Chegou a hora de olharmos para a frente e decidir o que queremos para o Brasil
O ano de 2020 foi doloroso. Um período dedicado ao enfrentamento de uma inesperada e devastadora pandemia, que exigiu respostas para a saúde e medidas econômicas céleres para atravessar um choque sem precedentes em quase um século.
A longo dos meses, os governos aprenderam —alguns de maneira mais eficiente do que outros— a aperfeiçoar os estímulos destinados a salvar vidas, empregos e o tecido produtivo, com resultados palpáveis que mitigaram o estrago previsto quando tudo começou.
O Brasil, entretanto, não aproveitou a parte do segundo semestre que poderia ter sido utilizada para começar a endereçar os problemas mais urgentes do país. Adentramos 2021 sem nem sequer termos aprovado o Orçamento para o ano, consequência das disputas no Legislativo e da falta de interesse do Executivo.
Passadas as eleições para o comando das duas casas, chegou a hora de olharmos para a frente e decidir o que queremos para o Brasil. A conjuntura econômica em que o país se encontra é mais adversa do que no pré-pandemia, fruto da monumental elevação da dívida e do déficit público, ambos necessários para o enfrentamento da crise. Isso significa que as escolhas a serem feitas serão ainda mais duras e necessárias.
O Legislativo precisa recuperar o sopro de reformismo que experimentou durante o governo Temer e o início do governo Bolsonaro. O Executivo deve decidir se tem interesse e comprometimento com o futuro do país e com a agenda econômica apoiada abertamente apenas por parte do governo.
As reformas necessárias estão todas postas, mas, sem a liderança do Executivo em trabalhar a sua agenda econômica junto ao Legislativo e estabelecer prioridades, é difícil acreditar que sejam bem-sucedidas.
No curto prazo, a reorganização das contas públicas e a indicação clara de sustentabilidade para a trajetória da dívida são condições necessárias para a saúde macroeconômica do país. É disso que dependem a construção crível de um programa social mais robusto e inclusivo, a ampliação do espaço para o investimento público no Orçamento e a garantia de que a política monetária poderá atuar sem sobressaltos. Optar pela ampliação pura e simples do endividamento público é a saída mais fácil, e a que escolhemos de maneira reiterada. Suas consequências sempre vêm depois, e não costumam poupar as camadas mais vulneráveis da população.
À prioridade zero soma-se o enfrentamento definitivo da reforma do Estado para dar maior eficiência ao funcionamento da máquina pública e controlar o crescimento de suas despesas, além de atacar privilégios e penduricalhos de uma casta não eleita que se apropriou do poder.
*Antonio Delfim Netto é economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.