O Ministério da Economia ficou ausente de questões decisivas para a economia no combate à pandemia. Na vacinação, os economistas poderiam ter induzido a estratégia de comprar mais vacinas e não menos, exatamente para não concentrar o risco. Em tempos de incerteza e de escassez, o certo a fazer é diversificar riscos e ampliar potenciais fornecedores. Em relação ao auxílio emergencial, era fundamental ter um plano para este momento em que as transferências vão secar.
Em conversa esta semana com o economista José Alexandre Scheinkman, ele me chamou a atenção para esse ponto:
— O Ministério da Economia deveria ter alertado o governo que precisava formar um portfólio diversificado. Nós economistas entendemos esse problema de risco e diversificação. O pessoal da saúde pode não pensar nessa estratégia de portfólio. O Canadá encomendou quatro vacinas para cada cidadão, de tipos diferentes. No programa americano também há várias vacinas encomendadas.Esta semana o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta explicou, numa entrevista na Globonews, como o governo errou nas negociações da Organização Pan-Americana de Saúde. Em vez de usar o fato de ser um país grande para aumentar sua capacidade de negociação, o Brasil se apequenou. Primeiro, disse que não entraria no consórcio, depois, que só compraria 10% da sua necessidade. Neste momento está havendo um choque na capacidade de oferta. Mas a equipe econômica se deixou convencer pela ideia de Bolsonaro, de que, por sermos grandes, somos um mercado desejado. Em momento de escassez de oferta e muita demanda, é o oposto.
O Ministério da Economia errou por se manter distante desta crise. E, desde o início, este é também um problema econômico. O equívoco veio de avaliações erradas. As primeiras análises feitas até o começo de março eram que a pandemia não se espalharia no país porque o Brasil seria “um país fechado”. Depois subestimaram a extensão do contágio, os estragos e o custo. Veio daí a já famosa frase do ministro Paulo Guedes de que com R$ 5 bilhões ele venceria o vírus. O custo ultrapassou R$ 600 bilhões. O governo gastou muito e mal.
No fim do ano o cenário com o qual o Ministério da Economia trabalhava era o de que a pandemia estava reduzindo sua intensidade e por isso não seriam necessárias novas medidas de socorro à economia. O indicador que os orientava era o de isolamento social. Como ele caía, concluíam que a economia iria recuperar o nível de atividade, principalmente o setor de serviços. A queda do distanciamento levou a um aumento da infecção. Sucessivas vezes durante esta pandemia a realidade contrariou o cenário no qual apostou o Ministério da Economia. Ele ficou, como se diz no jargão do mercado, todo o tempo behind the curve, ou seja, correndo atrás dos fatos.
Se avaliasse a evolução provável dos eventos com as ferramentas que os economistas têm, o Ministério teria concluído que o governo estava tomando riscos excessivos ao sustentar aquela visão de Bolsonaro de que o STF o impedia de tomar decisões federais de coordenação do combate à pandemia. Esse erro elevou os danos colaterais da crise sanitária.
Nos Estados Unidos, o presidente Biden tomou decisões que mostram como é largo o espaço para a coordenação da União, mesmo numa federação que sempre reconheceu a grande autonomia dos estados e das cidades. Biden convocou a Fema, a agência federal de administração de emergências, para fortalecer a vacinação. A Fema vai montar centros de imunização. Biden determinou que sejam feitas campanhas nacionais, algumas dedicadas exclusivamente às comunidades céticas. Vai fazer campanha pelo uso de máscaras, além de ter obrigado o uso nos prédios federais. O governo federal se ofereceu aos estados e cidades para “desenvolver, equipar, prover gerenciamento de informação, oferecer pessoal e locais” para vacinação. Enfim, a cada ato sensato de Biden, é inevitável ver a inação de Bolsonaro no Brasil e o espantoso custo disso em vidas humanas e perdas econômicas.
A falta de gestão da crise a aprofunda e prolonga. Isso eleva a necessidade de socorro financeiro às famílias e pequenas empresas. As quedas na saúde estão totalmente ligadas às quedas na economia. Por não preparar em tempo um substituto ao auxílio emergencial, o Ministério da Economia está se deixando empurrar para alguma solução que será de novo improvisada.