Day: junho 30, 2022
Revista online | Mesmo sob ataques, urna eletrônica mantém segurança do voto
Símbolo da modernização e da lisura do processo eleitoral no Brasil, a votação em urna com leitor biométrico mostra a eficácia da utilização da tecnologia da informação a favor da democracia e a serviço da segurança do voto, segundo especialistas. Um avanço em relação a um passado marcado pelo obscurantismo de fraudes históricas, com troca de voto por cestas básicas, combustíveis e outras benesses.
No entanto, às vésperas das eleições, o presidente Jair Bolsonaro (PL), que aparece atrás de Lula (PT) nas pesquisas de intenção de voto, continua a propagar suspeitas, sem apresentar provas, contra o sistema de votação por meio de urnas eletrônicas, que passaram a ser usadas no país há 26 anos. Ele repete o caminho do ex-presidente Donald Trump, do Partido Republicano, derrotado nas últimas eleições nos Estados Unidos.
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Bolsonaro, porém, tem alguns senões. Ele e os familiares foram eleitos 19 vezes por meio de urnas eletrônicas, desde que foram instituídas no país. Começou em 1996, com a eleição da então esposa, Rogeria Nantes Braga Bolsonaro, para vereadora. Depois, foram os filhos. Ele, sozinho, já conseguiu mandatos com sete resultados de votação eletrônica, incluindo o primeiro e segundo turnos da disputa que o elegeu presidente.
Para manter suas suspeitas sem provas, Bolsonaro apela a ataques. No último final de semana, criticou o ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, em grupos de WhatsApp, por causa de uma declaração do jurista durante o Forum Brazil UK, no Reino Unido. Na ocasião, Barroso disse que o Brasil está enfrentando um “déficit imenso de civilidade”.
Bolsonaro afirmou que o ex-presidente do TSE foi “confrontado” ao dizer que derrubou proposta que envolvia contagem manual de votos. Citou as falas de duas pessoas presentes ao evento que questionaram o ministro e publicou a seguinte mensagem: “Não há déficit de civilidade no Brasil, mas déficit de honestidade por parte de v. exa. e alguns outros”.
Apesar dos constantes ataques propagados por Bolsonaro, o TSE segue suas atividades para manter o calendário das eleições previstas para outubro, com 577 mil urnas eletrônicas para mais de 150 milhões de eleitores aptos a votar no país. No dia 14 deste mês, o plenário elegeu os ministros Alexandre de Moraes, para próximo presidente do órgão, e Ricardo Lewandowski, para vice. Eles tomarão posse no dia 16 de agosto.
Na sessão que elegeu os seus sucessores no cargo, o presidente do TSE, ministro Edson Fachin, ressaltou que a Justiça Eleitoral está pronta para realizar eleições “transparentes, limpas e seguras, como tem feito ao longo de 90 anos”. “A Justiça Eleitoral contará com a temperança e a sabedoria para navegar nessas águas que reclamam, neste momento, firmeza e serenidade”, afirmou.
O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, observou a gravidade dos ataques às urnas eletrônicas, mas destacou a importância da democracia brasileira, que, segundo ele, vem sendo fortalecida “pela segura continuidade do trabalho sério, firme, inteligente, talentoso e corajoso” da Corte.
“Resultado das urnas tem de ser defendido com unhas e dentes”
Ex-ministro do TSE da classe dos juristas e representante do Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral (Ibrade), o advogado Marcelo Ribeiro reafirmou a importância da Justiça eleitoral para o fortalecimento e resistência da democracia diante de ataques ao processo de votação eletrônica. “Nós estamos enfrentando um momento difícil. Têm sido feitos muitos ataques ao sistema eleitoral, sempre infundados. O tribunal está, sem dúvida nenhuma, sob ataque”, asseverou.
Na contramão dos ataques antidemocráticos bolsonaristas, diversos políticos têm se posicionado a favor do processo eleitoral brasileiro e da segurança do voto por meio da urna eletrônica. Os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), têm reiterado suas manifestações em defesa do voto eletrônico.
Assim como os demais pré-candidatos à presidência do campo da oposição, Simone Tebet (MDB), apoiada pelo Cidadania e PSDB, diz que "colocar em xeque a lisura do processo eleitoral é mais um dos desserviços que Bolsonaro faz à nação”. “O Brasil precisa de reconstrução, e será por meio das urnas eletrônicas que vamos resgatar a esperança de um futuro melhor", afirmou à Política Democrática online.
Publicado em setembro do ano passado e que voltou a circular neste mês, um vídeo divulgado pelo presidente do PL, Valdermar Costa Neto, mostra que ele também já defendeu, de forma enfática, as urnas eletrônicas. Neste ano, porém, para agradar a Bolsonaro, o partido concordou em contratar um instituto para fazer uma auditoria independente das urnas eletrônicas. Até agora, não deu em nada.
No ano passado, o presidente do partido de Bolsonaro afirmou que o voto impresso custaria uma fortuna para o país e abriria margem para que pessoas com "espírito de porco" tentassem manipular o pleito. “Não pode reclamar. Ninguém pode reclamar. O próprio Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil com mais 53 deputados federais. Como reclamar da urna eletrônica? Não tem como reclamar. O voto impresso ia só trazer prejuízo para o Brasil", afirmou, no vídeo.
Para se blindar dos ataques, o TSE investe ainda mais no aprimoramento do processo eleitoral. Segundo o órgão, a urna eletrônica tem mais de 30 barreiras de segurança, e a Justiça eleitoral utiliza o que há de mais moderno para garantir a integridade, a autenticidade e o sigilo dos dados.
Para alterar uma informação, um hacker teria de passar por todas essas barreiras, o que, segundo o TSE, é praticamente inviável, já que teria de fazê-lo em um único momento: na hora da votação. Além disso, mesmo se conseguisse ultrapassar alguma barreira, o invasor não obteria sucesso, pois qualquer ataque ao sistema causa um efeito dominó, e a urna eletrônica trava, não sendo possível gerar resultados válidos.
Entre as tecnologias implementadas pelo TSE para garantir a segurança do software e do hardware da urna estão a criptografia, a assinatura digital e o resumo digital. A Corte ainda realiza a Cerimônia de Lacração e Assinatura Digital, em que os sistemas eleitorais são compilados e assinados digitalmente em um evento público, para garantir ainda mais transparência.
“Sistema brasileiro é um dos mais avançados do mundo”
A primeira manifestação da Justiça Eleitoral relacionada à aplicação tecnológica no processo de eleitores ocorreu 10 anos antes da implantação por amostragem da urna eletrônica no país. Em 1986, ainda no início da informática no mundo, o Brasil foi um dos países pioneiros a fomentar a informatização e integração de informações nos bancos de dados dos eleitores brasileiros.
Simultâneo ao processo de cadastramento e organização da estrutura eleitoral, o objetivo intrínseco do TSE era contribuir no combate a fraudes relacionadas ao cadastramento de pessoas com documentos falsos ou, até mesmo, o uso de cédulas de votação e títulos de pessoas já falecidas. Essa prática era bastante comum naquela época.
Nos anos sequenciais ao mandato de José Sarney, por exemplo, o Brasil viveu um período democrático no que se refere à escolha de seus representantes. Os anos 1990 provocaram uma grande novidade na história do voto no país: as urnas eletrônicas. Apesar de terem sido usadas pela primeira vez nas eleições municipais de 1996, as os equipamentos foram introduzidos em todo o país quatro anos depois.
As informações constam da pesquisa A cultura do voto eletrônico no Brasil: Contribuição Tecnológica para a Democracia e Comunicação Pública, produzida pelo hoje pós-doutor em Comunicação Política pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP) Roberto Gondo Macedo.
“Hoje, há um consenso entre os historiadores e as autoridades ligadas à questão eleitoral de que o sistema brasileiro é um dos mais avançados do mundo”, afirmou o pesquisador, em trabalho publicado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).
A parceria entre a Justiça Eleitoral e a Informática resultou na otimização de tempo e eficácia das eleições, segundo o pesquisador. O Cadastro Único Computadorizado de Eleitores permitiu a consulta de informações sobre qualquer eleitor dentro do território nacional, o que possibilitou à Justiça Eleitoral identificar inscrições duplas, triplas ou múltiplas de eleitores e eliminá-las gradualmente.
Em seguida, passou-se à totalização de resultados por meio do computador. Ela é a soma dos números finais de cada urna para saber o eleito em cada município, estado ou no País. Antes essa soma era feita à mão, e, posteriormente, com o auxílio de máquinas de calcular. No entanto, esse tipo de manuseio resultava, algumas vezes, em erros de soma, propositais ou não, que distorciam o resultado de toda uma eleição.
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Revista online | Charge de JCaesar
* JCaesar é o pseudônimo do jornalista, sociólogo e cartunista Júlio César Cardoso de Barros. Foi chargista e cronista carnavalesco do Notícias Populares, checador de informação, gerente de produção editorial, secretário de redação e editor sênior da VEJA. É autor da charge publicada pela Revista Política Democrática Online.
** Charge produzida para publicação na Revista Política Democrática Online de junho/2022 (44ª Edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.
Revista online | Veja lista de autores da edição 44 (junho/2022)
*Carlos Melo é o entrevistado especial da edição 44 da revista Política Democrática online. Cientista político e professor senior fellow do Insper.
*Paolo Soldini é o autor do artigo O que nos dizem aquelas tatuagens nazistas do batalhão Azov. Jornalista do histórico L’Unità e, também, de Il Riformista e da Radio Tre Rai.
*Luiz Sérgio Henriques é o tradutor do artigo O que nos dizem aquelas tatuagens nazistas do batalhão Azov. Tradutor e ensaísta, ele escreve mensalmente na seção Espaço Aberto.
*Benito Salomão é autor do artigo Voltaremos a Crescer? Economista chefe da Gladius Research e doutor em Economia pelo Programa de Pós-graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia (PPGE-UFU).
*Rodrigo Augusto Prando é autor do artigo Cenário eleitoral e guerras de narrativas. Professor e pesquisador. Graduado em Ciências Sociais, mestre e doutor em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista (Unesp).
*Maria Auxiliadora Lopes é autora do artigo As implicações da educação domiciliar. Pedagoga, ex-consultora da Unesco e ex-diretora do Departamento de Desenvolvimento dos Sistemas de Ensino, da Secretaria de Educação Fundamental do Ministério da Educação (MEC). Também foi coordenadora da Coordenação Geral de Diversidade e Inclusão Educacional do Departamento de Educação para Diversidade e Cidadania da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC.
*Priscilla Kitty Lima da Costa Pinto, conhecida como Kitty Lima, é autora do artigo Apoie mulheres. Natural de Aracaju (SE). Vegetariana desde os 5 anos e protetora dos animais desde então, fundou a ONG Anjos, há 10 anos, com o objetivo de salvar vidas de animais em sofrimento.
Em 2016, quase sem recursos, foi eleita vereadora de Aracaju com 4925 votos. Em sua atuação, chamou atenção da sociedade sergipana ao levantar pela primeira vez na história o debate do direito animal em Sergipe. Este fato a levou a ser eleita deputada estadual, em 2018, mantendo sua atuação imperativa em defesa dos animais e dos direitos da mulher e das minorias.
*Cácia Pimentel é autora do artigo O que o Brasil pode ganhar com o novo mercado de carbono. Doutora em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, pesquisadora de Direito e Sustentabilidade na Columbia University e mestre em Direito pela Cornell University.
*Ana Pimentel Ferreira é autora do artigo O que o Brasil pode ganhar com o novo mercado de carbono. Mestranda em Economia Ambiental e graduada em Ciência e Tecnologia do Meio Ambiente pela Universidade do Porto, Portugal.
*Marcus Pestana é o autor do artigo A reinvenção da democracia brasileira e as eleições de 2022. Foi deputado federal (2011-2018) e secretário estadual de planejamento (1995-1998) e saúde (2003-2010) de Minas Gerais.
*Felipe Barbosa é autor do artigo Guerra às drogas e a insistência no fracasso. Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás desde 2013, titular da 2ª Vara Criminal de Águas Lindas de Goiás (GO). Graduado em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2008). Pós-graduado em Direito pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (2011). Mestrando em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).
*Vercilene Francisco Dias é autora do artigo Povos quilombolas: invisibilidade, resistência e luta por direitos. Quilombola do Quilombo Kalunga, advogada, doutoranda em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), mestra em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Em 2019, tornou-se a primeira mulher quilombola com mestrado em Direito no Brasil. Graduou-se no mesmo curso pela UFG, três anos antes. É coordenadora do Jurídico da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). Ela também foi eleita pela revista Forbes como uma das 20 mulheres de sucesso de 2022.
*Lilia Lustosa é autora do artigo Top Gun: Maverick – um voo de nostalgia. Crítica de cinema e doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL), Suíça.
* A Fundação Astrojildo Pereira detém os direitos da reportagem especial da edição 44: Mesmo sob ataques, urna eletrônica mantém segurança do voto
Apoiado pela FAP, seminário discute desenvolvimento em Mato Grosso
Cleomar Almeida, coordenador de Publicações da FAP
Propostas de desenvolvimento regional e nacional e estratégias para o fortalecimento de políticas públicas de desenvolvimento sustentável serão debatidas durante seminário, nesta quinta-feira (30/6), a partir das 19 horas, no Hotel Fazenda Mato Grosso, em Cuiabá. O evento, que busca incentivar a educação política em defesa da cidadania, da democracia e da justiça social, tem entrada gratuita.
O ex-secretário estadual de educação Marco Marrafon, o deputado estadual Faissal Calil (Cidadania) e a presidente do Cidadania Mulher, Neura Rajane, confirmaram participação no Seminário de Formação Política: Mato Grosso desenvolvido e sustentável. O evento é realizado com apoio da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao partido.
Marrafon, que em 2021 também foi considerado um dos juristas mais citados como referência pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ressalta que o seminário é importante por buscar “ideias para o desenvolvimento de Mato Grosso a partir dos conceitos fundamentais de uma educação compatível com o século 21”.
Veja, abaixo, galeria de fotos:
“Levantará a questão da participação democrática de todos os cidadãos e cidadãs, inclusão da mulher na política, especialmente naquilo que interessa ao desenvolvimento e, também, à sustentabilidade. Discutiremos, ainda, a questão da energia, como a energia solar, e a busca de menos tributos para construir esse desenvolvimento”, afirmou o ex-secretário estadual.
O objetivo do seminário, segundo os organizadores, também é incentivar a educação política e a formação de novas lideranças em diferentes áreas de atuação, membros de entidades organizadas com inserção social para despertar a inovação na forma de fazer política, além de incentivar o protagonismo feminino.
“Vamos promover o debate para realizar os diagnósticos de demandas regionais e nacionais que impactam o estado de Mato Grosso. Temos trabalhado de maneira intensa para planejar propostas concretas para o futuro desenvolvido, inclusivo, e bastante sustentável do Estado de Mato Grosso”, ressaltou Marrafon.
O evento é destinado, prioritariamente, a simpatizantes e filiados ao Cidadania, mas também está aberto a receber contribuições da comunidade em geral, para que haja mais conscientização e engajamento dela, para o pleno exercício da cidadania e fortalecimento do desenvolvimento sustentável e do empreendedorismo no Estado.
Jason Miller diz que não vai tolerar 'invasão do Congresso' em rede social
Mariana Sanches, BBC News Brasil*
Da penúltima vez que esteve no Brasil, o ex-assessor de Donald Trump e atual CEO da rede social Gettr, Jason Miller, havia passado quase quatro horas detido pela Polícia Federal (PF) para prestar esclarecimentos no inquérito das fake news, no aeroporto de Brasília.
Há três semanas, no entanto, ele voltou ao país, para participar, ao lado dos deputados federais Eduardo Bolsonaro (que defendeu no evento que a "Hungria era exemplo a ser seguido") e Carla Zambelli, ambos do PL-SP, da versão brasileira do Conservative Political Action Conference, o CPAC Brasil, em Campinas, em São Paulo. E dessa vez, sua passagem não teve tensões com autoridades no país. Segundo sua assessoria, ele foi "ovacionado de pé" no evento destinado a conservadores.
A nova visita ao Brasil era vista por Miller como central para tentar alavancar a rede social — amplamente associada à direita tanto no Brasil quanto nos EUA e em outros países — e para a qual ele tenta alcançar a marca de um milhão de usuários brasileiros. Ainda não conseguiu. Mas a Gettr afirma que a passagem de poucos dias de Miller ao Brasil alavancou o número de perfis baseados no país de 750 mil para 800 mil.
A rede cresce justamente com a ajuda de eleitores trumpistas e bolsonaristas. Globalmente, Miller se conecta com atores da direita radical não só por ideologia, mas também porque isso é bom para seus negócios.
Ele mostra apoio explícito, por exemplo, ao partido AfD, na Alemanha, e a Marine Le Pen, na França, país em que esteve em ao menos quatro ocasiões antes do pleito em que a candidata da direita radical foi derrotada por Emmanuel Macron, que se reelegeu presidente recentemente.
"O presidente Bolsonaro é um dos nossos dez maiores perfis globais. Acredito que ele esteja entre sexto ou sétimo em número de seguidores", diz Jason Miller à BBC News Brasil, em Washington D.C., um pouco antes de embarcar para o Brasil, em junho.
Bolsonaro tem 674 mil seguidores na Gettr, contra 8,3 milhões no Twitter, o que dá uma medida tanto do potencial de expansão da plataforma quanto de quão pequena ela ainda é, um possível sinal de que a rede social, que completará um ano nesta semana, pode não decolar.
O próprio Trump, que motivou o ex-assessor a criar uma espécie de Twitter alternativo após ter sido banido das redes no episódio da invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, não chegou a um acordo financeiro com a Gettr para criar seu perfil.
Mas figuras centrais em sua gestão, como o ideólogo Steve Bannon e o ex-secretário de Estado Mike Pompeo estão entre os cerca de 5 milhões de usuários da rede social.
Presença frequente no Brasil
Como já fez em outros países, no entanto, com a proximidade das eleições no Brasil, Jason Miller deve reforçar sua presença no país para atrair usuários ao mesmo tempo em que os Bolsonaro tentam arregimentar eleitores.
"Espero estar no Brasil com bem mais frequência agora e dar um grande impulso nos números", diz Miller, que nega qualquer envolvimento com a campanha pela reeleição de Jair Bolsonaro (PL).
"Temos visto o Brasil como nossa segunda maior comunidade. É cerca de 14% ou 15% da nossa plataforma, atrás apenas dos EUA. Uma das melhores coisas sobre a Gettr é que ela é 51% americano e 49% internacional. Logo após o Brasil, temos o Reino Unido, com cerca de 10% dos usuários, a Alemanha, entre 8% e 9% e a França, entre 5% e 6%. É uma comunidade internacional em crescimento", diz Miller.
A Gettr também tem se beneficiado de usuários que costumavam usar o hoje ostracizado Parler. O Parler se firmou como uma rede de usuários de direita, atraindo inclusive expoentes brasileiros, como Eduardo Bolsonaro, ao longo de 2019 e de 2020.
Em janeiro de 2021, segundo a plataforma, ela contava com 15 milhões de usuários. O ataque ao capitólio em 6 de janeiro, no entanto, representou praticamente o seu fim.
A própria plataforma reportou ao serviço investigativo americano FBI ter sido extensamente usada por usuários trumpistas para preparar e coordenar o ataque ao Congresso americano, que resultou em cinco mortos e na interrupção da certificação da vitória eleitoral do democrata Joe Biden por algumas horas.
As investigações mostraram que o Parler foi totalmente tomado por mensagens que afirmavam ter havido fraude no pleito americano de 2020, ressoando alegações do próprio Trump, e clamavam por "guerra civil", ameaças de morte a policiais e conclamação à insurreição. O aplicativo foi incapaz de conter o fluxo e moderar as mensagens para que elas não se traduzissem em violência no mundo real. Depois disso, o Parler foi excluído das lojas de aplicativos do Google e da Apple, e houve um intenso movimento de anunciantes para retirar seus anúncios da plataforma.
Confrontado com a possibilidade de que sua plataforma, a Gettr, pudesse ser usada no Brasil para coordenar algum tipo de insurreição após as eleições nos moldes dos ataques ao Capitólio americano, possibilidade que vem sendo aventada por políticos e analistas nos EUA, Miller é incisivo em sua resposta.
"Não importa em que país do mundo, este não é o tipo de coisa que permitiríamos em nossa plataforma", diz ele à BBC News Brasil.
Segundo o CEO, o serviço de streaming de vídeo pelos próprios usuários só está disponível para perfis verificados e ainda assim está sujeito a uma série de regras para coibir abusos e violência. Recentemente, atiradores americanos usaram esse tipo de serviço de plataformas para transmitir ao vivo massacres com armas de fogo.
"Nossos termos de serviço deixam muito claro que, se você estiver fazendo ameaças físicas ou planejando cometer violência ou dano contra alguém, isso seria uma violação de nossos termos de serviço ou diretrizes da comunidade", diz Miller, garantindo que o conteúdo seria retirado do ar por meio do sistema de moderação humano e automático.
O presidente Jair Bolsonaro tem feito alegações de que o sistema eleitoral brasileiro é fraudulento e de que pode não aceitar o resultado, o que poderia motivar situação semelhante à vivida nos EUA, segundo analistas políticos.
Miller, no entanto, não reconhece essa possibilidade: "tudo o que eu vi (de manifestações) do presidente Bolsonaro parece ter sido sempre no sentido de apoiar muito a lei e a ordem. Não houve nenhum tipo de atividade ou comunicação (de Bolsonaro) na Gettr nesse sentido".
No início de junho, em viagem a Orlando (Flórida, EUA), Bolsonaro foi questionado pela BBC News Brasil se, após a divulgação do resultados das eleições no Brasil, o país poderia viver uma situação de violência análoga à invasão do Capitólio nos EUA, em janeiro de 2021.
O presidente brasileiro respondeu: "Eu não sei o que vai acontecer, de minha parte teremos eleições limpas, com toda certeza nós vamos tomar providências antes das eleições", disse, sugerindo que as Forças Armadas atuarão no processo eleitoral.
Bolsonaro então citou uma declaração recente de Ciro Gomes, candidato presidencial do PDT: "O Ciro Gomes, terceiro lugar nas pesquisas, acabou de dizer que 'se Lula ganhar, o Brasil amanhece em guerra'. A população brasileira, a maioria esmagadora, está comigo".
Miller testemunhou na Comissão da Câmara dos EUA que investiga invasão ao Capitólio
Dentro de casa, nos EUA, Miller é parte de um processo de investigação da Câmara dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil) sobre as ações do ex-presidente Donald Trump que, de acordo com o inquérito, foram determinantes para o desfecho da invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, quando o republicano ainda era presidente.
No primeiro dia de audiência pública, a vice-presidente do comitê investigativo, Liz Cheney, colocou no ar um depoimento em vídeo de Miller no qual ele diz ter presenciado, no Salão Oval, um diálogo entre Trump e seu principal analista de dados da campanha, Matt Oczkowski. Na ocasião, Oczkowski disse a Trump que ele perderia o pleito, pouco tempo depois da eleição.
"Lembro que ele afirmou ao presidente — em termos bastante contundentes —, que ele iria perder", disse Miller, confirmando que as informações do analista eram baseadas em resultados de condado por condado e Estado por Estado.
A fala de Miller foi usada para basear a interpretação dos deputados americanos do comitê de que Trump sabia estar mentindo quando repetiu aos seus eleitores que ele havia sido vítima de uma fraude eleitoral.
Depois da divulgação do trecho do vídeo, Miller afirmou que o material cortava parte de sua argumentação. Segundo Miller, ele contou aos deputados que Trump discordava do analista Matt Oczkowski porque acreditava que seu funcionário não estava levando em conta as chances de vitória em batalhas judiciais.
"Ele acreditava que Matt não estava olhando para a perspectiva de desafios legais em nosso caminho e que Matt estava olhando puramente para o que esses números estavam mostrando, em oposição a coisas mais amplas para incluir questões de legalidade e integridade eleitoral que, como um cara de dados, ele pode não estar monitorando", teria dito Miller ao comitê.
Miller continua próximo a Trump e deve ser peça importante na campanha se o republicano realmente se candidatar em 2024.
Esta semana, no entanto, revelações feitas por uma ex-assessora da Casa Branca indicaram que Trump sabia que havia manifestantes armados em seu comício, permitiu sua presença e desejava participar junto com eles dos atos que se seguiram no capitólio, no qual seu vice-presidente, Mike Pence, teve que ser protegido para não ser assassinado. É incerto que tipo de impacto as revelações, que Trump classifica como falsas, podem ter sobre sua elegibilidade futura.
Entre os eleitores de Trump, foi justamente o seu banimento das redes após o episódio do Capitólio o que motivou um aumento ainda maior do sentimento contra "as big techs do Vale do Silício", como são conhecidas as redes como Facebook, Twitter, Youtube.
Segundo Miller, o mesmo sentimento existe no Brasil. Sem mencionar diretamente os casos, o ex-assessor de Trump faz referência à situação de bolsonaristas seguidamente derrubados de plataformas por espalhar fake news ou incitar violência, como o blogueiro Allan dos Santos, a ativista Sara Winter, e o deputado federal Daniel Silveira, em inquéritos dos quais o próprio Miller também foi alvo.
"No que diz respeito especificamente ao Brasil, muitas pessoas estão frustradas com a escolha restrita de meios e redes de comunicação no Brasil, o fato de você não ter a descentralização do livre fluxo de informações", diz.
Ele acusa as redes e a imprensa de censurarem as opiniões de direita em nome de manter a segurança ou confiabilidade das plataformas. Segundo Miller, seria possível manter as opiniões da direita radical na íntegra sem ferir esses princípios, um tipo de moderação que sua rede faria.
Ele, no entanto, se nega a discutir com a BBC News Brasil tanto casos hipotéticos quanto exemplos reais de conteúdos de bolsonaristas retirados do ar no Brasil.
E embora já tenha feito ironias públicas com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que conduz o inquérito das Fake News, Miller se esforça pra mostrar colaboração com as autoridades brasileiras e critica o Telegram por ter ignorado orientações ou interpelações do Supremo.
"Parece-me que eles (Telegram) provavelmente deveriam ter feito um trabalho melhor e certificar-se de que seriam melhores parceiros no processo. Quer dizer, a coisa toda sobre emails (do Supremo) se perderem na pasta de spam e coisas assim…. Eles provavelmente provavelmente encontrarão alguns bons advogados no Brasil", opina Miller, que no Brasil compete com o Telegram por um público de mesmo perfil.
Segundo Miller, nem sua plataforma nem ele próprio estão sob investigação no Brasil atualmente, embora afirme possuir advogados continuamente monitorando a situação no país.
"Nossa expectativa no Brasil é que a Gettr seja um parceiro muito bom. Obviamente, respeitamos muito todas as regras e regulamentos locais. Nós concordamos com qualquer coisa que nos tenha sido solicitado. E acreditamos que, em última análise, seremos uma voz forte pela liberdade de expressão no Brasil, onde queremos estar por muito tempo", diz Miller.
Ele acrescenta: "Com nossa política de moderação inteligente, proativa e robusta, garantimos que não haja ameaças online ou qualquer coisa que possa ser interpretada como ilegal, também garantimos que não haja xingamentos raciais ou religiosos, que não haja doxing (vazamento) de informações. Acreditamos que criamos um ambiente positivo onde as pessoas podem se expressar, mas sem discriminação política e sem preconceitos políticos".
Ele admite, porém, que não esperava gastar tanto dinheiro com advogados.
"Essa é uma das coisas eu não sabia quando lançamos a Gettr, há quase um ano: que passaria tanto tempo com advogados quanto no ano passado, ou que as contas de advogados seriam tão altas no Brasil".
*Texto publicado originalmente em BBC News Brasil: Título editado.