Parlamentares das legendas têm indicações no governo Bolsonaro e temem retaliações
Natália Portinari, Paulo Capelli e Bruno Góes, O Globo
BRASÍLIA – A pressão do governo federal com oferta de cargos e verbas e ameaças de retaliação estão por trás do crescimentos de dissidências a favor da candidatura de Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara no DEM de Rodrigo Maia e no PSDB do governador paulista João Doria. As cúpulas das duas legendas acertaram o apoio a Baleia Rossi (MDB-SP).
Entenda: O racha no DEM, que fez Maia cobrar ACM Neto
Maia chegou a dizer nesta semana a ACM Neto, presidente de seu partido, que o DEM corria o risco de ficar conhecido como “partido da boquinha” se cedesse à pressão do governo. Segundo ele, estava repassando o que um empresário havia dito. Neto afirma que há apoio institucional a Baleia, mas não pretende punir dissidentes.
Os apoiadores de Lira nas duas legendas têm diversos cargos no governo federal. Elmar Nascimento (DEM-BA) mantém um indicado na presidência da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco), Marcelo Andrade Moreira Pinto. Arthur Maia (DEM-BA) tem indicações na Codevasf, Incra e Secretaria de Patrimônio da União (SPU).
Paulo Azi (DEM-BA) indicou o superintendente do Incra na Bahia, Paulo Emmanuel Macedo de Almeida Alves. Ele assumiu o posto em setembro do ano passado. José Mario Schreiner (DEM-GO), também contabilizado pelos apoiadores de Lira como um voto no candidato governista, tem um apadrinhado à frente da superintendência da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) em Goiás.
Leur Lomanto Jr. (DEM-BA) tem a indicação de um superintendente do Ibama na Bahia. O próprio ACM Neto é tido como responsável pela recondução de José Carlos Aleluia (DEM) ao conselho de Itaipu.
Cota tucana
Os deputados do PSDB também já tiveram direito a indicações. Adolfo Viana (PSDB-BA) apadrinhou Lucas Maciel Lobão Vieira, coordenador do DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas) na Bahia. O superintendente do Ministério da Agricultura em Goiás é indicado de Célio Silveira (PSDB-GO). Luiz Carlos (PSDB-AP), por sua vez, indicou um coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena.
Reunião com deputados: Bolsonaro diz que espera influenciar na eleição da Câmara
Como revelou o GLOBO anteontem, diversos deputados já foram retaliados pelo governo. Flaviano Melo (MDB-AC), Hildo Rocha (MDB-MA), Fabio Reis (MDB-SE) e Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) perderam seus indicados por apoiar Baleia Rossi.
Além de manter os cargos que já têm, deputados ouviram de Arthur Lira a promessa de que receberão verbas “extra” liberadas pelo governo. Nesse tipo de negociação, o Executivo paga valores para um município indicado pelo deputado de forma informal, e não com emendas parlamentares.
Embora o governo tenha sinalizado que pode pagar R$ 636 milhões em verbas para os deputados, não há como cumprir essa promessa agora, já que o Orçamento de 2021 não foi aprovado pelo Congresso. Arthur Lira, portanto, fica restrito a prometer valores pagos “a prazo”, depois da eleição.
Ontem, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acusou o governo de prometer R$ 20 bilhões em verbas desse tipo, “emendas extraorçamentárias”, em troca de votos. Ele ressaltou, no entanto, que esse seria um valor inexequível para o Orçamento previsto para 2021.
— Pela conta que eu fiz, e pelo orçamento que nós teremos para 2021, pelo que eu já vi que o governo está prometendo junto com o seu candidato, vai dar pelo menos uns R$ 20 bilhões de emendas extraorçamentárias. Eu quero saber em que orçamento para o ano de 2021, com todo o problema do teto de gastos, (terá espaço). (Como) eles poderão cumprir, se vitoriosos, essa promessa? — questionou.
No DEM, há 13 deputados com apoio declarado a Arthur Lira. É preciso 16 para definir a posição na eleição à presidência. Apoiadores de Lira pressionam ACM Neto para que o partido possa aderir ao bloco governista. ACM é resistente à ideia e argumenta que uma “guerra de listas” deixaria o partido desmoralizado.
Disputa: Rossi intensifica atuação para evitar votos em Lira dentro do próprio bloco
Maia tem criticado ACM Neto nos bastidores por não ter agido de forma enérgica para impedir as traições. Para Elmar Nascimento, apoiador de Lira, ACM Neto não deve isso a Rodrigo Maia.
— Ele (Maia) se julga credor de todo mundo. Por que é que o Neto vai fazer um trabalho em prol da candidatura do Baleia, do MDB, quando ele é presidente do partido e tem que enxergar o todo? O Neto já está fazendo demais pelo Rodrigo ficando neutro. O certo era ele ficar do nosso lado.
Dissidência no PSDB
O líder do DEM, Efraim Filho (PB), deve convocar uma reunião para que a bancada debata de que lado quer estar. Assim, evita a “guerra de listas”, mas dá espaço para que os deputados a favor de Arthur Lira virem o jogo.
No PSDB, que terá 29 votantes, o líder do partido, Rodrigo Castro, declarou voto em Baleia Rossi, mas ao menos quatro integrantes da legenda afirmam abertamente que votarão em Arthur Lira: Luiz Carlos (AP), Célio Silveira (GO), Celso Sabino (PA) e Mara Rocha (AC). Há expectativa de dissidências também na bancada mineira. Deputados da legenda ouvidos em caráter reservado avaliam que, apesar do discurso, Baleia deve compor com Bolsonaro em caso de vitória e, por isso, é melhor melhor se antecipar e já costurar essa proximidade com o Planalto.