Míriam Leitão: Volatilidade política

A dez meses das eleições, há tempo para muita mudança no quadro eleitoral porque os processos eleitorais brasileiros são voláteis. Ciro Gomes, Garotinho, Roseana, nas disputas presidenciais, Celso Russomanno e Francisco Rossi, em São Paulo, conheceram esses movimentos que os levaram a ter altos índices de preferência em ondas que quebraram antes. Lula e Bolsonaro são eventos de natureza diferente.
Foto: Ricardo Stuckert
Foto: Ricardo Stuckert

A dez meses das eleições, há tempo para muita mudança no quadro eleitoral porque os processos eleitorais brasileiros são voláteis. Ciro Gomes, Garotinho, Roseana, nas disputas presidenciais, Celso Russomanno e Francisco Rossi, em São Paulo, conheceram esses movimentos que os levaram a ter altos índices de preferência em ondas que quebraram antes. Lula e Bolsonaro são eventos de natureza diferente.

Lula conhece a volatilidade da intenção de votos, nas duas eleições que perdeu para Fernando Henrique. Agora, o que o mantém na liderança é o recall e a campanha que tem feito com sua experiência e a estratégia de fugir da Justiça. Quando ele deixou o governo, o país estava crescendo 7,5% e a inflação era baixa. A recessão foi provocada pelo governo Dilma, mas Lula pode dizer que nos seus oito anos as famílias estavam usufruindo do aumento da renda e do consumo. Principalmente no Nordeste, endereço de 27% do eleitorado brasileiro. Ao mesmo tempo, Lula segue a estratégia de se fortalecer nas intenções de voto para acuar a Justiça. O Judiciário terá coragem de vetar o candidato que estiver na preferência do eleitorado?

Jair Bolsonaro é outro em campanha intensa e isso explica em parte sua pontuação nas pesquisas. Ele tenta usar o sentimento anticorrupção e tem sido beneficiado pelo pensamento de direita extremada que sempre existiu no Brasil, mas que agora se sente liberado para se assumir. Sua tentativa de se apresentar como um candidato liberal na economia não tem qualquer correlação com tudo o que ele disse e votou ao longo da sua vida pública. Ele sempre seguiu às cegas o que foi feito pelo governo militar na área econômica. Às cegas porque Bolsonaro é incapaz de aprofundar qualquer pensamento econômico. Agora, socorrido por economistas liberais, tenta justificar frases como a ameaça de fuzilar Fernando Henrique pelo programa de privatização. Ao contrário do que supõe seu novo guru, Paulo Guedes, a ordem não vai se encontrar com o progresso na campanha de Bolsonaro. E isso porque a ordem autoritária nunca foi capaz de encontrar o progresso no Brasil. Os principais avanços ocorreram na democracia.

Lula pode estar com o nome na urna. Ou não. Se não estiver, será um grande influenciador. A capacidade de transferência de votos é um dos maiores mistérios da política. Lula conseguiu transferir para Dilma, mas jamais elegeu alguém para o governo de São Paulo. Quem atrair os eleitores de São Paulo tem uma grande alavanca, porque o estado representa 22% do eleitorado brasileiro. Lula terá chances — na hipótese de se livrar da Justiça — se conseguir atrair de novo a classe média e por isso está tentando com uma nova Carta ao Povo Brasileiro. Provavelmente uma parte da classe média ele perdeu definitivamente.

O PSDB, que pode ter boa votação em São Paulo na hipótese da candidatura Alckmin, tem uma infinidade de contradições e fraturas a superar. O partido está em frangalhos, o discurso anticorrupção é difícil após o caso Aécio Neves e a maneira como o partido se portou diante dele. Além disso, sua identidade, como partido da modernização econômica, se perdeu em parte nas contradições da atividade parlamentar.

Marina tem as dificuldades de tempo de TV e de clareza do discurso. Em várias votações a Rede atuou como linha auxiliar do PT. O discurso que Marina sustentou em outras eleições foi o de consolidar ganhos de governos do PSDB e do PT para garantir novos avanços. Isso bate de frente com o histórico de escolhas dos seus poucos parlamentares.

O governo acha que pode ter um candidato porque aposta no cenário de melhora da economia no ano que vem. A economia deve melhorar sim, mas não a ponto de produzir um conforto tal que influencie a massa dos votantes a favor de um governo altamente impopular. O ministro Henrique Meirelles se posiciona para ser esse candidato. O mais importante é que ele tome o cuidado de não usar a força da cadeira na qual está sentado para favorecer esse projeto, porque isso seria irregular e comprometeria o pouco de ajuste fiscal que está propondo.

A eleição ainda está longe, todos os candidatos têm problemas, há parcelas grandes do eleitorado sem preferência, as pesquisas captam apenas as intenções. E elas são voláteis.

 

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