Day: setembro 22, 2022

As patrulhas da polícia de moralidade têm a tarefa de garantir que as mulheres estejam usando o hijab corretamente

Protestos no Irã: 'polícia da moralidade' é alvo de ira após morte de mulher presa por causa de véu

A morte de Mahsa Amini, de 22 anos, sob custódia da chamada "polícia da moralidade" do Irã, provocou protestos furiosos, com mulheres queimando seus lenços em um ato de resistência contra o rígido código de vestimenta da República Islâmica e aqueles que o aplicam

As Gasht-e Ershad (Patrulhas de Orientação) são unidades policiais especiais encarregadas de garantir o respeito à moral islâmica e deter pessoas que consideram estar "indevidamente" vestidas.

De acordo com a lei iraniana, que se baseia na interpretação da Sharia pelo país, as mulheres são obrigadas a cobrir os cabelos com um hijab (véu islâmico) e usar roupas largas para disfarçar seus corpos.

Mahsa Amini supostamente havia deixado alguns fios de cabelo visíveis sob o lenço na cabeça e foi presa pela polícia em Teerã em 13 de setembro.

Ela entrou em coma logo após desmaiar em um centro de detenção e morreu três dias depois no hospital.

A força policial negou relatos de que os policiais bateram na cabeça dela com um bastão e a empurraram contra um de seus veículos.

Mahsa Amini morreu após ficar em coma por três dias enquanto estava sob custódia da polícia

Em uma rara entrevista, um policial da moralidade falou anonimamente à BBC sobre sua experiência trabalhando para a força.

"Eles nos disseram que o objetivo de estarmos trabalhando para as unidades da polícia de moralidade é proteger as mulheres", disse ele. "Porque se elas não se vestirem adequadamente, os homens podem ser provocados e prejudicá-las."

Ele disse que eles trabalharam em equipes de seis, compostas por quatro homens e duas mulheres, e se concentraram em áreas com alto tráfego de pedestres e onde multidões se aglomeram.

"É estranho, porque se vamos apenas orientar as pessoas, por que precisamos escolher um lugar movimentado que potencialmente significa que podemos prender mais pessoas?"

"É como se estivéssemos saindo para uma caçada."

O oficial acrescentou que seu comandante pode repreendê-lo ou dizer que ele não está trabalhando corretamente caso não identifique um número suficiente de pessoas em violação ao código de vestimenta e que acha particularmente difícil quando as pessoas resistem à prisão.

"Eles esperam que nós os forcemos a entrar na van. Você sabe quantas vezes eu chorei enquanto fazia isso?"

"Quero dizer a eles que não sou um deles. A maioria de nós é de soldados comuns cumprindo nosso serviço militar obrigatório. Eu me sinto muito mal."

Decreto pós-revolução

A luta das autoridades iranianas contra o "mau hijab" - o ato de usar um lenço na cabeça ou outra roupa obrigatória incorretamente - começou logo após a Revolução Islâmica de 1979, cujo objetivo principal era fazer com que as mulheres se vestissem com "recato".

Muitas mulheres já faziam isso na época, mas minissaias e cabelos descobertos não eram incomuns nas ruas de Teerã antes da derrubada do xá pró-Ocidente Mohammad Reza Pahlavi. Sua esposa Farah, que costumava usar roupas ocidentais, era considerada um exemplo de mulher moderna.

Protestos anti-hijab no Irã se estenderam por vários dias. Na foto, mulheres estão sendo protegidas por um grupo de jovens no terceiro dia de protestos em março de 1979

No entanto, poucos meses após a fundação da República Islâmica, as leis que protegiam os direitos das mulheres que haviam sido estabelecidas sob o governo do xá começaram a ser revogadas.

"Não aconteceu da noite para o dia, foi um processo passo a passo", diz Mehrangiz Kar, 78, advogada e ativista de direitos humanos que ajudou a organizar o primeiro protesto anti-hijab no país.

"Logo após a revolução, havia homens e mulheres nas ruas oferecendo véus gratuitos para mulheres embrulhados em papel de presente."

Em 7 de março de 1979, o líder da revolução, o aiatolá Ruhollah Khomeini, decretou que os hijabs seriam obrigatórios para todas as mulheres em seus locais de trabalho e que considerava as mulheres descobertas "nuas".

"Esse discurso foi recebido por muitos revolucionários como uma ordem para forçar o hijab na cabeça das mulheres", disse Kar, que agora vive em Washington DC, nos EUA. "Muitos pensaram que isso ia acontecer da noite para o dia, então as mulheres começaram a resistir."

Eles responderam imediatamente. Mais de 100.000 pessoas, a maioria mulheres, se reuniram nas ruas de Teerã no dia seguinte - Dia Internacional da Mulher - para protestar.

'Fomos criativos'

Apesar do decreto do aiatolá Khomeini, levou algum tempo para as autoridades decidirem o que era considerado uma roupa "adequada" para as mulheres.

"Não havia instruções claras, então [eles] criaram cartazes e faixas mostrando modelos, que foram pendurados nas paredes dos escritórios. Eles disseram que as mulheres deveriam seguir essas instruções [sobre usar um hijab] ou não poderiam entrar", explica Kar.

Em 1981, mulheres e meninas passaram a ser legalmente obrigadas a usar roupas "islâmicas" modestas.

Na prática, isso significava usar um xador - um manto de corpo inteiro, muitas vezes acompanhado por um lenço menor por baixo - ou um lenço na cabeça e um manteau (sobretudo) cobrindo os braços.

"Mas a luta contra o hijab obrigatório continuou em níveis individuais. Fomos criativos para usar o lenço na cabeça ou não cobrir o cabelo adequadamente", disse Kar.

"Toda vez que eles nos paravam, estávamos brigando."

Em 1983, o parlamento decidiu que as mulheres que não cobrissem o cabelo em público poderiam ser punidas com 74 chibatadas. Mais recentemente, acrescentou a pena de até 60 dias de prisão.

As autoridades, no entanto, têm dificuldade para que as leis sejam cumpridas desde então e mulheres de todas as idades são frequentemente vistas "ultrapassando os limites" em público usando casacos justos na altura das coxas e lenços coloridos empurrados para trás para expor os fios de cabelo.

Abordagem agressiva

A extensão em que essas regras foram aplicadas e a severidade das punições impostas variaram ao longo dos anos, de acordo com o presidente no poder.

O então prefeito ultraconservador de Teerã, Mahmoud Ahmadinejad, procurou parecer mais progressista na questão quando fazia campanha para a presidência em 2004. "As pessoas têm gostos diferentes e temos que servir a todos", disse ele em um entrevista na televisão.

Mas logo após sua vitória eleitoral no ano seguinte, o Gasht-e Ershad foi formalmente estabelecido. Até então, os códigos de vestimenta eram policiados informalmente por outras unidades policiais e paramilitares.

A polícia da moralidade é frequentemente criticada pelo público por sua abordagem agressiva, e as mulheres são frequentemente detidas e liberadas apenas quando um parente fornece garantias de que seguirão as regras no futuro.

"Fui presa com minha filha quando fomos parados por causa de nosso batom", disse uma mulher da cidade central de Isfahan à BBC.

"Eles nos levaram para a delegacia e pediram ao meu marido para vir e assinar um pedaço de papel dizendo que ele não nos deixaria sair sem um hijab".

Outra mulher, de Teerã, disse à BBC que uma policial afirmou que suas botas poderiam ser "eróticas demais" para os homens e a deteve.

"Liguei para meu marido e pedi que ele me trouxesse um par de sapatos", disse ela.

"Assinei um papel admitindo que estava usando roupas inadequadas e agora tenho ficha criminal".

Outros relatos de experiências com a polícia da moralidade, que foram compartilhados com a BBC, incluem espancamentos e punições mais cruéis e inusitadas.

Uma mulher disse que a polícia ameaçou colocar baratas em seu corpo durante uma de suas prisões.

Nova repressão

O presidente Ebrahim Raisi, um clérigo linha-dura que foi eleito no ano passado, assinou uma ordem em 15 de agosto para impor uma nova lista de restrições.

Elas incluem a introdução de câmeras de vigilância para monitorar e multar mulheres sem véu ou encaminhá-las para "aconselhamento" e uma sentença de prisão obrigatória para qualquer iraniano que questionar ou publicar conteúdo contra as regras do hijab online.

As restrições levaram a um aumento nas prisões, mas também provocaram um aumento no número de mulheres postando fotos e vídeos de si mesmas sem véu nas redes sociais - algo que se intensificou ainda mais nos dias seguintes à morte de Amini.

Masih Alinejad, jornalista e ativista agora radicada nos EUA, diz que os protestos que eclodiram desde a morte de Amini parecem profundamente pessoais.

Ao longo dos anos, ela fez várias campanhas virais contra as leis do hijab, e muitos, incluindo o governo, a veem como uma força instrumental por trás da agitação atual.

As mulheres começaram a tirar seus lenços e agitá-los no ar no funeral de Amini na cidade ocidental de Saqez no sábado.

Nos dias que se seguiram, elas saíram às ruas em todo o país e algumas foram filmadas incendiando seus hijabs e sendo aplaudidas por manifestantes masculinos.

"Quando elas fizeram isso, me lembrei da época em que as pessoas começaram a derrubar o muro de Berlim, é esse momento", disse Alinejad.

"O que me deixa muito emocionada e esperançosa é que esta é a primeira vez que essas meninas não estão sozinhas. Agora os homens estão juntos com as mulheres."

*Texto publicado originalmente no portal da BBC News Brasil.


Bolsonaro visita caixão da rainha ao lado de Michelle e Silas Malafaia | Foto: Chip Somodevilla/AP Photo/picture alliance

O Brasil na imprensa alemã (21/09)

Made for minds*

Neues Deutschland – Bolsonaro modera o tom (20/09)

Em meados de setembro, vários podcasters evangélicos tiveram um convidado especial em seu estúdio: Jair Bolsonaro. Ao ser questionado, o presidente do Brasil disse se arrepender de algumas declarações sobre a pandemia. Mas um trecho particular da entrevista, que durou mais de quatro horas, circulou nas redes sociais: nele, Bolsonaro contou que passaria a faixa presidencial se não fosse reeleito.

Foram tons incomuns para o radical de direita. Há meses, Bolsonaro vem atacando instituições democráticas e disseminando mentiras sobre o sistema de votação eletrônica. Ele afirmou várias vezes que aceitaria os resultados somente se fosse eleito. "Somente Deus" poderia tirá-lo da Presidência. É claro que Bolsonaro não teve uma mudança repentina de opinião. Os tons mais moderados provavelmente fazem parte de uma estratégia de campanha.

Em todas as pesquisas, Bolsonaro está claramente atrás de seu principal adversário, Lula. Se Bolsonaro ainda quiser vencer as eleições, dependerá dos eleitores do centro e deve tentar superar sua rejeição. E isso não funciona com aparições exageradamente estridentes e visões radicais.

Na verdade, Bolsonaro esperava que os protestos em massa [de 7 de Setembro] lhe pudessem dar um impulso nas pesquisas. [...] Mas o desejado "efeito das ruas" não aconteceu, pelo contrário: em pesquisas recentes, Bolsonaro caiu ainda mais. Os benefícios sociais concedidos pelo governo também tiveram pouco efeito. 

Süddeutsche Zeitung – Campanha eleitoral no funeral da rainha (20/09)

Apenas 2 quilômetros em linha reta separam a residência do embaixador brasileiro em Londres do Westminster Hall, no Parlamento britânico. No domingo, o caixão da rainha Elizabeth 2ª ainda estava no local quando Jair Bolsonaro apareceu na sacada da residência do embaixador. Logo embaixo, na rua, apoiadores estavam reunidos e gritavam "mito, mito". [...]

Bolsonaro disse ter profundo respeito pela família real e pelo povo do Reino Unido, mas que estava ali também por outro motivo. "Teremos que decidir o futuro da nossa nação." O presidente afirmou que o Brasil está no caminho certo, e que o país é um exemplo brilhante para o mundo. "Nosso lema é Deus, pátria, família e liberdade", disse Bolsonaro. "Não tem como a gente não ganhar no primeiro turno." [...]

Todas as pesquisas preveem uma vitória clara do adversário: no primeiro turno, Lula está mais de 10 pontos percentuais à frente de Bolsonaro e, de acordo com as projeções, mais da metade dos eleitores quer votar no candidato da esquerda num segundo turno. [...]

Nas últimas semanas, Bolsonaro percorreu incansavelmente o país. Participou de rodeios e cultos evangélicos. O fato de ele ter agora viajado para o funeral da rainha no meio da campanha eleitoral é visto por observadores como uma tentativa de mostrar aos eleitores de seu país que seu governo desfruta de apoio no exterior.

Der Tagesspiegel – Com balas e pistolas (16/09)

Em um comício em Fortaleza, Delegado Cavalcante – deputado estadual pelo Ceará e membro do PL, o partido do presidente Jair Bolsonaro – pegou o microfone. Algumas centenas de pessoas foram ao local para ouvi-lo, a maioria vestindo camisas amarelas que se tornaram a marca registrada do bolsonarismo. [...] Com voz rouca, Cavalcante gritou à multidão: "Se a gente não ganhar nas urnas, se eles roubarem nas urnas, nós vamos ganhar na bala. Na bala!" A multidão aplaudiu. [...] A retórica agressiva de Cavalcante foi extrema, mas nenhuma exceção. E ela tem consequências. [...]

Na corrida pela Presidência, Bolsonaro está claramente atrás de seu adversário, o ex-presidente Lula, em todas as pesquisas. O mais tardar no segundo turno, no final de outubro, Lula pode ser eleito o próximo presidente do Brasil. Seria um retorno surpreendente para Lula – e um pesadelo para Bolsonaro e seus apoiadores.

Por isso, eles reagem de forma agressiva. Bolsonaro chama Lula de "bandido de nove dedos". [...] Repetidamente, Bolsonaro classifica a eleição como um voto "entre o bem e o mal". Ele mesmo é um patriota, diz, e Deus o escolheu para liderar o Brasil. Por outro lado, Lula levaria o país ao socialismo, fecharia igrejas, ensinaria ideologia de gênero nas escolas e legalizaria o aborto e as drogas. [...]

Dois assassinatos de apoiadores de Lula já foram registrados nessa campanha. [...] Os casos são os exemplos mais extremos do clima eleitoral agressivo, mas não são os únicos. Em uma igreja evangélica em Goiânia, uma briga começou porque o pastor disse aos fiéis para não votarem "nos vermelhinhos". Logo depois, um policial bolsonarista atirou na perna de um apoaidor de Lula.

A polarização da sociedade brasileira é frequentemente apontada como a culpada por essa violência. Mas a polarização tem um nome: Bolsonaro. O presidente normalizou a linguagem da violência na política nos últimos quatro anos. [...] Bolsonaro nunca tentou reconciliar o país ou dialogar com seus adversários. Em vez disso, tem criado constantemente novos conflitos. E diante da derrota, Bolsonaro semeia dúvidas sobre a confiabilidade das urnas.


*Texto publicado originalmente no portal
 dMade for minds.


(Crédito: Caio Gomez)

Nas entrelinhas: Pesquisas refletem disputas na campanha de Bolsonaro

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A 11 dias da eleição, a campanha à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) vive o momento de maior tensão até agora, em razão da estagnação — e até mesmo de recuo — nas pesquisas de intenção de votos divulgadas nesta semana. Ontem, a da Genial/Quaest mostrava o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à frente, com 44% das intenções de voto no primeiro turno, seguido por Bolsonaro (PL), com 34%. Depois aparecem Ciro Gomes (PDT), com 6%, e Simone Tebet (MDB), com 5%, e Soraya Thronicke (União Brasil), com 1%. Os demais candidatos não pontuaram. O primeiro turno das eleições está marcado para 2 de outubro.

Dez pontos de vantagem não são suficientes para Lula vencer o pleito no primeiro turno. Mas a campanha deflagrada pelo PT e seus aliados em favor do voto útil, com a mobilização de artistas, intelectuais e personalidades da sociedade civil, começa a tirar votos de Ciro e pode também atingir uma parcela de eleitores de Simone. Essa possibilidade aumenta a tensão na campanha de Bolsonaro, onde as disputas políticas estão ocorrendo em duas frentes — o marketing político e a gestão da economia.

Na área do marketing, há praticamente duas campanhas. Uma é comandada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL), com apoio do ex-secretário especial de Comunicação Social (Secom), Fabio Wajngarten, e do ministro das Comunicações, Fábio Faria, que não esconde o desconforto com as pesquisas. No começo da semana, questionou os resultados da última pesquisa Ipec (Antigo Ibope), que indicavam Lula com 47% das intenções de voto, 16 pontos percentuais à frente de Bolsonaro, 31%.

“TSE, anote esses números que o Ipec está dando, que no dia 2 de outubro a população vai cobrar o fechamento desse instituto. Chega desses absurdos com pesquisas eleitorais!!! A hora da verdade está chegando”, tuitou o ministro.

Os três discutem a estratégia com o marqueteiro Duda Lima, um especialista em campanhas eleitorais contra o PT no interior de São Paulo, mas que não tem o menor acesso a Bolsonaro. Sequer participou do assessoramento durante o debate da Band. Seus programas eleitorais seguem o manual de marketing político, com base em pesquisas qualitativas, mas parecem não surtir o efeito esperado pelo presidente.

Isso leva Bolsonaro a fazer o que lhe vem à cabeça, principalmente nas entrevistas coletivas e nos palanques, para alegria do vereador Carlos Bolsonaro (PL), que cuida das redes sociais. Por exemplo: não estava no script da viagem a Londres o discurso na sacada da embaixada do Brasil, como também não havia sido programado o novo “imbrochável” declarado em Nova York, após ter participado da Assembleia Geral das Nações Unidas.

A bolha bolsonarista nas redes sociais delira com as tiradas do “mito”, mas o efeito junto aos demais eleitores, que Bolsonaro precisa conquistar, é zero ou negativo, conforme atestam as pesquisas. A distância de Lula para o presidente no Nordeste e na faixa de renda de até dois salários mínimo é abissal. Entre as mulheres, também parece ser irreversível. A campanha não consegue romper essas barreiras.

Estresse político

É aí que as tensões aumentam na frente política, capitaneada pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), e pelo presidente do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto. Em tese, com a redução da inflação, o aquecimento da economia e a geração de novos empregos, Bolsonaro deveria estar melhorando os índices de aprovação do seu governo e reduzindo a própria rejeição, mas não foi o que se observou na penúltima semana que antecede o pleito.

Com isso, o estresse entre Ciro Nogueira e o ministro da Economia, Paulo Guedes, aumentou muito. Os políticos do Centrão, liderados chefe da Casa Civil e pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), queriam que o Auxílio Brasil fosse de R$ 800, mas Guedes se opôs, aceitando no máximo R$ 600.

À época, porém, imaginavam que o pagamento de dois meses do benefício em agosto, ou seja, R$ 1,2 mil, seria suficiente para mudar o cenário eleitoral. Ainda mais com a política de redução de preços dos combustíveis, que realmente teve impacto na classe média, principalmente na faixa de dois a cinco salários mínimos.

A outra frente de batalha são os candidatos do Centrão nos estados, principalmente do PL. Valdemar Costa Neto imaginava reeleger 75 deputados na aba do chapéu de Bolsonaro, mas, hoje, o cacique do Centrão refaz o cálculo otimista: acredita de que a legenda encabeçada pelo presidente elegerá em torno de 60 deputados.

Dois fatores estão influenciando esse cenário: um é o poder de atração de Lula junto aos eleitores, principalmente no Nordeste; outro, a falta de dinheiro para financiar as campanhas de 1.500 candidatos do PL em todo o país.

Bolsonaro drenou grande parte dos recursos do Fundo Eleitoral do PL para sua campanha, embora suas despesas pessoais estejam fora desse orçamento. O resultado é que os candidatos do partido, principalmente nos estados onde Lula tem grande vantagem, não estão se empenhando na campanha do presidente. Casa onde falta pão, todos brigam.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-pesquisas-refletem-disputas-na-campanha-de-bolsonaro/

Foto: Reprodução/spbancarios

Revista online | O Chile do pós-plebiscito

Alberto Aggio*, especial para a revista Política Democrática online (47ª edição: setembro/2022)

Passados mais de 20 dias do plebiscito de 4 de setembro, aprofundam-se as avaliações a respeito do significado daquela que está sendo considerada a maior derrota eleitoral da esquerda chilena, desde a retomada da democracia, no alvorecer da década de 1990. Depois disso, nunca a esquerda havia sido derrotada por mais de 25% dos votos, numa eleição de altíssima participação. Nem mesmo quando a direita chilena se impôs com Sebastian Piñera, por duas vezes, já nos primeiros anos do novo século. A discrepância é enorme se comparada à votação no chamado “plebiscito de entrada”, no qual cerca de 80% dos eleitores votaram a favor da montagem de uma Convenção Constitucional (autônoma e paritária) para a elaboração de uma “nova Constituição” para o país.

A derrota da opção apruebo foi dura e contundente, e é necessário refletir sobre isso. Trata-se de uma reflexão obrigatória especialmente para aqueles que pensam na continuidade do governo de Gabriel Boric até o final do seu mandato. Vale enfatizar que nunca a esquerda chilena havia sido derrotada de forma tão acachapante, logo após vitórias expressivas como foram a conquista da maioria dos convencionais da Convenção e a vitória de Gabriel Boric para a presidência da República. Alguns analistas chamam atenção para o fato de que, anteriormente, apenas na década de 1970, a esquerda havia sofrido uma derrocada tão forte, mas naquela oportunidade houve um golpe militar que impôs, pela força, uma ditadura implacável que daria sustentação à sua “revolução” neoliberal.  

A situação agora é diferente. Em termos sintéticos, foi uma derrota expressiva das correntes políticas que se expressaram nas manifestações multitudinárias de outubro de 2019 contra o governo direitista de Sebastian Piñera e transformaram aquela explosão de “rebeldia” numa operação política de refundação do país. Essas forças, somadas ao Partido Comunista e à Frente Ampla do presidente Gabriel Boric, “hegemonizaram” a Convenção Constituinte, que passou a ser identificada como uma assembleia de extremismo esquerdista, identitarista e antagonista. Dela saiu o texto constitucional que acabou sendo rejeitado pela imensa maioria dos chilenos. 

Veja todos os artigos da edição 46 da revista Política Democrática online

Para o cientista político chileno Kenneth Bunker, trata-se de uma derrota “transversal” que abarca todos os segmentos econômico-sociais, de gênero, urbano-rural, etc.; inclusive os setores que a esquerda diz representar. Para ele, foi também uma derrota “lapidária”: “a Convenção foi uma instância da esquerda, eles não tiveram a voz de veto da direita, fizeram um texto basicamente sem oposição, e o texto foi apresentado fielmente ao povo, com o apoio do governo e de uma parte importante da oposição; e o povo a rejeitou. Então é uma derrota ideológica, política, sobre uma visão socioeconômica do Estado que não tem comparação”.

Por essa avaliação, pode-se dizer que um projeto de Constituição, de caráter exclusivo de um conjunto de forças de esquerda, sem sequer uma aproximação com outros setores sociais e políticos, ou seja, um texto constitucional que revelava uma forma de ver a sociedade e o que, no longo prazo, se queria para o país em todas as dimensões, superando o sistema político vigente bem como o Poder Judiciário, marca uma visão refundacional do país e, por consequência, seu rechaço pela maioria do povo significa que não se trata apenas de uma derrota eleitoral e, sim, uma derrota política, cultural e ideológica da esquerda que hegemonizou a Convenção. 

Depois de uma derrota desse porte, pode-se avizinhar um percurso bastante difícil para a esquerda chilena. Há aqueles que vaticinam um retorno da direita ao poder em prazo não muito distante. É possível que isso ocorra. As reações do governo Boric têm sido de mudanças tópicas em seu gabinete e erráticas em muitas outras dimensões – vide o estrepitoso episódio da negativa de credenciais ao novo embaixador israelense. 

Confira, abaixo, galeria de imagens:

População chilena rejeitou proposta de nova Constituição no início deste mês | Foto: Fernando Lavoz/NurPhoto via Getty Images
Foto: Javier Torres/AFP
Foto: Martin Bernetti/AFP
As reações do governo Boric tem sido-de mudanças tópicas em seu gabinete e erradicassem muitas outras dimensões analisa Alberto Aggio | Foto: Abriendomundo/Shutterstock
Foto: Martin Bernetti/AFP
Foto: Reprodução/AFP
Foto: Reprodução/CUT
Foto: Reprodução/Voz do Pará
Foto: Tatohra/Shutterstock
População chilena rejeitou proposta de nova Constituição no início deste mês | Foto: Fernando Lavoz/NurPhoto via Getty Images
Foto: Javier Torres/AFP
Foto: Martin Bernetti/AFP
As reações do governo Boric tem sido-de mudanças tópicas em seu gabinete e erradicassem muitas outras dimensões analisa Alberto Aggio | Foto: Abriendomundo/Shutterstock
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Foto: Reprodução/Voz do Pará
Foto: Tatohra/Shutterstock
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População chilena rejeitou proposta de nova Constituição no início deste mês | Foto: Fernando Lavoz/NurPhoto via Getty Images
Foto: Javier Torres/AFP
Foto: Martin Bernetti/AFP
As reações do governo Boric tem sido-de mudanças tópicas em seu gabinete e erradicassem muitas outras dimensões analisa Alberto Aggio | Foto: Abriendomundo/Shutterstock
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Foto: Reprodução/AFP
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Foto: Reprodução/Voz do Pará
Foto: Tatohra/Shutterstock
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Ainda não se tem claro como se fará uma nova Constituição para o Chile, ou mesmo se ela será feita. Há uma forte divisão entre aqueles que querem uma nova Assembleia Constituinte, com um novo formato na sua composição (as sugestões são inúmeras) e aqueles que simplesmente querem entregar essa tarefa ao atual Congresso e pensam simplesmente em “reformas constitucionais”. 

O cenário é efetivamente de uma imensa estafa. O apelo do presidente Boric – que defende a elaboração de uma nova Constituição – para que se afaste do novo debate constitucional as posturas “maximalistas, violentas e intolerantes com aqueles que pensam de maneira diversa” ajuda, mas é visivelmente insuficiente para enfrentar o enorme problema de recomposição de algum consenso entre os chilenos.

Sobre o autor

*Alberto Aggio é mestre e doutor em História pela USP e professor titular em História da América pela Unesp, com pós-doutorado nas universidades de Valência (Espanha) e Roma3 (Itália). Dedica-se à história política da América Latina Contemporânea, em especial à história política do Chile. É o diretor do Blog Horizontes Democráticos (https://horizontesdemocraticos.com.br/autores/) e autor de Democracia e socialismo: a experiência chilena (São Paulo: Unesp, 1993; Annablume, 2002, Appris, 2021).

** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de maio de 2022 (47ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da publicação.

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