A decisão do governo federal de intervir na segurança pública do Rio de Janeiro já era especulada, diante da falência total da elite política e administrativa do Rio de Janeiro, que teve no final do ano passado a dramática situação de ter três ex-governadores presos: Sérgio Cabral, Anthony Garotinho e Rosinha Garotinho; o presidente e quatro conselheiros do Tribunal de Contas do Estado; o presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani; o influente ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, além de empresários como Eike Batista e outros, que simbolizaram a quadrilha que se instalou no Estado.
A intervenção já foi cogitada por diversas vezes pelo senador Lindbergh Farias, durante os governos de Lula e Dilma, ex-presidentes que, em diversas ocasiões, exaltaram os governos de Sérgio Cabral e assim, coniviram com o saque ao Estado, que ficou à beira da insolvência absoluta, especialmente após as obras superfaturadas para a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Hoje, com as instituições desacreditadas e as contas falidas, o Rio vê o crime organizado tomar conta do Estado e controlar setores da própria polícia. Diante disso, não há como negar que a intervenção não é um ato despropositado. Algo precisa ser feito de imediato para conter esse câncer que tem o poder do tráfico de drogas para comprar mais poder, como bem retratado no filme “Tropa de Elite 2”, do diretor José Padilha. Não há como as organizações criminosas se desenvolverem a esse ponto sem uma certa cumplicidade do aparelho de estado.
O avanço do crime é um problema do Brasil inteiro, sim, mas é mais evidente no Rio de Janeiro, onde os territórios são disputados pelas organizações de traficantes em verdadeiras guerras que impedem até mesmo as crianças de ir à escolas, por medo de tiroteios e balas perdidas, e criam o caos na cidade em momentos como o carnaval. Por isso, é difícil encontrar naquele Estado quem seja contra uma intervenção. Só no ano passado, 134 policiais militares foram assassinados. Este ano, até quarta-feira, 21, outros 17 policiais haviam sido mortos.
Obviamente que nenhum desrespeito à Constituição deve ser tolerado. Esse tipo de intervenção está previsto na Carta Magna e todos os procedimentos devem ser cumpridos dentro do que diz a lei, com acompanhamento do Ministério Público Federal.
Mas a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro não pode ser considerada apenas uma panaceia, embora tenha, é verdade, um componente eleitoral, já que o governo trocou uma pauta negativa, a reforma da Previdência, que em nenhum momento teve o apoio necessário no Congresso, por uma positiva, o combate à insegurança e à violência. Espero que, também, o governo aja nos outros Estados, apoiando os governadores na luta contra o crime organizado e a insegurança em geral. No levantamento das 30 cidades mais violentas do Brasil, feito pelo IPEA em 2017, por exemplo, o Pará entra com três municípios, entre eles o primeiro colocado: Altamira, com com taxa de 107 mortes para cada 100 mil habitantes, em grande parte, em decorrência da migração desordenada causada por Belo Monte. Outras cidades paraenses destacadas na pesquisa são Marabá (11º lugar) e Marituba (16º lugar).
Em longo prazo, porém, é preciso é repensar todo o sistema de segurança pública, a começar pela valorização do capital humano das polícias, que precisa ser bem remunerado e blindado de cooptação pelas organizações criminosas. O uso de inteligência e de tecnologia nas investigações é fundamental, já que só uma parcela ínfima dos homicídios é desvendada, cerca de 8% em todo o país. Em vez disso, o que o governo federal fez em 2017 foi um contingenciamento de 40% no orçamento das Forças Armadas, essas mesmas que terão que resolver o problema da segurança no Rio. A defesa nacional, responsável pela vigilância das fronteiras, por onde entram a droga e as armas, teve corte de 71% no ano passado, o que provocou a paralisação do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron). Na segurança pública, o contingenciamento foi de 54%.
A intervenção não será a solução estrutural, nem definitiva do problema, que passa pela redução da desigualdade, pelo investimento em educação, em cultura, em esporte, para toda a parcela da população que hoje se encontra marginalizada e que também é refém do tráfico e dos criminosos, mas poderá conter e avanço do crime organizado e reverter a grave situação desse momento.
* Arnaldo Jordy é deputado federal pelo PPS-PA