O PT ganhou as três primeiras eleições presidenciais pelo mesmo placar: arredondando, 60% a 40%. 2014 foi mais apertado, porque no segundo turno a terceira via descarregou em parte no adversário do PT. As três primeiras tiveram resultados bem parecidos, mas as semelhanças escondem diferenças essenciais que ajudam a entender acontecimentos de agora. Como o canto da sereia para Luciano Huck e a intervenção no Rio.
Fernando Henrique bateu duas vezes Lula com boa ajuda dos pobres e do Nordeste. O Plano Real, como o Cruzado de Sarney, provou-se investimento de alto retorno eleitoral. Mesmo em 2002, quando o PT finalmente chegou ao Planalto, parte grande desse estoque foi para o candidato do PSDB. Lula ganhou com forte apoio das camadas médias nos grandes centros urbanos. O PT era então o partido diferente dos outros.
A crise desencadeada pelas acusações/revelações do deputado Roberto Jefferson em 2005 ajudou a operar uma mudança fundamental na coalizão social do assim chamado lulismo. Saíram os grupos do meio da pirâmide antes atraídos pela promessa de “ética”. Entraram os contingentes beneficiados pelo emprego, pelo aumento do salário mínimo e também pelos programas sociais. Tal troca já foi bem estudada e analisada pelos especialistas.
Desde 2006, é essa a aliança social que sustenta as vitórias eleitorais do PT e da esquerda aliada. E, segundo as pesquisas, é o pilar fundamental da resiliência atual de Lula. E da sua capacidade teórica para alavancar outro nome na disputa presidencial. É só olhar os números: se nada for feito, esse estoque de apoio popular levará um candidato da esquerda ao segundo turno, onde ele será competitivo. Nas circunstâncias, seria um feito e tanto.
A conclusão é óbvia. Não bastará a um candidato da direita (ou de seu genérico, o “centro”) recolher os votos do antipetismo. Não foi suficiente antes e não será agora. Ou ela entra firme nos pobres e no Nordeste, ou a situação eleitoral será de risco. De novo, é só olhar os números. Lula não estará na cédula eletrônica, mas confiar cegamente nisso é complicado. Vai que, como em 2010, o eleitorado lulista decide dar mais um voto de confiança ao líder…
Daí a caça a um candidato ou a uma política pública que sensibilizem o pobre e o Nordeste, onde tem mais pobre que a média nacional. O candidato era Luciano Huck, o comunicador de biografia supostamente generosa para os “mais humildes”. Não deu certo. Jamais saberemos se funcionaria. Agora temos a intervenção federal na segurança do Rio. É inteligente, também na teoria. Será que vai funcionar? A resposta, é claro, estará na execução. Como costuma ser.
Adaptando Joãosinho Trinta, quem gosta de discurso sobre como melhorar a segurança pública é intelectual. Pobre gosta mesmo é de segurança pública. É ele quem mais sofre com a falta dela. Esse é um flanco que a esquerda tem imensa dificuldade para fechar, também por cegueira ideológica. A esquerda não deve porém se desesperar. Considerando-se a perícia necessária e a complexidade da operação proposta, a chance de flopar é real.
Sempre há, entretanto, o risco de confiar demais na incompetência alheia. Mas viver é correr riscos.
Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação