Day: novembro 27, 2022

Foto: divulgação | Afropunk Bahia

Afropunk Bahia faz primeira grande edição louvando a cultura negra do Brasil

Pedro Henrique Ribeiro | Omelete

Após a chegada das vacinas da covid-19, os principais festivais de música do Brasil voltaram com força total e Rock in RioLollapalooza e João Rock voltaram a receber o público. Aproveitando o embalo, o Afropunk Bahia decidiu realizar a sua primeira grande edição, com dois palcos e capacidade para cerca de 20 mil pessoas — cerca de seis vezes o número da edição 2021.

O movimento Afropunk nasceu há mais de 15 anos como um documentário sobre o lugar dos artistas negros na cena punk norte-americana. Após a pesquisa para a produção do filme, os criadores perceberam que a solução do problema ia além de denunciar a falta de pessoas negras nos espaços tradicionalmente brancos. Eles então decidiram fazer o seu próprio festival. Originalmente realizado no bairro do Brooklyn, na cidade americana de Nova York, o Afropunk se expandiu e chegou ao Brasil com a cara da cultura brasileira.

Para entendermos melhor as origens do Afropunk Bahia, o Omelete conversou com a diretora de comunicação do festival, Ana Amélia. Na conversa, abordamos o significado do evento para Salvador e para a cultura negra brasileira e o que podemos esperar da primeira grande edição brasileira.

Omelete: Como foi trazer o Afropunk para o Brasil? 

Ana Amélia: Vamos lá! Primeiro, acho que o mais importante é dizer que sempre foi um desejo do Afropunk chegar ao Brasil, na verdade. Não foi o Brasil puxando, embora, obviamente, a gente pudesse fazer isso. Mas os organizadores do Afropunk Global sempre tiveram esse olhar de conectar as diásporas mundialmente. Então, o projeto foi se expandindo. Mas ele [o Afropunk] nasceu como um documentário, há mais de 15 anos para cena punk, quando eles entenderam que a cena punk era muito branca. A partir do documentário, eles viram espaço e nasceu o festival. E esse festival foi crescendo, foi trazendo grandes nome da música e se expandindo. Sempre foi muito importante ter esse olhar no Brasil. 

Por questões internas, eles [os organizadores] acabaram não chegando antes, mas por volta ali de 2018/2019, começaram as conversas com Brasil e o primeiro passo foi escuta. Porque quando a gente está falando da população negra, mesmo que seja mundialmente, são diferentes culturas. O Afropunk gringo chegou no Brasil, montou um grande jantar que a gente fala que foi o “Santo Graal da galera preta”, com nomes diversos do movimento negro, pessoas importantes para diversas áreas culturais, e sentaram para escutar: “e aí, galera. O que é o Brasil? O que é a população preta do Brasil? O que a gente pode fazer para o Brasil? O que a gente pode transformar?” Porque é mais do que um show, né? É um projeto que traz mudanças sociais, que traz várias visões.

E por que ter a Bahia como sede do festival?

Ah! Essa eu gosto [de responder] porque não poderia ser outro lugar. Não poderia não ser na cidade mais negra do mundo fora da África. Chegar no Brasil e não tornar a Bahia a grande sede desse projeto não faria sentido. É a cidade mais negra, é a cidade que tem uma economia criativa gigantesca, mas que nem sempre é aproveitada. A gente tem um foco muito grande dos festivais no país sempre no sudeste no eixo Rio-São Paulo, e é uma das missões do Afropunk fazer economia girar em um local como Salvador. Trazer esses profissionais que trabalham no projeto, nomes tão importantes para cultura, para os grandes festivais. Não precisa se deslocar de Salvador para o Rio ou para São Paulo para conseguir ter seu ápice da carreira. O Afropunk serve também como plataforma para esses profissionais, para construir novas histórias e construir novas narrativas no lugar que é o berço da cultura negra do país. 

Como o Afropunk está impactando a cultura negra no Brasil? 

A gente tem, na verdade, um longo caminho. Quando a gente fala de um festival preto chegando ao Brasil, são várias lutas e etapas a serem vencidas, principalmente quando falamos de algo que envolve renda. Virar os olhares de marcas, os olhares acostumados aos eventos brancos, ao Rock in Rio, ao Lollapalooza… A gente tem que mudar uma estrutura mercadológica de evento para fazer um do porte do Afropunk, em Salvador. Não é em São Paulo, porque se fosse em São Paulo a gente ainda teria dificuldade, mas também teria outras facilidades que em Salvador a gente não encontra. Então acho que o primeiro ponto é esse, a gente fazendo uma Afropunk em Salvador muda uma estrutura de mercado. 

Estamos falando de focar em profissionais pretos. Os profissionais que normalmente não ocupam cargos de liderança [em outros lugares], ocupam no festival. O Afropunk não é a exceção, ele quer transformar em regra. Toda galera que é envolvida, diretora de produção, o diretor criativo, os produtores são sempre profissionais pretos. Esse é o segundo ponto. A gente está mudando também a estrutura [de mercado] desses profissionais. No ano passado, por exemplo, a gente teve trancista, gente envolvida com moda. Pequenos spoilers: a gente vai trazer um pouco de moda, um pouco de gastronomia [preta]. O festival também sempre tem um lado social, no ano passado o lucro foi revertido para três mil pessoas. 

Vocês tiveram apoio público como da Fundação Palmares ou outros órgãos ligados ao governo?

A gente fala que aqui é luta em cima de batalha para fazer acontecer. Obviamente, o setor comercial do festival tem toda uma conversa tanto com marcas quanto com políticas públicas. No ano passado, aconteceu principalmente porque foi abraçado pelas marcas patrocinadoras, né? Então a gente teve três patrocinadores envolvidos. Esse ano também a gente já divulgou a Budweiser, a gente tem mais algumas negociações. Ainda está tendo algumas conversas com outras marcas. Não é o cenário que a gente gostaria de ter, mas a gente acredita que ainda dá tempo [entrevista realizada em 13 de outubro]. É aquela coisa, todo mundo quer quando é hype, né? Quando chega em novembro todo mundo quer projeto preto, mas na hora de coçar o bolso, na hora de fazer o investimento e na hora de entender que o Afropunk que não é só um festival…

Você tá falando bastante da equipe, eu queria saber como funciona essa curadoria para escolher esses nomes?

Então, a gente costuma dizer que é uma grande família que vai se formando. O que a gente mais faz é justamente conectar talentos a projetos. Quando a gente começou a trabalhar com o Afropunk, foi plugando um, conectando o outro… é muito nesse processo porque as pessoas já se conhecem de outros trampos, já estão acostumados a se cruzarem, sair de Salvador, se encontrar em São Paulo. Eles formam aquela família ali, então um vai puxando o outro. A gente obviamente tem alguns processos seletivos e recebe currículo do Brasil inteiro.

Como funciona a curadoria do festival?

E um processo muito coletivo. No ano passado, a gente teve a cantora Larissa Luz assinando a curadoria artística e esse ano justamente como o projeto vai sempre para o coletivo, a gente não tem um curador único, mas um coletivo de pessoas que vão contribuindo. É justamente esse processo coletivo que visa trazer uma line-up que tem a energia do festival. A gente tem gente de fora, tem artistas internacionais, mas o foco também é muito nisso de valorizar nossa arte. Assim que a gente consegue as misturas, ter pagode, funk, gente do Pará, do norte, do nordeste. É uma curadoria feita a quatro, cinco ou seis mãos para ter esse olhar diverso.

O que o público pode esperar do Afropunk Bahia 2022?

O público é a grande estrela Afropunk. O festival é muito mais sobre as pessoas do que sobre um show, é sobre o encontro que acontece no chão. No ano passado, o que era para cem pessoas e acabou se tornando aquele projeto para 3 mil. As pessoas que chegavam ao festival se olhavam e se reconheciam pelas lutas, pelas histórias e pelas redes sociais. Por isso que a gente sempre fala dessa grande roda, desse grande Quilombo, porque acho que o que as pessoas experienciaram é sensação de pertencimento. 

Essa experiência de assistir a um show de Emicida em qualquer lugar do Brasil e assistir a um show de Emicida no palco do maior festival preto do mundo é diferente. Os artistas sobem ali com energia diferente e as pessoas são acolhidas de forma diferente. Então a gente está falando de algo que não é o que costuma existir nos grandes festivais, que têm um grande público branco e constantemente a gente ouve relatos de pessoas pretas que sofreram discriminação ou que não se sentiram pertencentes ao lugar. Acho que é o que a galera pode esperar: isso vezes 20 mil. Porque no ano passado a gente teve 3 mil e já foi incrível, então é imaginar tudo isso numa potência muito maior.

Qual é a expectativa de público para esse ano?

A gente está esperando entre 15 e 20 mil pessoas por dia. O Parque de Exposições é o maior espaço que a gente tem para eventos na cidade, onde Beyoncé já pisou. Então um lugar que já é abençoado pela rainha. É um lugar grande mesmo e a gente está fazendo uma estrutura enorme.

O Afropunk Bahia acontece nos dias 26 e 27 de novembro, no Parque de Exposições de Salvador. O evento será transmitido ao vivo pelo canal Multishow e terá uma edição com melhores momentos exibida na Rede Globo. Entre os talentos confirmados estão os rappers Emicida e Baco Exu do Blues, as cantoras LudmillaMargareth MenezesLiniker e Karol Conká, as bandas Psirico e Black Pantera e muito mais.

Matéria publicada originalmente no Omelete


Cantor Gilberto Gil iniciou a carreira na década de 1960 e é um dos nomes mais festejados da música brasileira - Créditos da foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

"Coisa estúpida", reage Gilberto Gil após ataque por bolsonarista na Copa do Catar

Cristiane Sampaio | Brasil de Fato 

O cantor Gilberto Gil agradeceu aos fãs, neste domingo (27), pelas manifestações de solidariedade recebidas após a hostilidade que sofreu junto com a esposa, Flora Gil, de um bolsonarista durante a Copa do Mundo do Catar. Na última quinta-feira (24), enquanto o Brasil jogava contra a Sérvia, o artista e a companheira foram xingados pelo militante extremista e o caso repercutiu nas redes sociais. O casal recebeu uma série de mensagens de apoio.  

“Nossos agradecimentos, meus e da Flora, por essa solidariedade, essa corrente solidária diante dessa agressão, essa coisa estúpida. Enfim, é o terceiro turno, na verdade. [São] os inconformados querendo manter essa coisa do ódio, da agressividade”, atribuiu Gil, pelas redes sociais.  

Na quinta-feira, o casal estava no Estádio Lusail, onde ocorria a partida, quando foi abordado em um corredor. O bolsonarista insultou Gil e Flora citando palavrões e também a Lei Rouanet, legislação criada na década de 1990 para incentivar políticas culturais e que é alvo frequente de ataques por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL) e apoiadores.

https://www.youtube.com/watch?v=Ap6v2WqzbuI

Quando comentou o assunto, Gil destacou a cultura do ódio, marcante no atual cenário político nacional: “E, amanhã, Brasil de novo. E de novo nossos agradecimentos, meus e da Flora, a todos vocês que se fizeram solidários conosco, nesse episódio que, na verdade, é mais um dessa sequência do ódio, dessa coisa que é o que eles gostam de fazer”.

Além de artistas e internautas em geral, o casal também recebeu manifestações de apoio do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva (PT) e sua esposa, Janja, que se pronunciaram sobre o episódio via Twitter.   

“Ligamos para Gilberto Gil e Flora Gil manifestando nossa solidariedade e indignação pela agressão sofrida no Qatar. Gil é patrimônio da música brasileira e merece todo nosso respeito e reverência. Que o agressor seja identificado e responda pelo seu ato”, disse Janja.

Ao compartilhar a postagem da esposa, Lula acrescentou que “Gilberto Gil é um dos maiores brasileiros da história”. “Nosso solidário abraço aos amigos Gilberto Gil e Flora Gil”, emendou.  

Edição: Thales Schmidt

Matéria publicada originalmente no Brasil de Fato. Título editado


Ônibus na estrada do M'boi Mirim, na zona sul de São Paulo - Rubens Cavallari - 24.jun.22/Folhapress

Tarifa zero nos ônibus avança no país e é debatida por equipe de Lula

Rafael Balago | FolhaUOL

Em 2022, a ideia de tirar a cobrança do transporte público ganha impulso no Brasil. Além de o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), anunciar que analisa a ideia, ao menos 11 cidades passaram a adotá-la e o tema é debatido pela equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"O presidente Lula pode dar apoio a essa ideia. Joguei o tema para ser debatido no grupo de trabalho das cidades. Meu papel é ajudar a convencê-lo da necessidade do direito de ir e vir. Assim como a população tem acesso à saúde gratuita e universal, acesso à educação, precisa ter acesso ao transporte", diz Jilmar Tatto (PT), deputado federal eleito por São Paulo e que integra a equipe de transição de governo.

Ex-secretário municipal de Transportes de São Paulo, Tatto defende a criação de um sistema integrado de mobilidade, a exemplo do SUS com a saúde, em que o governo federal possa enviar recursos para ajudar as cidades a melhorar a estrutura de transportes. Esse sistema incluiria a adoção de tarifa zero.

Uma das questões que poderiam ajudar no avanço da proposta, e que precisa ser resolvida na alçada federal, é a do vale-transporte. Hoje, as empresas pagam o benefício só aos funcionários que usam ônibus e trens. Uma das ideias para custear o passe livre é mudar o modelo: as companhias passariam a pagar ao governo uma taxa de transporte para todos os funcionários, sendo que o valor por empregado seria menor do que o gasto atual com o VT. Assim, haveria um aumento de arrecadação, pois, espera-se, mais empresas passariam a contribuir.

"Isso deve reduzir os custos das empresas que pagam muito VT e aumentar os das que pagam pouco, como os escritórios de advocacia, onde muita gente vai de carro", avalia Sérgio Avelleda, coordenador do Núcleo de Mobilidade Urbana do Insper e ex-secretário estadual de Transportes de São Paulo.

Os especialistas consideram que poderia se criar uma cesta de várias fontes de recursos para custear a ideia, como verbas de cobrança por estacionamento na rua, pedágio urbano, transferências federais e venda de certificados de potencial construtivo.

Até hoje, nenhuma grande metrópole adotou tarifa zero de forma completa, sobretudo porque os custos de manter um sistema para transportar milhões de pessoas por dia são muito elevados. A cidade de São Paulo gastou, em 2021, R$ 3,3 bilhões em subsídios para a rede de ônibus, fora o valor pago pelos passageiros.

A capital paulista, no entanto, já foi pioneira em outras mudanças no transporte. Em 2004, lançou o Bilhete Único, que permite mais de uma viagem com uma só cobrança, em determinado período. A mudança abriu mais possibilidades de deslocamento aos usuários, especialmente das periferias.

Quando o Bilhete Único foi integrado ao metrô, alguns anos depois, o total de passageiros nos vagões teve forte alta, mostrando que havia uma grande demanda reprimida pelo transporte.

Cidades que estão adotando agora a tarifa zero no Brasil também registram forte procura. Em Caucaia (CE), a cobrança foi abolida em agosto de 2021. Desde então, o total de viagens de ônibus passou de cerca de 500 mil para mais de 2 milhões mensais

"É uma transferência direta de renda para a população, que pode usar o dinheiro que gastaria no transporte em outras coisas, movimentando a economia da cidade", diz Vitor Valim (sem partido), prefeito de Caucaia, que tem 360 mil habitantes.

Valim diz que o transporte consome 3,6% do Orçamento e que fez arranjos nas contas municipais para acomodar o gasto, sem criar novas taxas. "Com vontade política, é exequível", considera.

Segundo a NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), há 51 cidades no país com projetos ativos de passe livre no Brasil, a maioria no Sudeste (35). Destas, 12 adotaram a medida em 2021 e 11 em 2022.

No estado de São Paulo, são 17, entre as quais Holambra, Ilha Solteira, Pirapora do Bom Jesus e Presidente Bernardes. Em Ribeirão Pires, a gratuidade vale só aos domingos e feriados. O segundo estado com mais iniciativas é Minas Gerais, com 12.

No Paraná, a cidade de Paranaguá, com 157 mil habitantes, adotou a medida em março. Os moradores e trabalhadores da cidade tiveram de fazer um cadastro para ter direito ao benefício.

Paranaguá tentou criar uma nova taxa sobre as empresas para custear a mudança, de R$ 50 por funcionário, mas a medida foi barrada pela Justiça. A cidade então passou a bancar as passagens com recursos já existentes, como os obtidos com publicidade nos ônibus. As empresas continuaram a ter de pagar VT para os colaboradores. O dinheiro vai para o caixa da prefeitura.

Em Maricá (RJ), a transição rumo à tarifa zero foi mais longa. O processo começou em 2013. A prefeitura optou por criar uma autarquia, a EPT, para implantar a gratuidade. A empresa começou com frota e motoristas próprios, mas hoje também contrata empresas para operar as linhas gratuitas.

No entanto, o serviço grátis foi lançado ao mesmo tempo em que outras, cobradas, continuavam operando. Isso levou os operadores dos ônibus pagos a entrar na Justiça para questionar a mudança, gerando um embate que se resolveu só em 2020, quando os contratos de concessão terminaram. A isenção de tarifa é bancada com recursos de royalties do petróleo.

Entre 2021 e 2022, Maricá ampliou a frota de 50 para 115 ônibus. No mesmo período, o total de passageiros se multiplicou, de 40 mil para 120 mil por dia.

"Antigamente, quem morava num certo distrito não conhecia os outros distritos da cidade, porque não tinha dinheiro para o deslocamento. A economia não girava. Agora, pode-se ir a qualquer área do município, o que melhora muito o desenvolvimento das regiões", afirma Claudio Haddad, presidente da EPT de Maricá.

Já entre as capitais, apenas São Luís (MA) tem um piloto de tarifa zero, oferecida em uma região da cidade e para funcionários do comércio, a partir das 21h, desde outubro do ano passado.

Para as empresas de ônibus, a isenção não traria problemas, porque as prefeituras podem remunerar os empresários pelos km rodados por cada ônibus, em vez de pagar por pessoa transportada, como é comum hoje.

Como o número de passageiros teve forte queda com a pandemia, as empresas que tinham o valor da passagem como principal fonte de renda passaram a ter dificuldades. Elas geralmente não podem aumentar a tarifa sem aval da prefeitura, e o custo político de subir os preços, como 2013 mostrou, pode ser alto. Assim, houve casos no interior do país em que empresas desistiram de operar as linhas, deixando as cidades sem transporte.

"Uma coisa é a tarifa cobrada do usuário, e outra é a tarifa de remuneração das empresas. A nossa preocupação é ter garantias de que a remuneração dos custos operacionais terá continuidade", diz Marcos Bicalho, diretor da NTU. "É importante primeiro trabalhar nas fontes de recurso para depois implementar a política."

"Muitas cidades estão dando subsídio [para as empresas], mas a população não sente diferença. Com a tarifa zero, há transparência para o público e previsibilidade [de receitas] para as empresas", diz Valim, de Caucaia.

51 cidades têm projetos de tarifa zero no Brasil.

Matéria publicada originalmente na FolhaUOL


Foto: reprodução | Julien de Rosa / AFP

ONU: 5 mulheres são mortas por hora por familiar ou parceiro

Farah Bahgat | DW Brasil

Pelo menos 45 mil mulheres e meninas em todo o mundo foram mortas por seus familiares ou parceiros em 2021, afirmou um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) publicado às vésperas do Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, comemorado nesta sexta-feira (25/11).

Segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e a ONU Mulheres, isso significa que mais de cinco mulheres ou meninas foram mortas a cada hora por alguém de seu convívio próximo.

O relatório enfatiza ainda que, embora os números do feminicídio sejam "assustadoramente altos", a verdadeira cifra é provavelmente ainda maior.

Quando o próprio lar não é um lugar seguro

Segundo a ONU, cerca de 81,1 mil mulheres e meninas foram mortas intencionalmente no ano passado.

"De todas as mulheres e meninas mortas intencionalmente no ano passado, cerca de 56% foram mortas por parceiros íntimos ou outros membros da família, (…) mostrando que o lar não é um lugar seguro para muitas mulheres e meninas", concluíram os escritórios da ONU.

O relatório reconheceu que homens e meninos são, no geral, muito mais propensos a serem mortos, representando 81% de todas as vítimas de homicídios. Mas mulheres e meninas são particularmente afetadas pela violência de gênero em suas próprias casas.

O texto acrescentou que o maior número de feminicídios em 2021 foi registrado na Ásia, com uma estimativa de 17,8 mil vítimas. Em segundo lugar ficou a África, com 17,2 mil vítimas registradas, diz a ONU.

'Pouquíssimo progresso'

"As evidências disponíveis mostram que houve pouquíssimo progresso na prevenção de assassinatos de mulheres e meninas relacionados ao gênero", disse o comunicado da ONU.

De acordo com o relatório, os dados da Europa mostraram uma redução de 19% nos assassinatos de mulheres e meninas no ambiente familiar na última década, enquanto as Américas registraram um declínio médio de 6% no mesmo período.

Os lockdowns decorrentes da pandemia de covid-19 foram apontados como um dos possíveis fatores que teriam contribuído para um ano "particularmente mortal" para mulheres e meninas na América do Norte em 2020, disse a ONU.

O relatório observou ainda que os feminicídios registrados no início da pandemia de coronavírus "foram maiores do que quaisquer variações anuais observadas desde 2015".

A ONU disse que, devido à falta de dados, não foi possível traçar uma série histórica na África, na Ásia e na Oceania.

"Ao garantir que todas as vítimas sejam contabilizadas, podemos garantir que os agressores sejam responsabilizados e a justiça seja feita", defenderam os escritórios da ONU.

O órgão apelou também por um compromisso político para a prevenção da violência de gênero. Isso incluiria a introdução de políticas em favor da igualdade entre os sexos, investimentos em organizações de direitos das mulheres e "alocação de recursos suficientes para a prevenção".

Matéria publicada originalmente no DW Brasil


Nas entrelinhas: Menos ambição e mais modéstia

Luiz Carlos Azedo | Nas Entrelinhas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito sem um programa de governo. Sua estratégia de campanha foi resgatar as realizações de seus dois mandatos, o que não foi suficiente para garantir sua eleição no primeiro turno, mas o deixou na cara do gol, no segundo. Para vencer, porém, teve que ampliar ainda mais as alianças e contar com a rejeição ao presidente Jair Bolsonaro, que era maior do que a sua, para se eleger por estreita margem de votos. Sendo mais específico, Lula teve 3,5 milhões de votos a mais no segundo turno; Bolsonaro, 7 milhões. Com toda certeza, a candidata do MDB, senadora Simone Tebet, os partidos que o apoiaram no segundo turno tiveram um papel decisivo nessa transferência de votos. A chamada “terceira via” foi esmagada pela polarização no primeiro turno, mas não a ponto de não fazer alguma diferença no segundo.

O drama de Lula ao assumir seu mandato é cumprir as promessas de campanha, principalmente o Auxílio Brasil/Bolsa Família de R$ 600 mil, que também serviu de plataforma para Bolsonaro junto às parcelas mais pobres da população, embora esse valor não tenha sido previsto no Orçamento da União de 2023. Lula gerou grande expectativa para os eleitores de baixa renda, principalmente as donas de casa, de que garantiria a comida na mesa, com direito a cerveja e picanha no fim de semana. Essa é a lembrança afetiva do seu governo no imaginário popular, como fora o frango a R$ 1 do Plano Real, na eleição de Fernando Henrique Cardoso, em 1994.Mas nada será como antes no 3o. mandato de Lula, como disse na coluna assim intitulada, no domingo passado.

No fim do governo Lula, o país crescia a 7,5% em 2010, segundo dados do IBGE. O consumo das famílias, que se elevara continuamente ao longo dos anos, havia aumentado 7% somente em 2010. O crédito no setor público e privado era farto: chegara a R$ 1,7 trilhão, com crescimento de 20,5% naquele ano. As exportações cresceram 42,2% para o Mercosul, 39,3% para o bloco asiático, 26,2% para União Europeia e 23,2% para o mercado norte-americano. O saldo das reservas internacionais era de US$ 288,6 bilhões, com variação positiva de 20,7% sobre o exercício anterior. A dívida líquida total do setor público fora reduzida de 43,4% para 40,4% do PIB, equivalendo a R$ 1,47 trilhão. A taxa de risco-país ao final de 2010 era atraente para os investidores internacionais: 186 pontos.

A taxa de desemprego e o aumento do salário real garantiram a eleição de Dilma Rousseff, Lula foi sucedido por “poste de saias”, como diziam seus adversários e até alguns aliados. A proporção de desocupados entre os economicamente ativos era de 5,3% em 2010. Ao longo dos exercícios de 2006 a 2010, os rendimentos médios mensais efetivamente recebidos pelos trabalhadores também apresentam contínua elevação. O saldo do registro dos trabalhadores contratados com carteira assinada em 2010 foi favorável. A diferença entre os trabalhadores admitidos e desligados em 12 meses foi de 2,5 milhões, uma evolução de 7,7% a mais do que empregados em 2009.

O porcentual de pisos salariais reajustados acima do índice oficial de inflação em 2010 fora de 93,8%, patamar acima do atingido em 2009, que ficou em 92,9%, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). O segmento mais beneficiado fora o rural, com ganho real em 100% dos casos. Na sequência, apareceram indústria (94,9%) e comércio (94,7%). No setor de serviços, 90,6% dos pisos salariais tiveram ganhos reais, ou seja, percentuais acima da 5,2%, a inflação oficial.

Energia positiva

Esse flashback demonstra que a retomada do fio da história a partir de 2010 é uma missão impossível. As condições são completamente diferentes, como disse na citada coluna. O ambiente econômico não permite que o governo Lula avance na área social como gostariam os seus eleitores; talvez por isso, sendo generoso na interpretação, Lula não tenha apresentado um programa na campanha: nas condições atuais, uma proposta espelhada em 2010 seria delirante; considerando a terra arrasada que herdará de Bolsonaro, decepcionante. Esse é o xis da questão da transição. Os dois primeiros anos de governo, fortemente contingenciados pela economia, serão de baixo crescimento e limitada mobilidade social, com um Congresso à espreita para chantagear o governo e uma oposição de extrema-direita estridente nas ruas

Por isso, o trilho do novo governo Lula não pode ser o progressismo social, por falta de sustentabilidade, nem a agenda identitária da esquerda, devido ao conservadorismo da sociedade. Algum progressismo e avanço nos costumes deve haver, porém, devemos considerar o simples fato de que barrar a ofensiva reacionária do governo Bolsonaro já será uma mudança da água para o vinho. Os trilhos nos quais o novo governo deve e pode avançar são o fortalecimento da democracia, com respeito a suas instituições do Estado democrático, e a ampliação da participação da sociedade nas decisões governamentais, de um lado; e uma agenda ambiental de vanguarda, que aponte fortemente para o desenvolvimento da economia verde, que é onde o Brasil pode captar muitos recursos para investimento numa nova indústria, de outro.

Entretanto, a pressão das desigualdades do país é enorme. Essa agenda precisa ser tratada com foco em tarefas exequíveis, como garantir a segurança alimentar; melhorar a qualidade do ensino fundamental e médio; e combater a violência e o racismo estrutural. O verdadeiro divisor de águas da eleição foi a defesa da democracia. Para isso, é preciso um governo de ampla coalizão política, capaz de dar sustentação ao presidente eleito e uma agenda que devolva a normalidade e a esperança ao país. Essa é a energia positiva que o Brasil precisa para reencontrar seu caminho.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-menos-ambicao-e-mais-modestia/

A sustentabilidade fiscal está relacionada com a sinalização que o governo deve dar, a partir de já, apesar dos furos no teto de 2023 | Foto: Creative commons

Revista online | Sinalizar uma regra fiscal é importante?

Benito Salomão*, especial para a revista Política Democrática online (49ª edição: novembro/2022) 

No momento em que escrevo este artigo, o Ibovespa anda de lado, à espera da definição da equipe econômica, e o dólar beira a R$5,40. O humor do mercado se reverteu subitamente com os movimentos da equipe de transição e a retórica anti-austeridade do presidente eleito. Isso se deu devido à lembrança, ainda muito viva, da herança fiscal dos governos Dilma Rousseff (PT). Lula foi eleito, a partir de uma frente ampla que incorporou muitos não petistas, para salvaguardar a democracia e blindar o retorno da extrema direita em 2026. Do sucesso deste seu terceiro mandato, depende o futuro do país.

Após uma eleição acirrada, o governo tenta, acertadamente, criar no orçamento de 2023 espaço fiscal para acomodar um colchão de amparo social. Ainda não está exatamente clara a magnitude deste colchão. Há dois cenários: no primeiro, se especula despesas extras na casa de R$ 90 bilhões; já no segundo, o pacote pode custar R$ 203 bilhões. A diferença entre ambos os cenários consiste nas despesas que serão incorporadas, ou não, ao pacote. Particularmente, creio que a magnitude do pacote tende a importar pouco se as expectativas sobre a sustentabilidade fiscal de longo prazo estiverem ancoradas.

Veja todos os artigos da edição 48 da revista Política Democrática online

Em outras palavras, numa perspectiva de longo prazo, a sustentabilidade fiscal está relacionada com a sinalização que o governo deve dar, a partir de já, de que, apesar dos furos no teto de 2023, estará disposto a cumprir uma regra para a dinâmica da despesa pública nos demais anos da legislatura. Ao sinalizar uma regra, o governo resolve o problema da inconsistência dinâmica, dando aos agentes informações acerca do problema fiscal no decorrer do mandato. Contrariamente, ao não fazê-lo, o governo sinaliza maior discricionariedade de longo prazo, e os agentes precificam isso, trazendo, a valor presente, a probabilidade de uma piora na área fiscal.

Não se trata de mero fiscalismo. Há formas de conciliar responsabilidade social e fiscal. As economias modernas dependem do estado geral das expectativas. Estas, por sua vez, são estados psicológicos subjetivos que respondem tão melhor às políticas econômicas quanto mais credibilidade o governo tiver. Lula foi eleito com mais de 60 milhões de votos. Mudanças de governo são excelentes oportunidades para revisão de expectativas, em geral, para melhor. A janela de otimismo com o novo governo tende a ser tão maior quanto maiores forem seus acertos.

Se o governo eleito sinalizar uma regra fiscal já na transição, se comprometendo com uma dinâmica realista do gasto, particularmente o obrigatório, independentemente das tecnicidades, há espaço para a valorização do câmbio, o arrefecimento da inflação, a queda dos juros e, consequentemente, do custo de rolagem da dívida.

Confira, a seguir, galeria:

ICMS o que é como funciona e o que muda com a nova regra | Foto: QuoteInspector
Gráfico da ibovespa | Foto: QuoteInspector
Faixada do Ministério da Economia | Foto: reprodução
Cartão bolsa família | Foto: Agência Brasil
Como a queda da bolsa de valores afeta o Brasil | Foto: Reprodução
Presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, preside sessão que analisa veto sobre orçamento impositivo | Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Gráfico: Economia/g1 Fonte: IBGE
Macroeconomia | Imagem: TarikVision/Shutterstock
Reg. 050-21 Dinheiro. Moedas de Real. 2021/10/86 Foto: Marcos Sa
ICMS o que é como funciona e o que muda com a nova regra
Gráfico da ibovespa
Faixada do Ministério da Economia
Cartão bolsa família
Como a queda da bolsa de valores afeta o Brasil
Presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, preside sessão que analisa veto sobre orçamento impositivo
Gráfico: Economia/g1 Fonte: IBGE
Macroeconomia
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Reg. 050-21 Dinheiro. Moedas de Real. 2021/10/86 Foto: Marcos Sa
ICMS o que é como funciona e o que muda com a nova regra
Gráfico da ibovespa
Faixada do Ministério da Economia
Cartão bolsa família
Como a queda da bolsa de valores afeta o Brasil
Presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, preside sessão que analisa veto sobre orçamento impositivo
Gráfico: Economia/g1  Fonte: IBGE
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Isso funcionou em 2016, com o teto de gastos, levando a uma redução do custo implícito da dívida pública, que havia recuado de 13,1% para 9,9% nos 12 meses seguintes. Funcionou, ainda, em 2020, no contexto pandêmico, com a aprovação da PEC do orçamento de guerra que autorizava o governo ampliar os gastos o quanto necessário para fazer face às novas despesas. O contrário também é verdadeiro, os governos Dilma e o segundo biênio de Bolsonaro mostraram o quão desastrosa é para o equilíbrio macroeconômico do país a expansão discricionária de despesas públicas à revelia dos protocolos fiscais.

Infelizmente, os sinais da transição até aqui não foram bons nesse campo. O governo trouxe para a transição uma equipe econômica demasiadamente heterodoxa, afrontando o mercado com o uso de uma retórica contra sustentabilidade fiscal e tentando tirar o Bolsa Família permanentemente do teto de gastos. Sobre este último tópico, a saída do programa de transferência de renda do teto é um péssimo sinal, pois abre margem para o recorrente uso eleitoreiro do programa; além de permitir espaço no teto para ampliação de gastos obrigatórios que são contraproducentes do ponto de vista dos efeitos multiplicadores sobre o PIB.

A curto prazo, é perfeitamente possível acomodar maiores despesas sociais, independentemente da magnitude, se o governo eleito sinalizar um compromisso formal com o lado fiscal. 

Sobre o autor

Benito Salomão é economista e doutor em economia pelo Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia (PPGED-UFU).

** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de novembro de 2022 (49ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Arte: João Rodrigues/FAP

Gabriela Cruz: “Ações afirmativas nas instituições faz parte da luta antirracista"

João Rodrigues, da equipe da FAP

Após discutir temas como as conquistas do movimento negro, mulheres pretas na política e o combate ao racismo estrutural, a série de entrevistas em celebração mês da Consciência Negra chega ao seu quarto e último episódio. No programa anterior, o convidado foi o professor Ivair Augusto Alves dos Santos.

Para analisar a luta contra o racismo institucional, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) recebe Gabriela Cruz, presidente nacional do Tucanafro e integrante da direção da Federação PSDB-Cidadania. Ela é especialista em Educação e foi secretaria de Ações Afirmativas do Ministério dos Direitos Humanos - SEPPIR - Governo Federal.



A ampliação de pessoas negras em outros campos e estrutura de poder da sociedade, os caminhos para o protagonismo dos estados e municípios na luta antirracista e as perspectivas com a recriação do Ministério da Igualdade Racial também estão entre os temas do programa. O episódio conta com áudios do programa “Racismo estrutural e racismo institucional”, do canal oficial do Carrefour Brasil no Youtube, e do site oficial do Olodum.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google PodcastsAnchorRadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues.

RÁDIO FAP