Em um ano eleitoral, é melhor prestar atenção nas demandas das eleitoras
A desigualdade de gêneros é uma realidade. Mas seria injusto afirmar que o tema é negligenciado por formuladores de políticas públicas, gestores nos vários setores ou acadêmicos.
Existem muitos trabalhos acadêmicos sobre o tema, mas ainda há muita controvérsia sobre o peso relativo das diversas causas da desigualdade de gênero.
Uma área em que a diferença entre homens e mulheres é bem documentada é nas políticas de auxílio às famílias de baixa renda. São muitos os exemplos de que transferir os recursos para as mulheres, e não para os homens, aumenta a efetividade da política pública.
Na política habitacional, a experiência pioneira no Estado de São Paulo foi na gestão Mario Covas (1995-2001), que passou direcionar as moradias para as mulheres, em função da menor propensão a abandonar o lar.
No Minha Casa Minha Vida, 89% dos contratos são firmados pelas mulheres. No Bolsa Família, 93%. A avaliação é que o empoderamento feminino produz um melhor uso dos recursos transferidos.
Alguns críticos apontam que esses programas podem acabar reforçando a responsabilidade das mulheres nas tarefas tradicionais de cuidar dos filhos e da casa. É importante ponderar, no entanto, que o objetivo desses programas não é promover a igualdade de gênero, mas sim a igualdade de renda. Outras políticas devem focar a igualdade de gênero, sendo que envolver as mulheres nas políticas acima aumenta a capacidade de atingir os objetivos almejados.
Tanto é assim que o modelo brasileiro do Bolsa Família foi adotado em outros países com bons resultados.
A pesquisa acadêmica internacional provê evidências de que as mulheres fazem melhor uso dos recursos dos programas de transferências de renda, garantindo maior e melhor alimentação para a família (como na República da Macedônia) e maior poupança e investimento produtivo de mulheres em áreas rurais (como na Zâmbia).
Há também evidências, ainda que menos contundentes, de que o poder de decisão das mulheres é ampliado (Bolsa Família e Progresa/Oportunidades no México).
Na literatura econômica internacional, as pesquisas sobre a desigualdade de salários entre homens e mulheres têm avançado. Há várias evidências de que a maternidade impacta negativamente a produtividade e o rendimento das mulheres. Identifica-se também um menor engajamento e ambição das mulheres.
Não é esperado que as firmas remunerem igualmente seus funcionários nesses casos, pois isso afetaria a sua competitividade. Além disso, tentativas de evitar a queda da remuneração poderão ser contraproducentes ao desestimular o empenho dos demais funcionários (as).
Não deve surpreender a queda da taxa de fertilidade nos diversos países, que tem resultado no envelhecimento da população. Por isso mesmo, alguns países começam a adotar políticas públicas para incentivar a maternidade.
Já a suposta menor ambição profissional das mulheres merece reflexão. Aqui a questão cultural e de educação das meninas ganha peso. Aquilo que parece ser menor ambição pode ser, na realidade, a falta de referências (“role models”) que ajudem as jovens a serem mais competitivas. As pesquisas indicam que mães que trabalham aumentam a chance de a filha de ter sucesso profissional.
Mulheres têm diferentes interesses, habilidades e, muitas vezes, sentem dificuldades para mostrar sua competência. Os departamentos de recursos humanos precisam ser mais sensíveis a essas diferenças na seleção de funcionários e nas promoções.
As evidências não são conclusivas, mas há indicações que a diversidade de gênero ajuda melhorar a performance das empresas. Vale a pena estimular a participação feminina.
Finalmente, vale citar que as mulheres, que já são a maioria no ensino médio e no ensino superior (57% em 2015), também são mais numerosas nas urnas. Foram 6,2 milhões a mais em relação ao número de homens votando em 2014. Além disso, como ensina Fatima Pacheco Jordão, as mulheres são mais criteriosas no voto do que os homens.
Melhor prestar atenção nas demandas das eleitoras. Em um ano eleitoral, é melhor prestar atenção nas demandas das eleitoras.
* Zeina Latif é economista