Trump parece assumir estar cansado de ouvir pareceres de conselheiros, entediado com assessores econômicos, jurídicos
Enfileirados no Salão Oval da Casa Branca sob o monumental retrato de George Washington, ali pendurado desde 1800, eram quase 20 os selecionados por Donald Trump para compor sua tropa de choque. Naquele 22 de janeiro de 2017, a cerimônia de juramento coletivo rendeu fotos e fatos.
“Eles formam um time de primeira, vão desempenhar suas funções de forma fantástica. Tenho grande orgulho deles”, anunciara o também calouro 45º presidente. Trump acrescentou um gracejo para consumo dos jornalistas e, portanto, para divulgação nacional: “Vocês ficarão sabendo por mim mesmo se a equipe não trabalhar direito, OK? Vou elogiar se forem bons; e se não forem, eu mesmo vou informar vocês”. Bons tempos aqueles, para os retratados.
Há poucos sobreviventes. Depois de 13 meses de mandato e um estilo gerencial sem cerimônias, de descarte humano, Donald Trump chegou aonde nenhum de seus antecessores ousara chegar: fez praticamente tábula rasa. Está, enfim, mais à vontade para consertar o mundo. “Eu, sozinho, e só eu, consigo resolver”, garantira a seu eleitorado.
Parece assumir estar cansado de ouvir pareceres de conselheiros, entediado com assessores econômicos, jurídicos, diplomáticos ou de comunicação que tenham ideias próprias. Prefere ser seu próprio secretário de Estado, mesmo tendo nomeado um novo semanas atrás. Ao mesmo tempo em que se decepciona com quem está no seu entorno, procura com voracidade por caras novas. O que é comumente descrito como “caos na Casa Branca”, é definido por ele como “uma grande energia renovadora”, um saudável estado de conflito que lhe permite tomar decisões acertadas.
Entre demissionários exaustos, demitidos por tuíte, exonerados com escolta, ou recauchutados para outra função, já passaram pela porta giratória da Casa Branca 49% do time de excelência do juramento coletivo de 2017. Enquanto a maioria de seus antecessores precisou de dois mandatos para promover rotatividade tão alta, a Casa Branca de Trump está em faxina geral desde a inauguração. O atual ocupante não quer ver diluída por Washington a plataforma com que foi catapultado do 26º andar de seu QG na Quinta Avenida para a capital da maior potência mundial.
Esta semana, Trump empossou seu terceiro assessor de Segurança Nacional — o cargo de gabinete mais estratégico para questões de guerra e paz. H.R. McMaster, o general três estrelas defenestrado, havia substituído outro três estrelas, da reserva, pouco mais de um ano atrás — Michael Flynn ficara apenas 24 dias no cargo e hoje responde a processo por perjúrio ao FBI. O novo ocupante do posto é rombudo, para dizer o mínimo. Chama-se John Bolton, foi embaixador de George W. Bush na ONU, onde não deixou saudades, e, mais recentemente, atuava como comentarista da Fox News.
Em questões cruciais como a invasão do Iraque e o que fazer com a Coreia do Norte, Bolton e Trump não parecem feitos um para o outro. Não importa, o comandante-em-chefe gosta do estilo do seu escolhido do momento. Elogiou-o como sendo “um durão que sabe do que fala”. A partir da posse do recém-chegado, no próximo dia 9, o mundo vai acompanhar com interesse o quanto Trump se servirá ou não da retórica de Bolton.
Enquanto o presidente sempre qualificou a guerra iniciada em 2003 como catastrófica e falida, Bolton até hoje defende com ardor incomum a invasão, e considera uma calamidade a decisão americana de retirar as tropas terrestres a partir de 2011.
A posição de Bolton quanto à Coreia do Norte também está muitos decibéis acima do tom recentemente adotado pela Casa Branca. Poucas semanas antes de ser anunciado no novo cargo, Bolton publicou no “Wall Street Journal” um artigo cujo título já dizia tudo: “A legalidade de um ataque prévio contra a Coreia do Norte”. Em palestra recente na Daniel Morgan Graduate School of National Security, de Washington, ele já detalhara a necessidade de um ataque maciço preventivo caso falhem as sanções econômicas atualmente em vigor. Neste caso, será preciso “preciso destruir simultaneamente os sítios de misseis balísticos e nucleares, as bases submarinas, além das instalações de artilharia, morteiros e mísseis instaladas ao longo da fronteira entre as Coreias”. Papo reto, como gosta Trump.
Pelo que se sabe, o presidente só não aprova o bigodão extremo de Bolton. Durante o período de transição, quando currículos e entrevistas para a formação passavam pelo crivo de Steve Bannon, o guru trumpiano da época, Bolton havia sido considerado pela primeira vez para o mesmo posto. Mas Trump achara que ele não tinha o physique du rôle, o bigode destoava do figurino clean apreciado pelo presidente.
A ver, agora, quem vai durar mais: o bigode ou o dono.
Já Rex Tillerson , demitido na semana anterior através de um post no Twitter, tinha a estampa certa para secretário de Estado, além de uma oportuna conexão com Vladimir Putin e status de bilionário. Não bastou. Era posudo e independente demais para o gosto do presidente, jamais houve química pessoal entre os dois homens.
“Rex, coma a salada”, ordenara Trump a seu secretário de Estado durante a visita oficial à China de novembro ultimo. O anfitrião Xi Jinping oferecia uma recepção à comitiva americana e do menu constava uma salada Caesar, em deferência ao visitante. Temeroso de que Tillerson fizesse forfait, deu a ordem que fez a alegria das redes sociais. Trump nunca perdoara o secretário de Estado por tê-lo chamado de “bestalhão” em reunião fechada.
Cada vez mais confiante em seus instintos e avaliações, o Donald Trump de 2018 ruma em direção a seu destino com bússola própria, que só ele sabe decifrar.
* Dorrit Harazim é jornalista