apenas com base na palavra de colaboradores premiados — disse o advogado Rodrigo Mudrovitsch, após o fim do julgamento.

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