Seminário “O Brasil em um mundo em transformação” – São Paulo (03/03/2018)
Relatório: Nelson Tavares
Desenvolvimento Tecnológico.
Até pouco tempo, quando se mencionava desenvolvimento tecnológico, a referência era aos seguintes países: E.U.A., Canadá, União Europeia e Japão.
Ainda hoje, os E.U.A. lideram os gastos em desenvolvimento tecnológico. O fato de ainda manter a liderança não significa necessariamente que irá perpetuá-la. A tecnologia não se desenvolve de maneira linear, apresenta “saltos qualitativos”, que dependem apenas em parte dos conhecimentos já adquiridos.
Igualmente, neste segmento, a China tem realizado grandes esforços. Construído infra-estrutura próprias para inovação, inclusive cidades especificamente construídas para isso, e buscando a melhoria de competitividade de suas instituições.
Em seu discurso no XIX Congresso do Partido Comunista Chinês, seu líder, Xi Jinping projetou transformar a China, até 2050, em uma sociedade plenamente desenvolvida industrial e tecnologicamente.
Em seu Plano Quinquenal 2011 a 2016, investiu U$ 1,7 tri. Em 2014, os investimentos em P&D ultrapassaram a marca de 2% do PIB e continuam crescendo, transformando a China no maior mercado mundial de robôs e sistemas de automação.
Próxima ruptura deverá ser o uso de inteligência artificial. Como ressaltou em seu recente artigo a Profa. Dora Kaufman, “a inteligência artificial tem características distintas das tecnologias anteriores, não se tratando de um processo gradativo”. Segundo ela, “a difusão da Inteligência Artificial irá acontecer em uma velocidade inédita, em consequência dos recentes avanços”, e embora tendo por base a tecnologia anterior, proporciona determinada ruptura que não garante aos atuais detentores de tecnologia alguma posição em um “pódio” futuro. A Inteligência Artificial avança de forma tão intensa que se tornou impossível de fazer previsões. Seu impacto mais contundente se dará “no mundo do trabalho”, lançando “homens na obsolescência”.
Não pode deixar de ressaltar também a questão da governança digital global. Os E.U.A. introduziram recentemente medidas que possibilitam a diferenciação entre os usuários da internet.
Com a cada vez mais intensa integração entre Internet, a nuvem e os mercados digitais, torna-se necessário desenvolver gestões para uma maior participação brasileira nesta governança global. Pesquisar e entender melhor as tendências nesse campo é um imperativo para se obter maior participação na governança.
Mudança Tecnológica para Economia Poupadora de Carbono
Começa a existir consenso quanto à necessidade do desenvolvimento econômico acontecer em bases diferentes daquelas do último século, principalmente quanto à emissão de carbono. O Acordo recentemente assinado em Paris traduziu esse avanço.
A diminuição da oferta de fatores de produção (a Terra é finita) via à vis crescentes níveis de produção e de demanda, torna inexorável promovermos, no âmbito das atividades econômicas, a racionalização e a reciclagem de diversos fatores de produção, inclusive o uso água. O uso alternativo de produtos que não ofenda o meio ambiente continuará sendo fator de diferenciação, como o indica o fortalecimento de mercados para esse tipo de produtos
Torna-se importante mencionar que esses processos de mudança na base tecnológica farão parte de um mesmo processo de mudança da base tecnológica.
Impactos do desenvolvimento futuro na Infraestrutura
O novo pólo de desenvolvimento que se expande na Ásia é constituído por países que ainda necessitam de enormes volumes de investimento em infraestrutura. Se adicionarmos a Rússia a esta região, veremos que a necessidade de financiamento será determinante para a realização desses investimentos. Ao contrário do ciclo anterior, que se verificou em países que tinham boa parte de sua demanda atendida, neste novo ciclo tais obras exigirão enormes quantias.
Já estão sendo alteradas as rotas de transporte da produção de matérias-primas e da produção de bens acabados. Os fluxos de investimentos globais também serão redirecionados, e as economias locais sofrerão pressões de concorrência no mercado de seus produtos acabados, tanto na diminuição dos exportados, quanto na participação no mercado mundial, e ganharão ainda mais importância como fornecedores de matérias-primas.
Impacto sobre a economia brasileira
a) Histórico:
Assim como a Constituinte de 1988 foi um marco nas mudanças políticas do país, o primeiro governo eleito diretamente pela população reafirmou a discussão da necessidade da abertura da economia brasileira ao comércio mundial.
Algumas iniciativas do governo anterior – CACEX – já apontavam para essa direção. A consolidação desta posição veio com o debate trazido à tona por um documento da Área de Planejamento do BNDES que cobrava uma “Integração Competitiva” da economia brasileira.
Esse discurso foi apropriado pelo Ministério da Economia do primeiro presidente eleito pelo voto direto. Daí a adoção de um plano de abertura paulatina das importações, com o decréscimo das alíquotas de importações, fim da exigência de elevados índices de nacionalização e o fim de quaisquer proibições de importar. Paralelamente a esse plano, que fazia diminuir as alíquotas em quatro anos, tentava-se assegurar um dólar supervalorizado para que o impacto das importações fosse diminuído. Nesse período o BNDES lançava o maior programa de privatizações, dando prosseguimento a uma diminuição do papel do Estado na economia.
Tínhamos saído de uma hiperinflação ao final dos anos oitenta, mas diversos erros de política econômica fizeram com que ela novamente se apresentasse. Em fevereiro de 1994, o Governo Itamar, tendo o Senador Fernando Henrique Cardoso como Ministro da Fazenda, lança o mais audacioso plano de combate a inflação e, ao mesmo tempo o mais eficaz. Com uma inflação acima de 40% a.m. o governo organiza uma troca de moedas e promove o alinhamento de preços, estabelecendo como moeda, a partir de junho, o real.
Toda energia era canalizada para a estabilização da economia, com a diminuição da inflação para níveis mais compatíveis com os dos países desenvolvidos. Neste sentido, até mesmo uma super valorização do real foi admitida em função da estabilização.
O que auxiliou na contenção da inflação foi o mesmo mecanismo que provocou uma desindustrialização. O parque industrial brasileiro, pouco competitivo, foi seriamente atingido pelo processo de abertura da economia, aliado à valorização do real. Em diversos segmentos, empresas foram fechadas. Cito como exemplo o parque de autopeças.
Ressalte-se a preocupação constante em buscar desempenho fiscal mais equilibrado para o país, entendendo-se que só dessa maneira obteríamos a estabilidade da moeda. Foi um período também de crise em diversos países de maneira que, dada a mobilidade do capital, especulações eram praticadas contra moedas de diferentes países, em especial os países em desenvolvimento.
Chegamos à posse de um novo governo em 2003, em que o eleito prometia a continuidade da política econômica anterior. E assim foi feito nos primeiros anos desse governo. Principalmente em relação as contas governamentais. Isso aliado a um programa de combate a miséria no país.
A diferenciar o novo governo do anterior, em seus primeiros anos, estava a visão da integração à economia mundial. Diferentemente do anterior, o governo que tomou posse em 2003, priorizava a fabricação interna do que ainda era possível. Procurava fornecer créditos subsidiados e exigir nas compras governamentais um elevado índice de nacionalização.
A crise financeira iniciada em 2008, gerada nos E.U.A e repercutindo no mundo, induziu o governo brasileiro a mudar a política de estabilidade fiscal para incentivar a produção. O governo foi bem sucedido nessa política, mas continuou com os incentivos procurando eleger a sua candidata em 2010 e perpetuou essa política para os anos vindouros, afastando-se da estabilidade fiscal.
Houve crescimento rápido da relação dívida/PIB, e o auge dessa política foi o ano de 2014, quando, na tentativa de renovar seu mandato, ainda mais incentivos foram dados na tentativa de manter um nível de atividades positivo. Nesse ano, já apareciam os primeiros sinais da crise.
Embora a candidata tenha sido vitoriosa nas eleições, a situação econômica se complicava. A manutenção do nível de atividades não encontrou o correspondente aumento da demanda. Os primeiros sinais de desemprego e de diminuição de renda pelo aumento da inflação apareceram com intensidade.
De 2014 em diante, a crise econômica soma-se a uma crise política que vai levar a destituição da presidente com a assunção do vice, que assume com um redirecionamento da política econômica, com novas medidas procurando reestabelecer um equilíbrio fiscal.
b) Perspectiva:
A economia brasileira necessita de um ajuste fiscal que traga a dívida/PIB para patamares mais razoáveis. Ao final da década anterior, esta proporção era de cerca de 54%. Hoje é de 76% com perspectiva de crescimento. Problema maior é que necessitamos de um esforço de toda a sociedade para podermos reverter a situação. Sem a aprovação de uma Reforma da Previdência pelo Congresso está reforma se torna quase impossível.
Outra questão importante é nosso parque industrial. Nos últimos anos, acelerou-se processo de desindustrialização do país. Perdemos competitividade no nosso parque manufatureiro. Nossas exportações, em sua maioria, são de fornecimento de matéria-prima. Não podemos pensar que a solução para este problema seja a volta ao passado, fechando a economia. Devemos repudiar a visão que prevaleceu à época da ditadura militar de que tudo poderíamos fabricar internamente e nos auto abastecer.
Não há país no mundo que tudo fabrique. O perfil da indústria no mundo coloca em diferentes países a fabricação de partes, peças e componentes. Parte do crescimento do comércio mundial pode ser explicada por essa divisão do trabalho. As empresas buscam situar parte de suas plantas de produção onde podem ser mais competitivas. Claro exemplo disso são a indústria automobilística, algumas marcas de sucesso e a própria indústria de informática. No país, temos empresas que complementam, em diferentes graus, a produção interna com a importação de produtos e de tecnologia. A indústria aeronáutica é uma delas.
Os diversos acordos internacionais de abertura de mercado apontam para a necessidade de que a fabricação de determinado produto, em parte ou no todo, deve ser realizada buscando competitividade para a exportação. A parte fabricada nacionalmente deve ser complementada com outras partes fabricadas por outros países, sempre buscando a competitividade em preço e qualidade.
Essa abertura internacional demanda nova adequação da arrecadação de impostos a padrões mais compatíveis com o praticado no mundo. É difícil a busca das empresas por competitividade com a estrutura tributária vigente no país.
Não podemos deixar de considerar as mudanças na dinâmica da economia mundial. O Brasil sempre direcionou suas “obras de infraestrutura” visando aos portos existentes no Atlântico. Por questões de competitividade e do desempenho da economia asiática, torna-se necessário buscar saída de seus produtos para portos no Pacífico. Mais do que isso, habituados a realizar negócios com o Ocidente, temos que estar preparados, nos diversos aspectos, para intensificar o comércio “com o outro lado do mundo”, em especial com a China.
Por último, mas não menos importante, a questão da educação e da formação de mão de obra deveria sofrer completa reformulação. A permanência dos alunos na escola por um prazo mínimo de dez anos, a formação e manutenção das escolas técnicas e a própria educação básica não têm condições de serem sustentadas pelos municípios e estados. É preciso aumentar a participação do governo federal.
As universidades necessitam complementar suas dotações federais com a arrecadação própria. É importante dotar as universidades de mais verbas para pesquisa e desenvolvimento sem afetar diretamente o caixa do Tesouro Nacional. Os recursos para bancar essas políticas públicas poderiam provir, em parte, da cobrança daqueles que sempre pagaram pelos estudos no nível básico, mas que hoje querem viver sob a falsa proteção da universidade gratuita.
Deslocamento da importância econômica no mundo para o Oriente:
PIB por Países (US$ bi) | 2.000 | 2016 | % |
China | 1.198,5 | 12.193 | 917,35 |
Japão | 4.731,2 | 5.556 | 17,43 |
Coreia do Sul | 533, 0 | 1.520, 0 | 185,02 |
Hong Kong | 169,1 | 357,0 | 111,59 |
Soma | 6.632,2 | 19.627,93 | 195,93 |
E.U.A. | 9.951,15 | 19.020,5 | 91,13 |
A tabela retrata o que hoje pode ser chamado de polo mais dinâmico da economia mundial. Os países da Ásia apresentam taxas de crescimento bem maiores do que a economia americana neste século XXI, com exceção do Japão. A economia chinesa decuplicou, e apostas mais recentes são as de que, na próxima década, deverá se tornar a maior economia do mundo.
Participaram do Seminário: Ana Stela Alves De Lima, André Amado, André Gomide Porto, Alberto Aggio, Arnaldo Jardim, Benoni Belli, Caetano Araújo, Ciro Gondim Leischsering, Creomar De Souza, Dina Lida Kinoshita, Hercídia Coelho, Jorge Caldeira, Luiz Carlos Azedo, Luiz Paulo Vellozo Lucas, Marco Aurélio Nogueira, Nelson Tavares, Roberto Percinoto, Rogério Baptistini Mendes, Ronaldo Costa Filho, Sergio Besserman, Sérgio Camps De Morais, Tibério Canuto, Andreia Gouveia Felix De Souza, Marco Antonio Félix, Roberto Fukumaru, Roberto Freire, Amilcar Baiardi, Alexandre Pessoa Da Silva, Fábio Leite Franklin De Matos, Antonio De Pádua Chagas, Claudio Gastal.
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