A conjuntura mostra uma aparente assincronia entre os movimentos da política e do eleitorado. Os atores produzem fatos e factoides em ritmo 24 x 7 x 365, para ocupar o noticiário e manter o alvoroço de uma opinião pública que beira a dependência química.
Por enquanto, o eleitor parece não estar nem aí. Não há movimentação substancial nas pesquisas de intenção de voto, como mostrou a CNT (íntegra). Não tem gente na rua. E a Lava Jato vai deixando de ser tema da mesa do bar.
A federação de pequenos (ou não tão pequenos) déspotas, em que o Brasil se transformou, é uma usina de alta produtividade. Tem notícia toda hora, e para todos os gostos e lados.
Um elemento-chave da vitória do PT nas 4 últimas eleições foi a dificuldade de os adversários construírem narrativas com começo, meio e fim. Em 2014, ensaiou-se algo diferente, mas o ensaio acabou soterrado com rara competência. Também, mas não só, pela brutal disparidade de forças a favor do petismo. Foi o canto do cisne.
Este ano, haverá disputa real entre 2 discursos, com outros menos cotados lutando para conseguir uma beirada de atenção.
Teremos finalmente candidatos de direita. Defenderão o capitalismo na economia, o conservadorismo moral e muita dureza contra o crime. Parece que já encantam pelo menos uns 25% do eleitorado. É provável que seja mais.
Se o PSDB mantiver algo de seu tradicional discurso social-liberal, talvez essa aritmética possa ser lida na urna com alguma clareza. É a esperança dos analistas e politólogos mais preocupados em entender que em influir.
Na esquerda, o discurso básico também está pronto. Será o de sempre: a humanização do capitalismo, a proteção do país contra outras ambições imperiais, o protagonismo das lutas identitárias, e políticas públicas para alternativas ao mercado do crime.
Isso tem o apoio de cerca de um terço do eleitorado, autodefinido progressista, em oposição ao dito regressista. O PT quer manter a parte do leão desses votos, mesmo sem Lula. Mas outros se apresentam.
Claro que tudo deverá estar embalado para consumo de massa, com a ajuda das cores vibrantes proporcionadas pela Lava Jato, pela recessão, pelo impeachment, pela crise venezuelana, pela intervenção no Rio e etc.
Espera-se também a entrada em cena dos vários matizes do autodeclarado centrismo, à esquerda e à direita. Que buscarão fazer cada um a sua colagem, escolhendo em cada gôndola o que mais convém. E terão o trunfo do apelo contra o radicalismo.
Há algumas variáveis críticas a monitorar daqui até outubro. Em que proporção o eleitor cansado da política escolherá um candidato? Ou decidirá protestar não votando em ninguém? Em que medida um impedido Lula transferirá votos? O PSDB e o governo/MDB vão se juntar? Se sim, quando? Lipoaspirar Bolsonaro vai ser fácil ou difícil? Como estará a economia na hora da definição do voto? Quem mais, além de Lula, será impedido de concorrer?
Lamento pelos ansiosos.
Se nunca é cedo demais para chutar, ainda é muito cedo para ter as respostas. Você tem paciência para ver séries? Curte apreciar cada episódio ou assiste direto o último?
Encare dessa maneira e o ano será mais leve e divertido. Até porque os episódios desta eleição não estão ainda todos disponíveis na rede. Vai ser semana a semana. Mais para The Walking Dead do que para House of Cards. Inclusive na história e nos personagens.