A PETROBRAS volta à cena política nacional. Na verdade, sempre esteve. É uma das joias da Coroa, devemos cuidá-la e preservá-la, mesmo se for transformada em uma Empresa de Energia, como sugerido no presente texto. Ela faz parte da nossa identidade nacional, desde a fundação em 1953, quando colocou o Brasil no seleto grupo de países com indústria de petróleo. Desde então, ela foi sempre discutida, defendida e atacada no Brasil e no exterior. Portanto deve ser avaliada permanentemente por toda a Sociedade, além do Estado e do Mercado, considerando as transformações que estão acontecendo na área de energia, particularmente na indústria de petróleo mundial.
As minhas primeiras lembranças sobre a PETROBRAS são familiares: meu pai e seus companheiros do PCB na Bahia, como milhares da geração dele, participaram da campanha o Petróleo é Nosso – o povo nas ruas venceu, com apoio de Getulio e dos militares – não foi pouca coisa.
Ainda, e por isso tudo, a minha escolha profissional quando fui estudar na URSS foi na área de petróleo e gás, de novo a PETROBRAS em minha vida: lembro do entusiasmo que escrevi à sua direção, quando estava iniciando a minha dissertação de mestrado, no início de 1980, em Moscou: queria fazer meu trabalho em uma área que houvesse algum interesse da própria PETROBRAS – a minha frustração foi enorme, nunca obtive resposta do meu bem intencionado gesto.
A vida seguiu e o meu interesse pela Indústria de Petróleo, pela Energia nas suas diversas formas, e a questão ambiental persistem até hoje.
Como avaliar a PETROBRAS? A partir da sua própria história, realidade atual e o que ela e a sociedade brasileira almejam hoje e no futuro próximo – analisando a situação da própria PETROBRAS, da Indústria Mundial de Petróleo e de outras formas de energia: qual a matriz energética que temos e a que queremos ter nos próximos anos, no horizonte de 5, 10, 15, 20 anos?
São questões relevantes a serem enfrentadas para uma melhor compreensão do papel atual e do futuro da maior empresa brasileira e dos sistemas energéticos brasileiros.
A questão energética, particularmente a que envolve a Indústria de Petróleo, caso explícito da PETROBRAS, reflete interesses variados de caráter público e privado, tanto nos países capitalistas industrializados, grupo seleto no qual está concentrado o consumo energético mundial, quanto nos países não industrializados, nos quais vive a maioria absoluta da humanidade, com baixos níveis de consumo de energia.
A maneira como o petróleo e o gás são apropriados da natureza, produzidos, distribuídos e consumidos ainda determina os níveis de bem-estar de uma determinada sociedade e suas inter-relações com a própria natureza. Assim, a escolha nos tempos atuais de um modelo empresarial na área de petróleo e gás é reflexo das distintas realidades nacionais, a partir das potencialidades energéticas de cada sociedade.
No Brasil, a discussão em relação à PETROBRAS deve ser feita com e além da própria empresa, avaliando as demandas existentes da Sociedade em relação à indústria de petróleo e o lugar desta indústria na matriz energética, na economia e na indústria brasileira em geral.
O Sistema PETROBRAS, como o Sistema ELETROBRAS, de BIOMASSA, Solar, Eólico e Nuclear no Brasil foram e são opções construídas a partir de decisões e múltiplos interesses políticos, econômicos e sociais estabelecidos na Sociedade brasileira.
Nessa perspectiva, a PETROBRAS é parte do problema e da solução. A partir dos anos 90, o processo de privatização do Sistema Elétrico e do Sistema Petrolífero e a criação das respectivas agências reguladoras e da própria Agencia Nacional de Petróleo, a ANP, nos anos 90, mudam o funcionamento do Sistema Energético brasileiro.
Desde então, os diversos Sistemas Energéticos, o modelo da Agência Nacional de Petróleo, como também da Agência Nacional de Energia Elétrica, de Biomassa, Solar e Eólica são os responsáveis pela regulação da Política Energética brasileira. Em relação ao funcionamento das Agências reguladoras, constata-se desde a criação, uma forte influência do Executivo federal na definição dos dirigentes e da prevalência dos interesses de conjuntura no funcionamento destas Agências, retirando a necessária autonomia para o cumprimento das suas funções institucionais, de pensar a questão energética com uma visão sistêmica, para atender as demandas energéticas atuais e futuras da Sociedade brasileira.
Institucionalmente, a área energética deveria reestruturar-se buscando a integração dos diversos sistemas (elétrico, petrolífero e gás natural, álcool e bagaço de cana, carvão mineral, lenha e carvão vegetal, solar e eólica), buscando criar mecanismos, construindo novas relações entre o Estado, o Mercado e a Sociedade, que proporcionem uma participação social mais ampla na discussão, formulação e implementação dessa nova Política Energética desejada para o Brasil.
Hoje, quando mais uma vez a PETROBRAS está na berlinda, quais as questões a serem discutidas sobre a empresa? As mudanças a serem realizadas nela devem estar vinculadas a um projeto maior de reforma do Estado brasileiro, a uma política industrial e tecnológica, enfim a um projeto sustentável para o Brasil. Urge a volta de políticas públicas nacionais de longo prazo, particularmente em relação à questão energética e à própria indústria de petróleo.
A PETROBRAS para sobreviver e ser contemporânea do futuro deve se tornar uma empresa de energia, não apenas de petróleo e gás. Discute-se muito e pouco se fez e se faz nesta direção. Aqui as parcerias são fundamentais, algumas estratégicas: a partir de iniciativas da própria empresa, em diálogo com a comunidade cientifica, com outras empresas da área de energia, com as agências reguladoras, com a indústria brasileira e com toda a Sociedade, buscando definir um novo formato dela para atender as demandas atuais e futuras de energia da Sociedade brasileira.
Nesse processo de mudança, no caminho de uma economia de baixo carbono, a PETROBRAS – por tudo que ela representa, pode e deve ter um papel relevante. Em parceria com outras empresas que trabalham com a questão energética no Brasil e no mundo, ela pode desencadear um processo virtuoso na economia brasileira, com reflexos positivos na área social, de educação, científica e tecnológica, possibilitando ao nosso país aproveitar as suas potencialidades e riquezas naturais, nos levando a construção de uma economia de baixo carbono, aproveitando a energia solar, eólica e de biomassa, cada vez mais, na matriz energética brasileira.
Assim, o Brasil e a PETROBRAS devem caminhar juntos no fortalecimento do Sistema dela, reconhecendo a sua importância como empresa e a necessidade de realizar mudanças, transformando-a em uma empresa de energia, contemporânea no presente com o futuro da Sociedade brasileira. A PETROBRAS e a Sociedade brasileira estão desafiadas de juntas colaborarem na construção de um Brasil moderno, afirmando e reafirmando os valores da Democracia, da Cultura, da Educação, da Ciência e da Tecnologia, apontando para um Brasil solidário, com mais inclusão social, respeitando a diversidade e preservando a natureza.
*George Gurgel de Oliveira, Cátedra da UNESCO-Sustentabilidade, da UFBA e do Conselho do Instituto Politécnico da Bahia