Day: novembro 24, 2022
Revista online | Por um programa para os batalhadores e um horizonte para o país
Carlos David Carneiro*, especial para a revista Política Democrática online (49ª edição: novembro/2022)
Em 2018, o Brasil elegeu presidente, como outsider, um deputado que, há décadas no Congresso Nacional, demonstrava ser grotesco em posicionamentos e, no mínimo, medíocre em termos de ideias. Um de seus possíveis méritos? Ter vocalizado, ainda que de modo difuso, as frustrações de setores da sociedade que aqui chamarei, acompanhando o sociólogo Jessé Souza, de “batalhadores”. Entender as frustrações deste segmento e dialogar com elas parece ser uma tarefa necessária para que o desastre de 2018 possa enfim ser superado.
Mas de quem, afinal, está se falando? Com certa simplificação e afastamento do emprego original do termo, tratam-se das classes trabalhadoras brasileiras, com renda superior, no entanto, aos 25% mais pobres. Em 2020, sob a coordenação da antropóloga Esther Solano e da cientista política Camila Rocha, a pesquisa “O conservadorismo e as questões sociais”, ajudou a destrinchar as visões de mundo de parte deste segmento (a moderadamente conservadora e residente em grandes metrópoles), oferecendo ao país informações valiosas para a compreensão das tarefas presentes.
Entre as conclusões da pesquisa, que entrevistou em profundidade 120 batalhadores residentes em quatro metrópoles, apontou-se um sentimento recorrente, sobretudo entre os evangélicos, de “decadência social”, ligada à crise de valores como ordem e hierarquia. Foi constante, nessa chave, a preocupação com a “educação moral” das crianças e jovens.
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A pesquisa também concluiu que há muita frustração e revolta com a violência, o que levaria a um sentimento de perda do espaço público e insegurança mesmo no âmbito privado. Em relação ao poder público, haveria, segundo as autoras, sentimentos de abandono, “de inutilidade, descartabilidade, vulnerabilidade e insegurança”.
No plano do trabalho, as autoras identificaram uma relação ambivalente dos batalhadores com o “empreendedorismo”. Entre os mais jovens e mais estáveis, este aparece como forma de complementar a renda, e/ou mesmo de trabalhar de forma flexível e sem patrões. Já para as pessoas mais pobres, o “empreendedorismo popular” seria “uma forma de sobrevivência para a qual se é empurrado por uma situação econômica muito ruim”.
Descontadas as ideologias presentes nos discursos, tratam-se de demandas justas e, muitas vezes, necessárias. Ocorre que hoje há uma certa dificuldade do que se chama de “esquerda”, em dialogar com elas. Se, de um lado, um certo economicismo tende a subsumir as frustrações a uma questão de “crise econômica”, por outro, certas referências intelectuais têm dificultado que a imaginação programática se volte aos anseios dos batalhadores. Comecemos pelo segundo ponto.
A “crítica”, como amálgama de uma pletora de ferramentas intelectuais, parece ter tornado seu próprio exercício no “horizonte último” das possibilidades políticas. Se esse tipo de expediente confere alguma vantagem em termos de “não se deixar enganar”, as contradições encontradas na sociedade deixam de ser vistas como produtivas e a moralidade imanente ao tecido social deixa de ser fonte de energia transformadora para se tornar apenas fonte inesgotável de autoengano.
Quanto ao economicismo, certamente um ponto central de enfrentamento ao “mal-estar” dos batalhadores, assim como ponto central de um projeto nacional, consiste em desenvolver uma economia de alta produtividade e ocupações de qualidade. É preciso, no entanto, situar este projeto no tempo. Mesmo se hoje fizermos tudo o que precisa ser feito e, em alguns setores, inclusive por conta disso, ainda teremos, durante anos, amplos contingentes da população excluídos do trabalho de ponta. Nesse sentido, a convivência com a realidade do “empreendedorismo”, desejado ou por necessidade, será duradoura, queiramos ou não.
O que fazer? Apesar de resgatar linhas de crédito e pautar a questão do endividamento sejam bons começos, já sinalizados pelo novo Governo Lula, é preciso ir muito mais além. É preciso pensar em um Estado para os batalhadores. Certamente, uma estratégia nacional de desenvolvimento jamais poderá ser baseada em negócios muito pequenos. Mas é possível pensar em formas permanentes de capacitação de batalhadores e organização de seus negócios, seja na condição de programas sociais ou como estratégia complementar de desenvolvimento.
O encontro entre velhas e novas ferramentas, como o fomento ao cooperativismo (e agora o de plataforma), organização de hubs tecnológicos periféricos, escritórios de auxílio a pequenos negócios (como Sebraes flexíveis) e organizações de redes de negócios são alguns dos caminhos possíveis, ainda que longe de serem os únicos.
Também, para além do economicismo, considerando a já mencionada autonomia, ao menos relativa, das diversas esferas da vida em sociedade, é preciso levar a sério as experiências de humilhação, descarte e insegurança dos batalhadores. Nesse sentido, é preciso avançar na consolidação dos sistemas de proteção, expandir a transferência de renda para jovens com a condicionante de conclusão do ensino médio e repensar a transição da escola para o mundo do trabalho. Na segurança, não é possível perder mais tempo. Um caminho de combate efetivo aos homicídios, por exemplo, já foi dado por experiências estaduais exitosas baseadas em políticas integradas em territorializadas.
Confira, a seguir, galeria:
Por fim, no plano cultural, é preciso acabar com os preconceitos em relação a uma “política dos valores”. Afinal, não se luta pelo que não se ama e nem se comunga quando nada se tem em comum. Muitas são as formas de promover, encarando tensões e diferenças como contradições produtivas, a ideia de um destino e de uma brasilidade comuns. Aliás, um pouco mais de apreço à tradição histórica dos oprimidos, seus partidos e movimentos seria o suficiente para nos curar do veneno da iconoclastia neste campo.
É possível, assim, dialogar com o espírito dos batalhadores sem se prostrar a ele. Se fechar a este diálogo, por outro lado, é continuar dançando na beira do abismo, em um momento no qual não temos mais o direito de errar.
Sobre o autor
*Carlos David Carneiro é doutor em Direito pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), consultor legislativo da Câmara dos Deputados e foi pesquisador visitante na Harvard Law School.
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de novembro/2022 (49ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.
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Política de preços é do governo, diz senador cotado para Petrobras
Flávia Said*, Metrópoles
O senador Jean Paul Prates (PT-RN), integrante do grupo técnico (GT) de Minas e Energia na equipe de transição, afirmou nesta quinta-feira (24/11) que a política de preços dos combustíveis é do governo federal, não da Petrobras. Prates é cotado para assumir o comando da empresa na terceira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Essa política de preços não é da Petrobras. Política de preços é do governo. Então, vamos começar a separar bem essas coisas. Petrobras vai fazer a política de preços dela, dos clientes dela, para o volume, para a qualidade de clientes, enfim, como qualquer empresa vende”, enfatizou o senador.
Prates deu a declaração ao chegar às instalações do Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB), para reunião do subgrupo de petróleo, gás natural e biocombustíveis, do qual é relator.
“Quem vai dar a política de preços em geral, para o Brasil, se vai ter de alguma forma algum ‘colchão de amortecimento’, conta de estabilização, preço de referência etc., sem absolutamente falar em congelamento, nenhum ato forte desse sentido interventivo, é o governo brasileiro. Então, o governo é uma coisa, a Petrobras é outra”, prosseguiu.
Prates disse que, na sexta-feira (25/11), terá reunião virtual com o atual presidente da companhia, Caio Mário Paes de Andrade, e, no próximo dia 5, ele deverá ter um encontro presencial.
Interação com a Petrobras
Desde a campanha, Lula falava sobre sua intenção de alterar a política de preços da Petrobras, além de aumentar a quantidade de refinarias e a intervenção dentro da empresa.
O petista defende retirar o pagamento em dólar, para que o preço seja baseado no custo de produção, não nos valores internacionais.
“Pretendo mudar a política de preço da Petrobras. Ela tem que ser em função dos custos e gastos reais do povo brasileiro. Essa história de internacionalizar [o preço] é para agradar acionistas, em detrimento de milhões de brasileiros”, disse Lula em julho, na pré-campanha.
Atualmente, a Petrobras pratica o Preço de Paridade de Importação (PPI), em que são considerados os custos totais para importação. O valor é calculado com base no preço de aquisição do combustível, mais os custos de sua entrega, incluindo transporte e taxas portuárias.
*Texto publicado originalmente no portal Metrópoles
4 fatores que impedem que Brasil vire potência no turismo apesar do potencial
Shin Suzuki*, BBC News Brasil
Alguns dos elementos mais associados ao Brasil — belezas naturais, grande diversidade cultural, calendário rico em festas nacionais e regionais — valem ouro em qualquer roteiro de viagem. Mas o grande potencial do país não se traduz em números de destaque no mercado mundial de turismo. Um estudo analisou fatores que emperram o desenvolvimento nacional da área.
O futuro do turismo no Brasil a partir da análise crítica do período 2000-2019 contou com 23 pesquisadores de 17 instituições brasileiras.
A investigação observa que, mesmo durante o boom do turismo internacional na década passada, o Brasil estacionou em pouco mais de 6 milhões de visitantes estrangeiros por ano.
Nesse período, o país ainda teve a rara oportunidade de sediar uma Copa do Mundo e uma Olimpíada no espaço de dois anos, mas o crescimento entre 2014 e 2019 foi ínfimo: uma alta ligeira (que também pode ser vista como estagnação) de 6,31 milhões para 6,35 milhões.
O Brasil não figura nem na lista da Organização Mundial de Turismo dos 50 países com mais chegadas de turistas.
Os dados são relativos a 2019, ou seja, antes da chegada da pandemia de covid. Em todo o mundo, o setor sofreu fortemente os impactos da quarentena e tenta agora ensaiar uma recuperação.
Para efeito de comparação, uma única localidade do Vietnã, a Baía de Ha Long, recebeu quase o equivalente aos números totais do Brasil: 6,2 milhões, de acordo com o Euromonitor. O Vietnã, como um todo, contabiliza 18 milhões de viajantes internacionais anualmente.
Outro exemplo, e de maior proximidade, é o México.
De limitações socioeconômicas como o Brasil, o país se firmou como um dos mais importantes destinos do turismo mundial, com 45 milhões de turistas estrangeiros.
Os mexicanos são muito beneficiados pela proximidade com os Estados Unidos, mas deram prioridade ao setor em sua estratégia econômica na última década, segundo observa relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento (OCDE).
Comparações podem ser relativizadas pelas condições específicas dos países, mas o mercado brasileiro, com trunfos turísticos bem conhecidos como o Rio de Janeiro e as Cataratas do Iguaçu e dezenas de lugares com grandes possibilidades de desenvolvimento, está claramente aquém do seu potencial.
Isso é admitido em um relatório do governo federal.
"O Brasil não faz parte das rotas do turismo global", diz uma análise feita pela Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade, vinculada ao Ministério da Economia, no ano passado.
O texto cita que "no Brasil, 93% dos visitantes são locais" e "[em 2019] a participação no PIB era de 7,7% e com alta empregabilidade, mas com um crescimento estagnado".
A permanência de velhos problemas e o aparecimento de novos levam o Brasil a deixar de aproveitar um setor que poderia ter um impacto positivo de forma considerável na economia, na melhoria dos serviços, na conservação dos espaços nas cidades, entre outros ganhos.
Para Alexandre Panosso Netto, coordenador de pós-graduação em Turismo da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores da pesquisa, esse caminho de desenvolvimento não se torna uma política séria de Estado por algumas razões.
"A concorrência de várias áreas e a incompreensão dos pontos positivos do turismo como vetor e alavanca de inclusão social, de valorização da cultura e de diversificação de pensamentos e aprendizado".
"O turista estrangeiro gastava por volta de US$ 110 por dia no Brasil até a pandemia. Em 2019 foi por volta de US$ 6 bilhões que os estrangeiros trouxeram ao país. Então dobrar ou triplicar o número de visitantes representaria dobrar ou triplicar esse montante."
O mercado de trabalho também teria a ganhar com o turismo.
"Não é só financeiro, o aumento do número de empregos gerados e o efeito multiplicador do turismo seriam grandes."
Veja abaixo alguns fatores que prejudicam que o turismo brasileiro decole:
1) Imagem ruim no exterior
Violência, corrupção, ambiente hostil para mulheres e para o público LGBTQ+, somados à deterioração nos últimos anos da imagem do país em campos como meio ambiente e a gestão da pandemia do coronavírus, não criam um cenário muito atraente para turistas considerarem o Brasil como destino, afirma Panosso Netto.
Seu estudo cita um índice criado pelos jornalistas Asher e Lyric Fergusson que ranqueia os países mais perigosos para mulheres que viajam sozinhas. O Brasil é listado na segunda posição, atrás apenas da África do Sul.
A mudança do slogan oficial do turismo brasileiro em 2019 também não ajudou na imagem brasileira. A frase usada para promoção, "Visit and love us" (Visite e nos ame, em tradução literal), foi considerada de pouca fluência e de construção pouco usual no inglês, além de soar com conotação sexual para alguns turistas estrangeiros.
O pesquisador também diz que a ligação do país a histórias que envolvem corrupção "influenciam como o turista nacional e internacional vê o destino Brasil. Se é um destino com notícias de corrupção, também se pode imaginar que é um destino inseguro".
Ele diz que países com problemas relacionados à corrupção como México e Turquia, mas com grande número de visitantes, conseguem contornar a questão pela proximidade a grandes mercados consumidores internacionais e a criação de ilhas de excelência turística.
2) Falta de continuidade em políticas e planejamento
"Políticas de turismo específicas precisam ser baseadas em um processo de planejamento contínuo", diz o estudo.
Para um desenvolvimento mais sustentável do setor é preciso que o Ministério do Turismo e a Embratur tenham grande qualidade técnica, com um planejamento de longo prazo.
Panosso Netto cita Bonito, em Mato Grosso do Sul, como um exemplo de um destino que vivenciou processo de melhora e desenvolvimento através dos anos.
"Há ótimos exemplos de boas práticas turísticas nos interiores do Brasil. Bonito, em Mato Grosso do Sul, com sua diversidade ecológica e turismo de alto nível, é um exemplo disso. Mas essa qualidade de Bonito não foi alcançada de uma hora para a outra. Começou no início dos anos 1990. Estamos falando, portanto, de mais de 30 anos de trabalho."
Mas problemas com a conservação ambiental derivados do desmatamento vem impactando o ecoturismo da região. A abertura de áreas para agricultura impacta na cor das suas águas, um dos grandes trunfos de Bonito. Cerca de 70% da população local depende do turismo.
Políticas de turismo também incluem a identificação de oportunidades em diferentes mercados, como o latino-americano.
"É preciso se preparar para receber o turista argentino, uruguaio, chileno, peruano, boliviano, paraguaio etc. Não podemos estar dar as costas à América Latina."
3) Qualidade dos serviços varia muito
A falta de maior profissionalização na parte de serviços é algo constantemente apontado como problemático. "Esse é um dos itens mais criticados pelos profissionais do setor", afirma Panosso Netto.
O pesquisador acha que seria também uma forma de desenvolver a própria área de empreendedorismo no país.
"O turismo é a porta de entrada de muitos empreendedores de primeira viagem. Temos que transformar isso em um ponto positivo a nosso favor. O governo pode criar programas de formação continuada do turismo, tal como já existiram no passado, a exemplo do Curso de Formação de Gestores de Políticas Públicas do Turismo Nacional."
Educação sobre como funcionam o mercado e o atendimento a turistas domésticos e internacionais, além do aprendizado efetivo de idiomas, seriam formas de capacitação.
Mas há um outro problema estrutural, segundo o professor da USP: "A dificuldade em acessar o crédito para o investimento em empreendimentos turísticos pequenos também é imensa".
4) Transporte aéreo e deslocamento
Segundo a pesquisa, embora o ambiente entre 2000 e 2019 no mercado aéreo "tenha melhorado a oferta e a competição nas rotas principais, especialmente aquelas conectando as capitais dos Estados e grandes centros urbanos, o acesso regional ainda é caro e, na maioria dos casos, insatisfatório".
Para Panosso Netto, "o transporte aéreo está deveras caro pelo preço do querosene e a política de impostos dos combustíveis e taxas aeroportuárias. Além disso, as viagens rodoviárias são prejudicadas pelas condições das rodovias; e se as rodovias são boas, os pedágios são caros".
O tamanho continental do Brasil, que de uma forma pode ser uma vantagem pela variedade de ofertas, acaba gerando um problema pelo deslocamento.
"Acredito que os destinos regionais devam se unir mais para compartilharem os turistas que por eles passam. Ou seja, a gestão regional do turismo deve ser fortalecida, junto com a criação de roteiros regionais com produtos e serviços de alta qualidade", diz o professor da USP.
O estudo defende "alinhar o ambiente regulatório, jurídico e tributário que rege a aviação brasileira, ao ambiente internacional. A evolução que viveu o setor nestes 20 anos não permite que sigamos admitindo que o Brasil tenha sérias diferenças e distorções entre nossas regras nacionais, que acabam gerando ofertas e produtos mais caros aos consumidores, e o que se pode ofertar no exterior".
*Texto publicado originalmente no site BBC News Brasil
Governo Bolsonaro não tem data para disponibilizar vacinas de segunda geração
Nara Lacerda*, Brasil de Fato
O Brasil está autorizado a usar duas vacinas bivalentes contra a covid-19 para doses de reforço na população a partir de 12 anos de idade. No entanto, o Ministério da Saúde ainda não tem data definida para começar a disponibilizar a nova tecnologia de imunização à população.
O pedido de aprovação temporária emergencial foi feito pela farmacêutica Pfizer e estava em análise na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde agosto.
Nesta quarta-feira (23), um dia após o aval da Agência, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que as doses devem chegar aos postos de saúde "em breve", mas não especificou exatamente quando isso vai acontecer.
Em publicação nas redes sociais, Queiroga afirmou que o contrato com a fornecedora contempla a entrega de vacinas atualizadas contra novas cepas. O ministro fez um apelo a quem ainda está com o esquema vacinal inicial incompleto. O Brasil tem quase 70 milhões de pessoas que não tomaram sequer a primeira dose de reforço.
"Vacinem-se contra a covid-19, atualizem a caderneta de vacinação contra a doença. A média móvel de novos casos de covid-19 aumentou 161% nos últimos 14 dias. Não podemos relaxar quando temos as armas contra o vírus."
A nova geração
Os imunizantes aprovados pela Anvisa são conhecidos como a segunda geração das vacinas contra a covid-19 e oferecem proteção contra mais de uma cepa do coronavírus. Mais de 30 nações já estão aplicando doses.
A decisão da Anvisa abre caminho para que o país inclua no Plano Nacional de Imunização (PNI) o reforço que combate, ao mesmo tempo, a cepa original da ômicrom e as variantes BA1 e BA4/BA5.
Indicadas para reforço, as novas vacinas serão identificadas como Comirnaty® Bivalente BA.1 ou Comirnaty® Bivalente BA.4/BA.5, em embalagens específicas com tampa de cor cinza. Cada frasco conterá seis doses, que devem ser aplicadas a partir de três meses após a conclusão do esquema inicial.
No documento apresentado aos pares, a diretora Meiruze Freitas, relatora do processo que avaliou o pedido de autorização da Pfizer, ressaltou a importância das vacinas monovalentes, anteriores à segunda geração.
"Pontuo que mesmo no cenário das variantes emergentes do SARS-CoV-2, as vacinas contra a covid-19 continuam sendo a melhor esperança para o controle da pandemia, conforme os dados públicos de monitoramento das hospitalizações e dos óbitos. Portanto, as vacinas continuam sendo a melhor medida de saúde pública, as quais ainda oferecem um alto nível de proteção contra o agravamento da doença e hospitalizações, e as pessoas que receberam doses de reforço estão mais protegidas. A Organização Mundial da Saúde relata que as pessoas não vacinadas têm pelo menos 10 vezes mais risco de morte por COVID-19 do que alguém que foi vacinado", explicitou ela no relatório.
O Brasil ainda não conseguiu alcançar a meta de mais de 90% da população vacinada com as duas primeiras doses e a terceira dose para reforço. As vacinas bivalentes vão melhorar a resposta imunológica contra as variantes, mas não substituem o esquema anterior de vacinação. Quem ainda não tomou todas as doses dessa etapa, portanto, precisa buscar os postos de saúde.
*Texto publicado originalmente no site Brasil de Fato. Título editado
Nas entrelinhas: Pedido de anulação da eleição estimula o golpismo
Luiz Carlos Azedo | Correio Braziliense
Não foi à toa que o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou ao Palácio do Planalto, ontem, depois de um chá de sumiço, no qual estaria em depressão e com erisipela – um processo infeccioso da pele, que pode atingir a gordura do tecido celular, causado por uma bactéria que se propaga pelos vasos linfáticos. A doença é comum em diabéticos, obesos e portadores de deficiência da circulação das veias dos membros inferiores, mas também pode ser causada pela baixa imunidade de quem está em depressão.
Na terça-feira, o pedido de anulação das eleições apresentado pelo presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, animou Bolsonaro a liderar uma espécie de terceiro turno das eleições, embora essa seja uma causa impossível no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Bolsonaro acredita piamente na manipulação das urnas eletrônicas desde sua eleição em 2018, pois afirma que a teria ganho já no primeiro turno.
Pelo andar da carruagem, o presidente da Corte eleitoral, Alexandre de Moraes, nem tomaria conhecimento do pleito. Se o fizesse, alimentaria as especulações criadas por um relatório sem consistência técnica, que se alimenta de um falso argumento: a numeração de série não individualizada em 60% das urnas utilizadas no segundo turno, que são as mesmas do primeiro e das eleições anteriores. Na noite de ontem, como Costa Neto se recusou a pedir a anulação do segundo turno, não deu outra: além de negar o pedido, Moraes condenou a legenda a pagar uma multa de R$ 22,9 milhões. Hoje, veremos se o PL recorrerá da decisão ao Supremo.
A última agenda oficial do presidente no Palácio do Planalto fora no dia 31 de outubro, uma reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, um dia após o segundo turno da eleição presidencial. Bolsonaro, até hoje, não reconheceu formalmente a derrota para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No dia 1º de novembro, no seu brevíssimo pronunciamento sobre as eleições, afirmou somente que continuará cumprindo a Constituição Federal e, desde então, mantinha uma postura ambígua em relação ao resultado das urnas. Agora, não, questiona a segurança das urnas e quer anular a eleição.
O fato é que o pedido do PL foi mais um degrau da escala golpista que está em curso no país, com protestos à porta dos quartéis e bloqueios sistemáticos de estradas por caminhoneiros, sem falar em ações mais violentas, como as que ocorreram em Santa Catarina, com a queima de veículos. Bolsonaro conta com apoio de militantes inconformados com a derrota, que acreditam em qualquer coisa para mantê-lo no poder e permaneceram nas ruas após 30 de outubro.
Bolsonaro também tem o apoio dos militares que o cercam no Palácio do Planalto e, em especial do general Braga Neto, vice de sua chapa, cuja atuação nos bastidores da campanha de Bolsonaro foi muito intensa, porém, discreta, na organização e mobilização de seus apoiadores. Ontem, o vice-presidente Hamilton Mourão, eleito senador pelo Rio Grande do Sul, pôs mais lenha na fogueira, ao questionar a legitimidade do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para garantir que as eleições transcorreram normalmente e não ocorreram fraudes, o que é muito grave.
“Não basta, pura e simplesmente, respostas lacônicas do nosso Tribunal Superior Eleitoral no sentido de contestar eventuais, vamos dizer assim, denúncias ou argumentações sobre o processo (de votação). Nós teremos que evoluir nisso aí”, afirmou o vice ao nosso correspondente em Lisboa, o jornalista Vicente Nunes. “Acredito que o Tribunal Eleitoral foi parcial nesse jogo”, disse Mourão. “Há, no Brasil, uma parcela da nossa sociedade que considera que o processo (eleitoral) tem problemas. E eu, de minha parte, vejo que precisamos ter que dar mais transparência nesse processo”, completou.
Orçamento
Mourão não questiona a legalidade da sua própria eleição ao Senado, realizada com as mesmas urnas. Sua declaração, em evento da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, porém, teve muita repercussão, inclusive internacional. Os olhos dos principais governantes do e da opinião pública do Ocidente estão voltados para o Brasil. Para o vice-presidente, as manifestações organizadas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que vêm causando transtornos à maioria da população brasileira, não podem ser consideradas como golpistas.
Entretanto, basta ver as palavras de ordem das manifestações para constatar que elas são de natureza golpista, pois pedem o fechamento do Supremo Tribunal Federal, a prisão do presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, e uma intervenção militar para manter Bolsonaro no poder, embora realizá-las de forma ordeira e pacífica seja um direito dos manifestantes.
Do outro lado do balcão, a equipe de transição começa a cair na real das dificuldades que enfrentará no Congresso. Não há o menor risco de aprovar a exclusão do Bolsa Família do teto de gastos por quatro anos. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não precisa do governo para se reeleger e não tem interesse em resolver um problema no atacado que exigirá um esforço ainda maior de negociação de Lula com o novo Congresso, no varejo.
A PEC da Transição ou do Bolsa Família, que seria apresentada ontem, por causa do impasse, talvez só possa ser formalizada na próxima semana. Diante das pressões do Centrão, ganha força a tese de que Lula não precisa da PEC para resolver o problema do Bolsa Família, pois pode administrar com um duodécimo do que foi gasto em 2022, até que o novo Orçamento seja efetivamente aprovado.