Deborah Hana Cardoso | Metrópoles
Defendido pela indústria e pelo setor financeiro e considerado o “filé mignon” das propostas já apresentadas, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Único deverá reunir uma gama de tributos federais, estaduais e municipais em uma única alíquota. O novo governo já sinalizou que pretende retomar as discussões sobre uma reforma tributária no próximo ano.
Os parlamentares, no entanto, discutem duas opções: se seria aplicado o IVA Único, que reuniria todos os impostos em uma única alíquota; ou o Dual, que faria a distinção entre impostos federais e estaduais. “A CNI defende o IVA Único, como alavancador do crescimento econômico no Brasil”, explicou ao Metrópoles o gerente-executivo de economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Mário Sérgio Telles (imagem em destaque).
As pretensões da indústria, porém, esbarram em muitos fatores: governos federal, estadual, municipal; serviços; agro; e população. “São interesses conflitantes, que dificultam a reforma”, avalia Telles.
“Governos, estados e municípios – cada um briga para arrecadar mais. Tem as empresas, que buscam simplificação para pagar menos e ganhar mais; e o consumidor, que quer pagar menos”, explicou Jules Queiroz, doutor em direito econômico, financeiro e tributário pela Universidade de São Paulo (USP).
De acordo com Telles, o governo Lula já fez acenos positivos em relação à pauta. “Há manifestações favoráveis internas dentro do governo eleito, como Simone Tebet e o próprio Geraldo Alckmin. Também existe apoio para a reforma em diferentes níveis, incluindo integrantes do PT e da ala técnica; Pérsio Arida é favorável”, afirma.
“Ela [a reforma tributária] ajudará o Brasil a crescer. Tem efeito na produtividade, simplifica, reduz custos, evita a guerra fiscal”, disse o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), ao jornal O Globo.
Telles foi questionado se o nome escolhido para o Ministério da Fazenda poderia influenciar o andamento da pauta no Congresso. “Não vejo que o próximo ministro seja um problema para o avanço da reforma tributária; é uma pauta que tem um apoio amplo”, declarou.
A reforma precisa andar no período da “lua de mel” do governo, ou seja, nos primeiros seis meses de 2023, quando há popularidade do presidente eleito e “boa vontade” do Parlamento. Outras gestões, inclusive a de Bolsonaro, não conseguiram avançar com a pauta. “O governo de Jair Bolsonaro autossabotou a própria reforma, pois o debate do IVA estava mais maduro, e Paulo Guedes insistiu em uma CPMF”, explicou Telles.
Impostos e federalismo
Especialistas ouvidos pelo Metrópoles consideram que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 110/2019, que pretende criar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), apresenta o texto mais “maduro”. O projeto segue o modelo francês de tributação, que está vigente no país europeu desde 1930 e deve desembarcar no Brasil quase 100 anos depois.
O IVA Único substituiria PIS (Programa de Integração Social), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto Sobre Serviços (ISS). “O IVA, diferentemente da Contribuição Social de Bens e Serviços (CBS), é o filé da discussão.”
A PEC nº 110/2019 une todos os tributos da Federação – não só os federais, como queria Paulo Guedes [com a CBS]”, explicou Jules Queiroz.
“Uma reforma tributária deve tributar o consumidor, e não a origem, o que beneficiaria o Nordeste e o Norte. Mas isso faria o Sul e o Sudeste perderem muito. Isso tem que ser conversado, implementado de forma gradual, para que a Federação seja reequilibrada”, completou Jules.
O popular IVA Único também recebe críticas. “Há preocupação com o federalismo brasileiro, em se manter a autonomia administrativa dos estados e municípios”, disse o advogado tributarista Bruno Teixeira, sócio do escritório Tozzini Freire Advogados. “O [IVA] Dual se adapta melhor às necessidades do federalismo brasileiro”, observou Jules.
“A reforma tem de levar em consideração as desigualdades regionais […]. Há estados que dependem de incentivos fiscais para a manutenção de sua atratividade, como a Zona Franca de Manaus”, finalizou Bruno Teixeira.