Luiz Carlos Azedo: Truco no Jardim do Éden

O ministro-relator Edson Fachin está em minoria na Segunda Turma do STF e perde quase todas as votações, embora conheça profundamente as investigações e os processos da Lava-Jato.
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O ministro-relator Edson Fachin está em minoria na Segunda Turma do STF e perde quase todas as votações, embora conheça profundamente as investigações e os processos da Lava-Jato

O truco é muito popular entre paulistas e goianos. Apesar de parecer simples, é um jogo de cartas que exige muita astúcia e possui diferentes táticas, o que complica a vida dos iniciantes. A primeira delas é manipular o adversário. Para isso, o bom jogador precisa ser agressivo, fazer o máximo possível para intimidá-lo. O jogador truca gritando, com objetivo de assustar e prejudicar o desempenho do concorrente durante o resto da disputa. Outra tática importante é escolher bem o parceiro. É preciso ter confiança e química para que possam se comunicar com um olhar. Quando o parceiro é perfeito, metade do jogo está ganho. Conhecer a ordem das cartas também é fundamental para não trucar na hora errada. E, finalmente, ter confiança em si mesmo, para convencer os demais jogadores de que suas cartas são as melhores, mesmo que não sejam. Por isso, o bom jogador nunca reclama do jogo que tem nas mãos, mesmo quando ele é fraco. Se blefar com convicção, ganha o jogo.

A sessão de ontem da segunda turma do Supremo Tribunal Federal (STF) foi como uma partida de truco bem jogada. Por 3 votos a 2, essa turma (chamada de Jardim do Éden pelos advogados) decidiu retirar trechos da delação de executivos da construtora Odebrecht que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva da alçada do juiz Sérgio Moro, do Paraná, enviando esses depoimentos para a Justiça Federal de São Paulo. Os ministros Antônio Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes concluíram que as informações dadas pelos delatores da Odebrecht sobre o sítio de Atibaia e sobre o Instituto Lula não têm relação com a Petrobras e, portanto, com a Operação Lava-Jato. Votaram pela manutenção o relator da Lava-Jato, Edson Fachin, e o decano da Corte, Celso de Mello.

Segundo Toffoli, Lewandowski e Mendes, não há razão para os depoimentos dos delatores serem direcionados a Moro, que é o responsável pela Lava-Jato na primeira instância da Justiça Federal. Essa interpretação pode ter sérias consequências para a Operação Lava-Jato, em especial para os processos aos quais responde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sua defesa, que considera Moro “um juiz de exceção”, já anunciou que fará um pedido para retirar da Justiça Federal do Paraná os processos aos quais o ex-presidente responde. Tanto a força-tarefa da Lava-Jato quanto o juiz federal foram pegos de surpresa e ainda não se pronunciaram sobre a decisão.

Há uma profunda divergência de entendimento entre a maioria da segunda turma do STF e o Ministério Público Federal, uma vez que a delação premiada da Odebrecht tem origem no esquema de corrupção da Petrobras investigado pela força-tarefa da Operação Lava-Jato. Acontece que o ministro-relator Edson Fachin está em minoria na turma e perde quase todas as votações, embora conheça profundamente o andamento das investigações e os autos dos processos da Lava-Jato. O recurso de Lula estava sendo analisado desde março, quando o ministro Toffoli pediu vista e interrompeu o julgamento. Ao retomá-lo, encaminhou o voto que mudou o rumo do processo. O julgamento só não foi relâmpago (durava 20 minutos) porque aguardou o ministro Gilmar Mendes, que estava viajando, chegar ao STF, para desempatá-lo, num voto curto e grosso.

O bem e o mal
A segunda turma é chamada de Jardim do Éden pelos advogados por causa da maioria “garantista” formada pelos três ministros, que votam em bloco. Todas as decisões são na direção de circunscrever a Lava-Jato e conceder habeas corpus, ao contrário da primeira turma, apelidada de “Câmara de Gás” pelos advogados dos réus, porque joga mais duro com os acusados e manda prendê-los. No Jardim do Éden, segundo o relato judaico-cristão, por ordem divina, o homem podia comer os frutos de todas as árvores, exceto os da árvore do conhecimento. Ao desobedecer essa ordem e comer esse fruto proibido, Adão e Eva conheceram o bem e o mal, e do pecado nasceu a vergonha e o reconhecimento de estarem nus.

Os teólogos debatem muito o significado dessa passagem bíblica. Todas as questões morais eram objetivas e não subjetivas. Havia uma moralidade absoluta. Alguém poderia fazer a coisa errada, mas a escolha estaria clara. A árvore cria uma confusão moral. Comer da árvore seria confundir o certo e o errado. Quando Adão e Eva comem da árvore, porém, os sentidos se tornam mais poderosos do que o intelecto e cada pessoa se sente com poderes para decidir por si mesma entre o certo e o errado, e a confusão moral entra no mundo.

A propósito do certo e do errado, a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a condenação do ex-governador Eduardo Azeredo (PSDB) em segunda instância a 20 anos e um mês de prisão. A defesa do tucano pedirá embargos declaratórios, mas isso não muda mais a sentença, e pode recorrer a tribunais superiores. De acordo com a denúncia, o mensalão tucano teria desviado recursos para a campanha eleitoral de Azeredo, que concorria à reeleição ao governo do estado, em 1998. Ele nega envolvimento nos crimes.

 

Nas entrelinhas: Truco no Jardim do Éden

 

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