Day: janeiro 16, 2022
Evandro Milet: A cultura come a estratégia no café da manhã
Evandro Milet / A Gazeta
A frase do título, atribuída ao guru Peter Drucker, mostra bem que estratégia sozinha, por mais bem elaborada e fundamentada, não anda sem uma cultura forte da empresa, que a sustente para a execução.
Sílvio Meira, em seu recente livro sobre estratégia, diz que um número suficiente de estudos publicados mostram que pelo menos 50% das decisões de caráter estratégico não são implementadas e que de 60% a 90% das estratégias não cumprem os objetivos desejados.
Muitas vezes isso se deve ao descasamento entre a estratégia e a cultura. E o que é a cultura? É a maneira que as coisas são feitas pela empresa. Depende de liderança, da história e dos valores que, de fato, são praticados por toda a empresa.
Se perguntar aos empregados da empresa qual é a sua missão, sua visão ou seu propósito e grande parte deles não souber responder, pode desconfiar.
Muitas vezes, porém, o problema começa na definição desses itens. Muitas missões são corte e cola sem graça, sem força e ficam indistinguíveis entre uma fábrica de pregos e uma empresa de software. Sabe aquela frase de ser a mais competente do seu setor, agregar valor e ser referência até o ano tal? Ou de contribuir para o desenvolvimento sustentável do planeta? Pois é, tudo certo, mas não inspiram ninguém.
Em um processo de construir uma estratégia para uma empresa, fui perguntar aos seus clientes como a enxergavam. Todos disseram a mesma coisa, uma capacidade de resolver problemas a qualquer hora com grande competência. Presteza e confiabilidade. É um sinal de cultura.
Outro sinal é se os empregados da empresa conhecem o que a empresa faz e o que está acontecendo. Informação engaja. Se os empregados conhecem o que a empresa faz, como faz, quais são seus números, quais são os planos, eles usam isso nas conversas informais e nas suas redes sociais e defendem a empresa. Informação aberta pode ser um dos itens de cultura. A Google usa isso e também tem um ótimo propósito: organizar as informações do mundo (e está entregando!).
A maneira de lidar com pessoas é o pilar fundamental da estratégia das empresas do grupo de Jorge Paulo Lemann: tenha gente boa, dê a essas pessoas coisas grandes para fazer e sustente uma cultura meritocrática. Faz parte dessa cultura estar sempre fazendo novos negócios grandes para gerar novas oportunidades e desafios para o pessoal. Inclui, ainda, um controle absoluto de custos, eliminação de mordomias, quebra de hierarquias rígidas, informalidade e metas individuais. Como eles dizem: “A cultura não é um apoio à estratégia; a cultura é a estratégia.”
A estratégia da Amazon se baseia em um investimento sem precedentes na infraestrutura de “última milha”, bancada por investidores seduzidos pela história mais simples e fascinante já contada no mundo dos negócios: A maior loja do planeta. Como não tem que investir em lojas físicas (embora tenha feito algumas recentemente), a Amazon investe em armazéns robotizados, muitos próximos dos grandes centros, para entregar produtos cada vez em menos tempo aos clientes.
Assim cria uma barreira de entrada intransponível para novos desafiantes do seu mercado.
A estratégia da Apple consistiu em colocar os eletrônicos no setor de luxo. Com isso conseguiu ter um produto de baixo custo vendido a um preço premium e a Apple se tornou a empresa mais rentável da história, atingindo recentemente 3 trilhões de dólares em valor de mercado.
O sucesso dessas estratégias também contribui fortemente para criar uma cultura.
Se a cultura pode comer a estratégia no café da manhã, a estratégia de sucesso realimenta a cultura na hora do jantar.
Fonte: A Gazeta
https://www.agazeta.com.br/colunas/evandro-milet/a-cultura-da-empresa-come-a-estrategia-no-cafe-da-manha-0122
Henrique Brandão: ‘O Canto livre de Nara Leão’ mira passado e acerta presente
Sucesso instantâneo, “O canto livre de Nara Leão”, série em cinco capítulos que estreou no dia 7 de janeiro, no Globopay, está sendo elogiada por todo mundo. Basta acompanhar as manifestações entusiasmadas nas redes sociais. E com razão. A série merece os aplausos. Ela resgata a trajetória de uma de nossas mais importantes cantoras.
Nara morreu cedo, em 1989, aos 47 anos, vítima de um tumor no cérebro. Caso estivesse viva, teria completado 80 anos em 19 de janeiro. Foi uma mulher à frente de seu tempo.
O diretor, Renato Terra – autor dos documentários “Uma noite em 67” (2010) e “Narciso em férias” (2020) –, disseca todas as etapas da carreira de Nara Leão. Para tanto, teve à sua disposição um material iconográfico excepcional.
Acompanhando os capítulos, o que salta aos olhos é uma personagem que é muito mais do que uma cantora. Nara era afinada e tocava bem o violão – disso não há dúvida. No entanto, as imagens de arquivo e os depoimentos de pessoas que conviveram com ela atestam sua postura independente, avessa a modismos, a patotas, a opiniões pré-concebidas. Sua sensibilidade, seu faro fino para perceber as novidades, sua vontade de experimentar, a levou a estar no lugar certo e na hora certa em momentos decisivos da cultura brasileira dos anos de 1960/70.
A abordagem da série realça a independência que a própria Nara teve na construção de sua carreira. Não houve planejamento marqueteiro, como estamos acostumados a ver nos dias de hoje. Com Nara foi outra história. Ela se deixava levar pela intuição e pelo desejo. Tinha controle total sobre os discos que gravou e administrou a carreira a seu modo. Em alguns momentos, não quis cantar. Recolheu-se. Foi cuidar dos filhos e frequentar a faculdade de Psicologia, onde as colegas de aula a tratavam de igual para igual.
Desde essa época, já tinha opiniões firmes. Peitou o padre da PUC, quando este proibiu a apresentação de seu grupo de amigos na universidade católica caso Norma Bengel, vedete de Carlos Machado, se apresentasse também. “Se ela não cantar, ninguém canta”, disse Nara. E foram todos para o Teatro de Arena da Praia Vermelha, que entrou para a história como um dos primeiros shows da Bossa Nova.
Suas apresentações, no famoso estilo banquinho e violão da Bossa Nova, eram concorridas. Seus joelhos, à mostra, causavam frisson. Em entrevista posterior, riu da situação: “é porque eu sentava e botava o violão em cima da perna, e aí o vestido subia”.
Mesmo sendo referência da Bossa Nova, no auge do sucesso rompeu publicamente com o movimento. “A Bossa Nova me dá sono”, chegou a dizer.
Levada por Carlinhos Lira, se aproximou dos cantores dos morros cariocas, uma novidade para ela. Passou a frequentar o Zicartola e descobriu que, mesmo em meio à pobreza, era possível fazer belas músicas. Pouco depois, em 1964, estrelou, ao lado de João do Vale e Zé Keti, o show “Opinião”, primeiro espetáculo de resistência à ditadura militar.
Em 1966, outro episódio polêmico. Em uma entrevista, disse que o Exército não servia para nada, e quase foi presa pelo ditador de ocasião, o marechal Castelo Branco. Carlos Drummond de Andrade, em um poema, saiu em seu socorro: “Meu ilustre marechal/dirigente da nação, /não deixe, nem de brinquedo, /que prendam Nara Leão.”
Em seguida, apoiou a Tropicália, movimento que teve a participação decisiva do “mano” Caetano de Maria Bethânia – cantora que Nara conheceu jovem na Bahia e a quem indicou para substituí-la no palco do show “Opinião”, que havia deixado. “Ela foi a chave para o conto de fadas que Deus escreveu para mim”, diz Bethânia em depoimento para a série.
Com as músicas de protesto em alta, resolve dar outra guinada na carreira. Encomenda a Chico Buarque uma canção lírica. Nascia “A Banda”, com a qual Nara e Chico vencem o II Festival de Música da Record, em 1966.
Para além do rico perfil de Nara Leão, a série chama a atenção também por nos apresentar um país de que estávamos esquecidos que um dia existiu, e que não se parece em quase nada com o que vivemos atualmente. Sem saudosismo. Ao mirar no passado, por meio de imagens da cantora, a série acerta o presente. Assisti-la nos faz renovar o ânimo para enfrentar a desfaçatez atual, a vulgaridade reinante, o negacionismo no poder.
Quem ainda não viu, não perca!
*Henrique Brandão é jornalista e escritor
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de janeiro/2022 (39ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP).
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.
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WhatsApp avalia derrubar limites de mensagens e gera temor de impulso a fake news em ano eleitoral
Guilherme Caetano / O Globo
SÃO PAULO — A possível criação de um mecanismo, dentro do WhatsApp, que derrubará os limites existentes hoje para a publicação de mensagens em grupos vem alertando especialistas, em função do potencial de alavancar a disseminação de conteúdos falsos na plataforma em pleno ano eleitoral.
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A funcionalidade, ainda em fase de testes internos, foi apresentada a seis representantes de setores estratégicos no Brasil em uma videoconferência, em 9 de dezembro. Um dos objetivos é tornar o aplicativo mais parecido com o Discord (usado para interação entre gamers) e o Telegram, visto com preocupação pela Justiça Eleitoral pela ausência de barreiras — não há limite para número de inscritos em canais, por exemplo.
A novidade, segundo relataram os especialistas presentes no encontro, deve incluir no WhatsApp “comunidades” compostas por diversos grupos, por meio das quais administradores conseguiriam maior alcance na circulação de mensagens ao operar como um “grupo de grupos” — os estudos estão em andamento, e a empresa não detalha qual será o limite de participantes. Hoje, tanto nos grupos quanto nas listas de transmissão — as duas formas possíveis de alcançar mais de um usuário com um disparo —, a capacidade é limitada a 256 pessoas.
A circulação em massa de mensagens com conteúdos falsos, especialmente em ambientes fechados, como o WhatsApp, foi apontada como um fator grave da eleição de 2018, o que levou autoridades a se mobilizarem para evitar o mesmo cenário este ano. No julgamento da ação que pedia a cassação da chapa que uniu o presidente Jair Bolsonaro e o vice, Hamilton Mourão, sob a acusação de disparos em massa, o ministro Alexandre de Moraes, que presidirá o TSE ao longo do processo eleitoral, foi direto ao tratar do assunto:
— Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado, e as pessoas vão para a cadeia.
O GLOBO conversou com três participantes do encontro, marcado por meio de uma empresa de pesquisa de mercado, e dois deles manifestaram preocupação com a hipótese da implementação de um recurso que pode turbinar a circulação de desinformação. O WhatsApp está presente em 99% dos smartphones no Brasil, segundo levantamento da Opinion Box, e figura como a principal fonte de informação dos brasileiros, de acordo com pesquisa realizada pelo Congresso em 2019.
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O Telegram, que estava em 53% dos aparelhos em agosto de 2021 (o índice era de 15% três anos antes), tem uma filosofia de mínima moderação e possibilidade de compartilhamento irrestrito de mensagens e, por isso, virou terreno fértil não apenas para desinformação. Como o GLOBO mostrou, a plataforma abriga grupos que negociam venda de armamentos e distribuição de pornografia infantil e vídeos de tortura e execuções. Não há representação no Brasil, o que tira a plataforma do alcance da Justiça.
“Recurso a ser evitado”
Para os técnicos ouvidos pelo GLOBO, a nova funcionalidade do WhatsApp vai na contramão da postura adotada pelo aplicativo nos últimos anos, quando restringiu o compartilhamento de mensagens encaminhadas mais de cinco vezes — uma resposta a eventos que provocaram danos à reputação, como os disparos em massa no Brasil e correntes falsas que desembocaram em violência na Índia.
Também ouvidos pelo GLOBO, especialistas que não participaram do encontro reforçaram o temor acerca dos riscos ao processo eleitoral. Marco Aurélio Ruediger, diretor de Análise de Políticas Públicas da FGV, critica o projeto em desenvolvimento e cobra maior responsabilização das plataformas digitais:
— Esse recurso não deve ser evitado apenas durante a eleição, mas sempre, porque impulsiona informações que geram polarização e descrédito informacional da sociedade.
Coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), Raquel Recuero afirma que ambientes fechados tendem a radicalizar mais os usuários ao fazer com que percam contato com o contraditório. Por isso, avalia, aumentar a circulação de mensagens no WhatsApp pode levar a um processo de polarização difícil de reverter:
— Pessoas tendem a dar mais crédito a informações que venham de gente do seu convívio, com quem se comunicam essencialmente pelo WhatsApp. E esse é o risco, porque você exclui as pessoas do debate público e as alimenta com desinformação.
Para Bruna Martins dos Santos, pesquisadora visitante no WZB Berlin Social Science Center e membro da Coalizão Direitos na Rede, trata-se de um movimento concorrencial do WhatsApp para reconquistar usuários que migraram para o Telegram:
— A funcionalidade acende alerta, sim, mas vale ponderar que hoje em dia uma plataforma como o WhatsApp está mais adaptada ao cenário jurídico brasileiro, tem seus representantes no país.
“Impedir desinformação”
O WhatsApp estuda também permitir aos administradores dessas “comunidades” uma maior moderação de conteúdo, como o poder de excluir mensagens e banir membros, algo já existente no Telegram.
Procurado, o WhatsApp não confirma que a ferramenta será lançada e diz que “conduz pesquisas regularmente com seus usuários, especialistas em tecnologia e acadêmicos para avaliar funcionalidades, que podem ou não ser introduzidas”. Ao GLOBO, Dario Durigan, head de Políticas Públicas para o WhatsApp na Meta Brasil, declarou que a empresa “leva muito a sério sua responsabilidade em ajudar a impedir o compartilhamento de desinformação”:
— O WhatsApp trabalha de forma próxima com organizações de checagem de fatos, especialistas da sociedade civil e autoridades eleitorais para combater e reduzir o compartilhamento de desinformação, e apoiar a integridade de processos eleitorais.
Janio de Freitas: Brasil made in USA. O que é mau lá aqui faz o mesmo estrago
Janio de Freitas / Folha de S. Paulo
Os americanos estão vivendo um sadomasoquismo nacional com fins imprevisíveis: experimentam as aflições latino-americanas incutidas pelos Estados Unidos por mais de um século. Sem interrupção, sem que um só dos países independentes na região, ou em vias de sê-lo, passasse à história como virgem na violação em massa do direito de conduzir-se.
O suspense dos Estados Unidos entre a salvação do seu sistema legal e a vitória da irracionalidade despertada por Trump é, na essência, um sentimento latino-americano, lá vivido com características locais.
A passividade dos latino-americanos ante sua expectativa é, nos americanos, uma queda livre desde as alturas de sua autoimagem até ao estranhamento da própria identidade. A pessoal e a do país. Perplexidade diferente, mas não ausente no lado insurreto, cuja fúria não tem fins definidos, nem nos incapazes de defesa eficaz.
Nesse estado confuso, os poderes políticos, da imprensa/TV e dos demais setores influentes nem sequer foram capazes de ir além da expressão "ameaça à democracia americana", para rotular sua percepção temerosa. O como, o porquê e o para quê não atravessam o choque de realidade ou a incredulidade forçada.
À margem, cresce o uso da expressão "ameaça de guerra civil", impossível saber se por exagero ou lucidez no país belicoso e de população armada. Mas tanto os reprimidos como os avançados buscam socorro, em vão, na pergunta a que muitos nem quereriam responder: como foi possível os Estados Unidos chegarem a isso?
Os inumeráveis fatores não se opõem a uma resposta algo simplória e, no entanto, sintetizadora e real: por interesse ou covardia, as forças influentes deixaram que Trump e a extrema-direita ambiciosa derrubassem sucessivos limites do regime democrático. A reação foi apenas palavrosa e contida, de parte da imprensa e de tevês; reação quase zero das instituições civis tão fortes nos Estados Unidos, e até adesão proveitosa ao trumpismo no empresariado e seu poder incontrastável.
Se o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil, como rezava a ditadura militar aqui, o que lá é mau faz aqui o mesmo estrago. Nessa linha, o alto risco a que Bolsonaro e seus seguidores submetem a eleição, em outubro, é uma visão que reproduz bastante o que levou à insegurança do regime americano e se passa na sua dificuldade de resposta à altura.
Bolsonaro retoma a pregação contra o sistema eleitoral, volta a acusar fraudes na eleição presidencial passada, ataca o Supremo e o Tribunal Superior Eleitoral, entrega a liberação das verbas orçamentárias a um líder (no mínimo) suspeito do centrão. Mas há notícia de que o poder empresarial se movimenta, com propósitos de fato eleitorais, como a busca de um nome viável contra Lula e Bolsonaro. Exceto meia dúzia, porém, esses empresários se encolhem no anonimato. "Por medo de represália."
Outro indicador a respeito, também publicado na Folha por Cynthia Rosenburg: "O articulador de um grupo afirma que não houve conversas apenas com Bolsonaro, porque entende que não há diálogo possível com o presidente, e nem com Luiz Inácio Lula da Silva —nesse caso a justificativa é a recusa em dar palco ao petista". Como tal decisão não foi reconsiderada, houve concordância do grupo.
Trata-se de um estreitamento do horizonte mental, o predomínio do pré-conceito sobre o encontro com a possibilidade do questionamento, do convencimento, da compreensão cancelada pelo interesse e a covardia. É o anticidadão em sua plenitude. Sua busca não é a do melhor candidato, é a do eleito que lhe seja pessoalmente proveitoso.
A notícia alvissareira —uma palavra bem velha para um velho fracasso da nossa democracia—, de movimentos empresariais pró-eleição, contém uma advertência: apesar do retrocesso de que o Brasil ou se recupera em poucos anos ou não se recupera mais, ainda é incerta a posição do poder empresarial caso ocorra o que se teme no processo eleitoral deste ano. E incerteza, no caso, não significa equilíbrio das probabilidades.
Assim como militares se vacinarem, seguindo seus inspiradores desenvolvidos, não é afastamento na relação com Bolsonaro. É afastamento da Covid, e olhe lá.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2022/01/brasil-made-in-usa-o-que-e-mau-la-aqui-faz-o-mesmo-estrago.shtml
Elio Gaspari: O mico da fábrica de fertilizantes
Elio Gaspari / O Globo
O atual governo é amigo do agronegócio, a Petrobras é administrada como uma empresa, o ministro da Economia é um campeão da iniciativa privada, e na cidade de Três Lagoas (MS) há um elefante branco, candidato a fóssil.
Com nome de vírus, é a UFN3, ou Unidade de Fertilizantes Nitrogenados, projetada pela Petrobras para produzir ureia e amônia suficientes para reduzir o gargalo das importações. Sua história completou doze anos e retrata a bagunça da administração pública nacional, onde todos têm razão, mas produzem maluquices.
As obras da UFN3, em terreno doado à prefeitura, começaram em 2011, a cargo da empreiteira Queiroz Galvão e de um consórcio chinês. A obra chegou a ter sete mil trabalhadores, mas os seus responsáveis começaram a calotear fornecedores e operários, provocando greves e até mesmo desordens. Em 2014, a Petrobras rescindiu o contrato com os empreiteiros, e a obra parou, com 83% do serviço já concluído. Àquela altura, UFN3 já havia consumido cerca de R$ 3 bilhões.
Passaram-se três anos, e em 2017 a Petrobras anunciou que venderia a fábrica. Faltou combinar com o Supremo Tribunal Federal, e no ano seguinte o ministro Ricardo Lewandowski bloqueou o feirão das privatizações da petroleira. Em 2019, esse bloqueio foi levantado e começou a caça a um comprador, com uma novidade: a Petrobras anunciou que sairia do mercado de fertilizantes.
Quem quiser conhecer esse assunto saberá que todas as partes tomaram as decisões certas e que todos tiveram suas razões, mas a fábrica continuará lá, 84% concluída e inoperante.
Apenas por curiosidade, o general Silva e Luna poderia mandar uma equipe de arqueólogos para pesquisar o caso da UFN3 para responder a algumas perguntas óbvias.
Por que não aparece comprador?
O preço está alto? Como ensinou o Conde Francisco Matarazzo, preço de mercado é o que o freguês quer pagar.
Quando a Petrobras resolveu sair do mercado de fertilizantes e vender a UFN3, usou a linda palavra “desinvestimento” para justificar sua política. No entanto, desinvestir é uma coisa, fabricar micos é outra.
Com sua paixão por afirmações apocalípticas e pela transferência de responsabilidades, o presidente Bolsonaro disse em novembro que “o governo está se virando atrás de fertilizantes” para evitar uma crise de abastecimento e emendou:
“O que é pior disso tudo, né: nós temos aqui potencial para isso tudo, mas o potássio que está lá na foz do rio Amazonas... Aquela grande área está demarcada como terra indígena.”
Os índios da foz do Amazonas têm pouco a ver com isso. O mico da UFN3 está a 684 quilômetros de Brasília.
O BlackRock se fechou
O gestor do fundo de investimentos BlackRock para a América Latina avisou que não botará dinheiro no Brasil enquanto Bolsonaro estiver no Planalto. Com uma carteira de US$ 9,5 trilhões, é o maior do mundo, opera em cem países com o olho em negócios de longo prazo.
O doutor Paulo Guedes talvez saiba que a coisa é pior. Em outubro passado, o BlackRock cogitava sair do Brasil, com uma terrível sinalização para o tal de mercado.
Quem quiser achar que isso é uma gripezinha, que ache.
Amil à venda
Dez anos depois de ter entrado no setor de saúde brasileiro comprando a Amil, a gigante americana UnitedHealth pagou R$ 3 bilhões para se desfazer de sua carteira de clientes individuais e está negociando o restante da sua operação em Pindorama. Ela tem 5,7 milhões de clientes e 19,5 mil colaboradores.
E ainda tem gente achando que empresas estrangeiras fazem fila para operar no Brasil.
O bicentenário de Poyais
As flutuações do humor dos investidores internacionais serão um fator relevante na campanha eleitoral deste ano. Até que ponto o BlackRock não confia mais em Bolsonaro? Até que ponto desconfia de Lula? Só eles sabem, mas neste ano do Bicentenário da Independência do Brasil, não custa lembrar que se comemora também o nascimento de Poyais. Era uma nação paradisíaca localizada na América Central, onde está hoje a República de Honduras. Bolsonaro não se fez representar na posse de sua presidente.
Em 1821, um escocês chamado Gregor McGregor lançou na praça de Londres papéis desse país. Em dinheiro de hoje, com sucessivos lançamentos, recolheu o equivalente a US$ 5 bilhões. Entre setembro de 1822 e janeiro de 1823, ele embarcou cerca de 250 imigrantes que receberiam lotes de terra ou trabalhariam numa cidade que tinha até teatro de ópera. Um deles seria o sapateiro da princesa local.
Os novos habitantes de Poyais encantaram-se com a paisagem quando viram a costa. Ao desembarcar, em setembro, verificaram que Poyais não existia. Era tudo mato e muitos mosquitos. O sapateiro da princesa matou-se.
Alguns colonos regressaram a Londres e contaram o que lhes aconteceu. Mesmo assim, McGregor fez um novo lançamento de papéis e teve compradores.
O malandraço cometeu a imprudência de lançar papéis em Paris e acabou na cadeia. Julgado, foi absolvido e voltou a operar sem sucesso. Em 1838, estava na penúria e morreu sete anos depois.
Simone Tebet
Está em curso uma costura para fortalecer a candidatura da senadora Simone Tebet (MS), que se lançou pelo MDB.
Com vinte anos de vida pública, ela depende da indicação do seu partido e hoje falta-lhe o apoio de alguns caciques que já estão no navio de Lula.
A singularidade da costura está no seu alcance, pois ela se estende a um pedaço do tucanato, insatisfeito com a opção de João Doria.
Tebet tem a seu favor o desempenho estelar que teve na CPI da Covid.
Joaquim Barbosa
Noutra pista, costura-se a possibilidade de uma candidatura do ex-ministro Joaquim Barbosa. Morreu no nascedouro a possibilidade de ele apoiar o nome de Sergio Moro.
Se Barbosa vier a entrar na corrida, é possível que Moro prefira concorrer a uma cadeira de senador.
Covid na China
Quem entende de China e conversou com o chinês que entende de Covid ouviu que os rigorosos controles de isolamento não serão atenuados antes de junho.
Covid nos EUA
Está pesando a barra para os americanos que decidiram não se vacinar.
Há profissionais de saúde defendendo a ideia de que eles sejam tratados em hospitais exclusivos, eventualmente, por profissionais que também são contra as vacinas.
Delfim e Paulo Guedes
Em 1969, o professor Delfim Netto era um desconhecido na elite do Rio e assumiu o Ministério da Fazenda. Aos 39 anos, gordo e com o sotaque dos italianos do Cambuci, fantasiava-se de viúvo com ternos pretos e camisas brancas. Dormia pouco e operava o dia inteiro. Nunca incorporou uma única repartição, mas colocava gente sua onde podia. Três anos depois, tornou-se o ministro da Fazenda mais poderoso da República.
Há três anos, Paulo Guedes aceitou a ridícula nobiliarquia de “Posto Ipiranga” e assumiu anexando quatro ministérios. Três anos depois, deu no que deu.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/o-mico-da-fabrica-de-fertilizantes-25356104
Dorrit Harazim: Liberdades
Dorrit Harazim / O Globo
Durante uns poucos dias, duas tribos humanas estiveram lado a lado numa rua de Melbourne, na Austrália, para clamar por mais justiça e mais liberdade. Pareciam comungar do mesmo ideário, apesar de a parceria ter durado apenas umas 80 horas — já foi muito, visto que tinham pouco em comum. A tribo mais antiga há muito deixara de atrair jornalistas, pois protestam desde dezembro de 2020, todo santo dia (as normas da Covid-19 permitindo), em frente ao antigo Carlton’s Park Hotel, transformado em centro de internação compulsória. Exigem a libertação de refugiados estrangeiros que buscaram abrigo na Austrália e ali estão confinados sem prazo para sair.
A segunda tribo, energizada e ruidosa, apareceu de supetão no mesmo endereço, com a mídia mundial. Juntou compatriotas, admiradores e simpatizantes do sérvio Novak Djokovic, um dos atletas mais celebrados do planeta. Como se sabe, o extraordinário tenista havia sido interceptado pela imigração australiana na semana passada e, por não estar vacinado nem apresentar a documentação adequada de exceção, fora encaminhado ao local de confinamento dos refugiados. Entre espetaculosas idas e vindas judiciais em torno da deportação ou não do astro, e de sua eventual exclusão do Aberto da Austrália, que se inicia amanhã (esta noite no Brasil), apenas uma das duas tribos permanecerá no local — a dos invisíveis.
Não é de hoje que a tensão entre encarceramento em massa e igualdade faz parte da história do país onde, quase 250 anos atrás, 11 navios britânicos despejaram um carregamento de prisioneiros comuns e transformaram aquelas terras em colônia penal. Em tempos mais recentes, a Austrália passou a ser vista como oásis para trabalhadores estrangeiros (um quarto de sua população é nascida no exterior), em parte pelo controle draconiano que exerce sobre suas fronteiras. Mas não para os que conseguem aportar naquelas terras vindos pelo mar, como refugiados desvalidos em busca de asilo ou trabalho. Estes se dão mal. Até 2014, eram despachados para uma prisão no deserto ou para a ilha penal de Nauru, sob condições sub-humanas denunciadas pela Anistia Internacional. Outros vão parar em centros como o de Melbourne, junto de estrangeiros não vacinados que tentam burlar as normas da imigração. Portanto o despacho do tenista para o hotel Park não seria propriamente uma novidade, fosse ele um desconhecido. Foi um estrondo porque naquele local nunca havia dado entrada tamanha celebridade, de 34 anos e patrimônio de US$ 220 milhões, com toda uma indústria de esporte e entretenimento atrelada a seu desempenho em quadra.
No terceiro dia de confinamento, por decisão judicial temporária, o “Djoker” conseguiu ser transferido para uma residência longe dali. O que levou seus fãs a festejar em júbilo uma dupla vitória, apesar de também temporária — do seu ídolo e do que consideram o direito à liberdade individual de dizer “não” à vacina. Na mesma praça, em tom mais acabrunhado, os que há anos protestam contra o confinamento dos refugiados esquecidos deixaram de cantar “Liberdade para todos”. A esperança de surfar no interesse súbito da mídia se dissolveu em silêncio, escreveu Cait Kelly no Guardian, sobre os que foram parar na Austrália em busca de segurança, não para jogar tênis. “Corta o coração ver tamanho interesse e atenção se dissiparem de novo”, ouviu de uma das ativistas. As várias entrevistas agendadas com os refugiados não aconteceram. Um interno declarou ao repórter nunca ter sido chamado pelo nome em nove anos de confinamento. Outro contou que ali não entra luz nem ar — as janelas são lacradas. Vegetam ignorados e esquecidos e tiveram seu sopro de esperança ao perceberem uma movimentação atípica. Talvez imaginassem que o interesse na rua era por eles.
A grande maioria dos australianos aplaudiu o rigor inicial do veto a Djokovic, movida por justa indignação à petulância antivacina do tenista, num país em que todos se submetem às restrições draconianas do governo no combate ao vírus. O próprio primeiro-ministro conservador, Scott Morrison, farejando a inclinação da opinião popular, tratou de inverter o curso. Fez-se de esquecido por ter concordado com a autorização inicial do estado de Victoria para a entrada do ícone. “Se vocês pensam que são os alemães que gostam de regras, apresento-lhes meus compatriotas australianos”, alardeou a reboque, pensando nas eleições gerais de maio próximo.
O saldo positivo do imbróglio deveria ser claro. A saber, que uma liberdade individual não pode e não deve se sobrepor aos direitos e liberdades coletivos. Extrapolou em muito o universo do tênis, estremeceu de leve o ar rarefeito dos privilegiados, sinalizou a futuros ex-governantes negacionistas que, enquanto durar a pandemia, convém ficar entocados em casa. De quebra, ainda oferece ao próprio Djokovic uma chance de fazer jus aos US$ 153 milhões que já embolsou em prêmios: que tal se interessar pela sorte dos refugiados confinados ad aeternitatem na Austrália? Para isso, nem precisaria se vacinar. Isso já seria pedir demais.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/liberdades.html
Celso Lafer: Liderança, conhecimento e negacionismo
Celso Lafer / O Estado de S.Paulo
Uma das características da liderança é a capacidade de indicar rumos. Na especificidade do mundo da política, espera-se de uma liderança qualificada que tenha antenas para perceber o sentido e o movimento dos acontecimentos, o que sente e toca a população e, em função destas percepções, tenha aptidão para engendrar os meios para dar um rumo à sociedade. No desincumbir-se da gestão, uma liderança, à luz das circunstâncias e da estratégia de sua personalidade, pode dar mais ou menos ênfase à inovação e à transformação ou à preservação e à estabilização da sociedade. Usualmente, uma liderança bem-sucedida sabe criativamente combinar as duas facetas, como é caso, por exemplo, do presidente americano Franklin D. Roosevelt.
Numa democracia, é parte integrante da responsabilidade, da liderança presidencial, não destruir e pelo menos conservar e, se possível, ampliar o poder de controle de uma sociedade sobre seus rumos.
Decorridos três anos da gestão de Bolsonaro, o saldo do que encontrou e do que está deixando é francamente negativo, para valer-me da medida preconizada por Joaquim Nabuco em Balmaceda, para julgar o valor de um chefe de Estado. Ele nem conservou nem ampliou o controle do País sobre os seus caminhos em todas as esferas em que vem, direta ou indiretamente, atuando.
Para dar alguns exemplos muito significativos de um negacionismo destrutivo, isso ocorre no campo da manutenção das instituições democráticas, da tutela dos direitos humanos, do capital diplomático da inserção do Brasil no mundo, dos compromissos da preservação do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável, da saúde pública, da cultura e da salvaguarda do seu patrimônio e da sua memória, da pesquisa, do ensino, do papel da Universidade e começa a alcançar, com a inflação e a carestia, a preservação do real, aumentando as inseguranças das expectativas que afetam o desempenho da economia e a renda dos brasileiros.
Para este expressivo saldo negativo, muito contribui o mandonismo da estratégia da personalidade do presidente, constitutivamente integrado a um negacionismo que compromete sua capacidade de gestão. É característica do seu negacionismo a recusa, alimentada pelo conflitivo do espírito de facção, de fatos, evidências e argumentos. É plúmbea a sua sensibilidade e opaca a intencionalidade de sua consciência em relação ao que se passa no País. É o que se expressa na regularidade de suas toscas manifestações, na constância que as acompanha o seu uso de fake news, propaladas incessantemente pelas mídias sociais que manipula.
O papel da ciência, do conhecimento, da pesquisa são ingredientes indispensáveis na elaboração e condução de políticas públicas nas sociedades contemporâneas, que são sociedades de riscos crescentes. Governar é saber escolher o que não está ao alcance de um agir impelido por um mandonismo intransitivo e intransigente. Com efeito, hoje, a gestão pública e privada exige o repertório de soluções que o acervo do repertório da ciência e do conhecimento oferece para lidar com os múltiplos problemas e desafios das sociedades. É o que caracteriza a experiência da maior parte dos países, dos EUA à China, que hoje têm preponderância na vida internacional. Para ficar com a prata da casa, é o conhecimento gerado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que é a variável crítica do sucesso do agronegócio brasileiro.
Duas áreas são paradigmáticas do negacionismo do presidente, exibidas por pensamentos, palavras e obras em relação à ciência e ao conhecimento: saúde e meio ambiente.
No que diz respeito à saúde pública e ao enfrentamento da covid-19, o negacionismo é continuamente explicitado pela sua postura em relação ao uso de máscaras, ao isolamento social, às vacinas, às competências constitucionais dos Estados e municípios na matéria e o enorme desprezo pela transparência das informações. Com isto, ameaça o direito à saúde e amplia a vitimização da população brasileira.
O negacionismo em relação ao meio ambiente se traduz no seu gosto pelo garimpo ilegal e o desmatamento predatório, pelo seu empenho no desmanche dos órgãos governamentais incumbidos do monitoramento e controle das atividades que afetam os ecossistemas, pelo seu descaso e indiferença em relação às mudanças climáticas e suas consequências. Destarte, não cumpre o seu dever de tutelar o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, que é bem de uso comum do povo e essencial à sua qualidade de vida, a ser preservado para as gerações presentes e futuras como estipula a Constituição.
Estes são dois grandes paradigmas do deletério de sua gestão e de sua conduta que prejudicam efetivamente a vida do País e a capacidade da sociedade brasileira de encontrar rumos para o presente e o futuro. Para quem acredita em Deus, vale a pena lembrar ao presidente o ditado latino: Quos vult Deus perdere, prius dementat – A quem Deus quer perder, primeiro tira o juízo.
PROFESSOR EMÉRITO DA FACULDADE DE DIREITO DA USP; EX-MINISTRO DE RELAÇÕES EXTERIORES (1992 E 2001-2002)
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,lideranca-conhecimento-e-negacionismo,70003951527
Eliane Cantanhêde: Não tem jeito?
Eliane Catanhêde / O Estado de S. Paulo
A eleição presidencial deu um salto no fim do ano e congelou no ar, com Lula confortavelmente na frente, Jair Bolsonaro mantendo um quarto do eleitorado apesar de tudo, Sérgio Moro em terceiro, mas sem chegar a dois dígitos, Ciro Gomes entre ser ou não ser e João Doria estranhamente quieto, fiando-se num selo, “pai das vacinas”.
À vontade, Lula parte para investidas internacionais, discute a sério o nome do (ou da) vice, consolida alianças no Nordeste e avança no Sudeste, enquanto Bolsonaro atira a esmo e acerta o próprio pé, ajoelha para o Centrão e afugenta militares, empresários, banqueiros, grandes produtores rurais...
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Quanto mais gente torce para viabilizar uma opção aos extremos, mais cresce a angústia e dispara a precipitação. Uns dizem: “O Brasil não merece Lula nem Bolsonaro, mas, se for assim, vou com Lula”. Outros: “Esse presidente é um doido, mas entre ele e Lula, fico com ele. No Lula, não voto de jeito nenhum”.
Ou seja: os que mais querem a terceira via são os que cristalizam a polarização entre Lula e Bolsonaro, jogando a toalha, disseminando o mantra de que “não tem jeito” e antecipando o segundo turno.
Afinal, tem jeito? Depende dos candidatos, das suas campanhas e da competência de cada um para vender seu peixe, além do principal: as circunstâncias. Neste momento, o fundamental não são nomes, são perfis. Nem o fulano, nem só princípios, mas que tipo de fulano a população intui como melhor para reconstruir o País.
Na onda da Lava Jato, 2018 foi o basta! Contra corrupção, política, políticos conhecidos, status quo. Jair Bolsonaro foi quem se encaixou nesse perfil. Ele não era absolutamente nada disso, como veio a confirmar na Presidência, mas o eleitor “não olha para cima”: não vê o candidato real, vê o personagem inventado para a circunstância.
Em 2022, o mundo é outro, o Brasil é outro, com pandemia, cambalhota na Lava Jato, desmanche da Saúde, Educação, Ambiente, Cultura, Política Externa e esgarçamento das relações entre os Poderes e os entes federativos, mais o troféu de 620 mil mortos e o coroamento de recessão técnica, inflação, desemprego e fome. E a democracia voltou à agenda.
Esse quadro favorece Lula e é evidentemente desastroso para Bolsonaro, mas não apaga o mensalão, o assalto à Petrobras, o fiasco Dilma Rousseff. E, por exemplo, se Bolsonaro meteu a mão nos órgãos de investigação (PF, Receita, Coaf...), Lula aparelhou os da grana (BNDES, CEF, agências reguladoras).
Conclusão: vai ter muita lavação de roupa suja e, quando a máquina esquentar, a imagem de hoje pode descongelar. É cedo para jogar a toalha.
COMENTARISTA DA RÁDIO ELDORADO, DA RÁDIO JORNAL (PE) E DO TELEJORNAL GLOBONEWS EM PAUTA
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,nao-tem-jeito,70003951921
Vinicius Torres Freire: Bolsonaro golpista bota asinhas de fora e dá pista da campanha eleitoral
Na semana passada, Jair Bolsonaro voltou a dizer que roubaram seus votos em 2018 —sua vitória teria ocorrido no primeiro turno, caso as eleições fossem "limpas". Voltou a atacar ministros do Supremo Tribunal Federal. Disse que Alexandre de Moraes e Luís Barroso são lulistas.
O Bolsonaro freneticamente golpista de setembro de 2021 volta a botar as asinhas de fora. O arroz com feijão bolsonarista está no prato —ou, melhor dizendo, o pão com leite condensado está na mesa. São mais pistas do que deve ser a campanha da reeleição, sinais visíveis desde a virada do ano de vadiagem e desumanidades. Parece que Bolsonaro e sua turma querem garantir votos para passar para o segundo turno e ver o que dá no mata-mata final.
Como? Com favores localizados e loucura generalizada. Quer garantir aqueles eleitores que, depois de tudo, ainda o apoiam, cerca de 25%, o bastante provavelmente para jogar para fora da pista o pessoal da "terceira vida", apesar de dois terços do eleitorado o rejeitarem.
Bolsonaro quer uma medida provisória a fim de reajustar a tabela do Imposto de Renda, promessa da campanha de 2018. Dá para fazer, com alguma gambiarra no déficit público. Não vai render lá muito voto, mesmo isentando de imposto uma meia dúzia de milhão de eleitores. Pode tentar outros remendos do tipo.
Afora medidas muito alopradas, Bolsonaro não terá muito mais o que arrumar na frente eleitoral dita "econômica". O ritmo de crescimento da economia e o da inflação estão fora do seu controle; na melhor das hipóteses, teremos estagnação do PIB e taxa de inflação caindo pela metade, mas com um nível de preços insuportavelmente alto.
O interesse maior é manter vivo ao menos parte dos fogos dos infernos que o levaram ao poder, em 2018.
Voltou a falar com frequência da facada. Atacou a lisura do sistema eleitoral, ressalte-se, cometendo mais crimes. Moraes e Barroso tocam, lentamente, aliás, os inquéritos sobre essas mentiras, tratadas no Código Penal e na lei do impeachment.
Chamou os dois de lulistas e mais. "Quem eles pensam que são? Vão tomar medidas drásticas dessa forma, ameaçando, cassando liberdades democráticas nossas, a liberdade de expressão. Porque eles não querem assim, porque eles têm candidato. Os dois, nós sabemos, são defensores do Lula, querem o Lula presidente", disse.
É um sinal de que vai apelar ainda mais ao mote de candidato contra o "sistema" que agasalha corruptos e o impede de governar. É teoria da conspiração com fumaças golpistas.
Bolsonaro também açula sua base mais fanática com uma dose de reforço de sua campanha contra as vacinas, sabotando a imunização das crianças e fazendo ataques injuriosos à Anvisa. É um indício de que vai apelar aos piores sentimentos e ignorâncias para manter junto de si o que restou de seu eleitorado.
Sim, piores sentimentos: na sua vadiagem dezembrina, fez questão de se mostrar indiferente aos sofrimentos de quem morreu ou perdeu tudo nas enchentes da Bahia.
Na frente política, deu a Ciro Nogueira mais poder de dirigir para ali ou acolá doces gordos do Orçamento. Nogueira é ministro da Casa Civil, presidente licenciado do PP, cardeal, pois, do centrão e deve ser um dos coordenadores de campanha de Bolsonaro. Vai se pagar palanque com rabichos do Orçamento.
Bolsonaro ainda quer dar um jeito de reajustar salários de policiais federais até a metade do ano. Não rende voto e, se houver aumento, vai dar rolo com servidores, talvez contraproducente. Mas ele quer manter a fidelidade de parte dessa tropa. Para quê?
O arsenal de loucuras pode garantir presença no segundo turno, uma sobrevida para tumultuar a eleição o quanto puder.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2022/01/bolsonaro-golpista-bota-asinhas-de-fora-e-da-pista-da-campanha-eleitoral.shtml
Bruno Boghossian: Moro busca atalho no lamaçal para conquistar voto conservador
Nenhuma investida de Sergio Moro na corrida presidencial pareceu tão intensa até aqui quanto a busca pelo voto conservador. O ex-juiz escalou um advogado evangélico para coordenar essa área da campanha e se reuniu com mais de 50 líderes religiosos. Na última semana, ele disse que pretende lutar contra a "sexualização precoce" de crianças.
Não há candidato que defenda o contrário, então a promessa de Moro poderia ser encarada como uma proposta vazia para enfrentar um problema inexistente. Essa plataforma, no entanto, lembra o jogo sujo que o bolsonarismo explorou para demonizar adversários e assegurar o domínio do eleitorado conservador.
Em 2018, Jair Bolsonaro transformou a questão num ponto central da campanha. Ele dizia que a esquerda distribuiu na rede pública de ensino um livro infantil que "estimula precocemente as crianças para o sexo". Depois de eleito, usou o tema para esconder os fracassos de seu governo e afirmou ter zerado "aquela sexualização na escola".
O bolsonarismo trabalhou para difundir uma falsa ameaça que só o capitão poderia combater. Apoiado por influenciadores e líderes religiosos, inundou as redes sociais com desinformação e ataques à educação sexual. Sem apresentar nenhum programa consistente, uniu em torno de sua candidatura cerca de dois terços do eleitorado evangélico, um segmento notadamente conservador.
Moro parece disposto a buscar um atalho pelo lamaçal para tomar esses votos de Bolsonaro. Uma maioria significativa (87%) dos eleitores evangélicos dizem conhecer o ex-juiz, mas só 8% votam nele no primeiro turno. Segundo o Datafolha, só 5% dos entrevistados desse grupo o identificam como o candidato "que mais defende os valores da família tradicional brasileira".
O coordenador da campanha de Moro no eleitorado evangélico, Uziel Santana, disse que o ex-juiz se apresenta como um "conservador moderado". Em alguns casos, porém, o candidato caminha em terreno próximo dos desvarios bolsonaristas.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/bruno-boghossian/2022/01/moro-busca-atalho-no-lamacal-para-conquistar-voto-conservador.shtml
Não há espaço para Alckmin ser vice de Lula pelo PSD, diz Kassab
Denise Rothenburg e Taísa Medeiros / Correio Braziliense
Com otimismo e confiança na candidatura do senador Rodrigo Pacheco ao cargo de presidente da República em 2022, Gilberto Kassab, presidente do Partido Social Democrático (PSD), falou com exclusividade ao Correio sobre o que se desenha para o plano de governo. Kassab, que é ex-prefeito de São Paulo, ex-deputado federal e ex-ministro, adiantou que educação e saúde terão prioridade na pauta do PSD.
No último levantamento da Ipespe, divulgado na sexta-feira (14/1), o pré-candidato do PSD aparece com apenas 1% das intenções de voto. O cenário não preocupa Kassab: "Na minha campanha eleitoral para prefeito de São Paulo, no mês de junho eu tinha 3%, e eu ganhei as eleições do Geraldo Alckmin e da Marta Suplicy. Hoje, com os meios de comunicação ágeis, com as redes sociais, nós conseguimos mandar uma proposta a todo o Brasil em um espaço muito curto de tempo", argumenta.
Quanto à possível candidatura de Alckmin como vice do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Kassab afirma que seria "leviandade comentar sem saber as circunstâncias", e, por isso, prefere aguardar as cenas dos próximos capítulos. Apesar disso, garantiu que não há vaga no PSD para que Alckmin entre como candidato a vice com Lula. Confira a entrevista:
Quais são os planos do PSD para 2022? O partido terá candidatos em todos os estados?
No início do ano passado, nós iniciamos um projeto de levar à Presidência do Senado uma pessoa muito qualificada, que é o senador Rodrigo Pacheco. Ele ganhou a eleição do Senado, depois com o tempo acabou aceitando o convite do PSD. Depois da sua filiação, nós fizemos um grande encontro nacional do partido, onde abraçou a candidatura. Acredito que, até março, nós teremos um momento adequado para a manifestação dele. Eu tenho muita confiança de que ele acabe aceitando o convite.
Quanto às candidaturas de governador, é evidente que não dá para aguardar até março. Nós nos antecipamos, como qualquer partido. Nós temos um bom encaminhamento para as candidaturas a governador em, aproximadamente, 12 estados. Nós teremos bons candidatos em Santa Catarina, no Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Sergipe, Maranhão, Maceió, Mato Grosso do Sul… A partir de abril, com as pré-candidaturas, inicia-se a pré-campanha, a formação das chapas para deputado federal, deputado estadual, e, com isso, vamos nos consolidar como um dos grandes partidos do Brasil.
O senhor desistiu de Geraldo Alckmin como candidato em São Paulo? Ele vai mesmo ser vice do Lula?
O Geraldo Alckmin iniciou dizendo que seria candidato a governador, e nós acolhemos a sua candidatura, qualquer que fosse o partido. Em um determinado momento, ele nos procurou, desistindo de ser candidato a governador, o que eu entendo. Não existe nenhuma mágoa, nenhuma restrição à conduta. A partir desse momento, nós voltamos a procurar discutir os melhores nomes para nos representar, e estamos nessa fase.
Mas já saiu por aí que o senhor vai colocar como candidato um prefeito que hoje é do PSDB? Já está fechado isso? Um prefeito ali da região do ABC?
Não tem essa definição. Nós estamos levantando alguns nomes, que tem perfil para ser governador, pela formação, experiência política: Elias Paiva, Ricardo Patah, Guilherme Campos, Walter Rocha, Marco Bertagnolli, e alguns outros. O que as pessoas têm me perguntado, caso se filiem novos quadros, como o prefeito de São José dos Campos, o Felício, que inclusive era para ser filiado no último dia, mas por conta de covid, acabou não se filiando. Seja o prefeito de Santo André, o ex-prefeito de Santos, é evidente que se tiver o ok deles poderemos avaliar também o nome. Hoje, o que temos de concreto, são os que já estão no PSD, e que é certo que estarão vindo para o partido, são os colegas de São José dos Campos.
E como o senhor avalia essa decisão de Geraldo Alckmin de dizer que não será candidato a governador, que pelo que o senhor está contando, ele já disse. E aparecer como candidato a vice de Lula?
É difícil fazer uma análise quando a gente não conhece as circunstâncias. Então, eu prefiro aguardar um pouquinho para ver o que é essa circunstância, se ela vai se concretizar, o que envolve… Para, depois, me manifestar em relação ao acerto ou não da aliança. Eu não tenho o conhecimento necessário dos detalhes da conversa, que, talvez perante a opinião pública, não é definitivo, eu vejo pelas manifestações que é um desejo de alguns, de ambas as partes. Vamos aguardar, porque falar que tem ou não tem sentido sem entender o que está sendo discutido é até leviandade.
O senhor vê perspectiva dessa união dar certo, uma vez que já tem um grupo do PT com manifesto correndo contra a colocação de Geraldo Alckmin como vice numa chapa com Lula?
Eu sou contra a coligação nas eleições. Trabalhei para que a gente acabasse com as coligações nas eleições proporcionais. E se a gente tivesse acabado com as coligações nas eleições majoritárias, a gente não estaria vivendo esse processo. Nós estaríamos discutindo propostas de governo, compromisso com a nação. Hoje, você só tem jogo de palavras, as pessoas prometendo isso ou aquilo, e ninguém examinando com profundidade a questão das contas públicas, como vamos zelar pelas contas públicas, a questão da saúde, como vamos investir, mas, por outro lado, acompanhar com fiscalização mais rigorosa. Essa pandemia mostrou que o SUS é fundamental, a saúde pública é fundamental. Nós temos que falar de informatizar a rede. Como pode num país dessa dimensão a rede pública não estar informatizada? Tem algo por trás... Seria tão fácil, é uma questão só de investimento. Na educação, nós tivemos, com essa pandemia, uma clara evidência de quanto nós estamos mal no ensino público. Nós vimos as crianças que estão no ensino público ficarem paralisadas dois anos, ao passo que as crianças do ensino particular não tiveram em nenhum momento a interrupção dos seus estudos. Aumentou o distanciamento social. É isso que a gente precisava ficar discutindo, não discutindo se vão apoiar fulano ou ciclano. Não é isso que o brasileiro quer saber, ele quer saber quando nós vamos melhorar o Brasil.
Aproveito essa sua colocação para questionar o projeto de governo que será apresentado pelo PSD aos brasileiros. Nas últimas entrevistas, o senhor comentou que haverá destaque especial para a educação e a saúde. Isso procede?
Já se consolidou no partido a tese de se privilegiar a questão da saúde e da educação, foi convidado para compor como coordenador de um plano de governo para o agronegócio e agricultura, o ex-ministro Roberto Rodrigues, que aceitou. Isso não quer dizer que ele irá votar em Rodrigo Pacheco, vamos deixar claro. Se outros candidatos quiserem dele o mesmo empenho, ele terá, mas o Rodrigo tem no Roberto Rodrigues uma relação de muita confiança. Com muita calma, vamos construindo o resto do plano de governo. Na economia, ele também gosta de ouvir o Armínio Fraga, também não significa que o Armínio tá com o Rodrigo, mas ele lê muito os textos do Armínio, e é uma referência para ele.
Eles já conversaram?
Estiveram juntos poucas vezes e estarão outras vezes, sem nenhum compromisso do Armínio Fraga com a pré-candidatura ou com a candidatura.
Está consolidado: a gente pode dizer que Rodrigo Pacheco vai ser candidato? Ou isso ainda pode mudar?
Não podemos considerar consolidado porque ele ainda não deu o seu ok. E eu dou razão a ele, é presidente do Senado, tem muitas responsabilidades, não percebi nenhuma tensão no partido em relação a sua candidatura, então, ele tem que avaliar com muita calma. Eu sou daqueles que torce e trabalha para que ele aceite, e, com muita calma, eu imagino que ao longo do mês de março ele vai se definir. Eu tenho uma confiança muito grande que a definição será pelo aceitamento.
E dá tempo de ele subir nas pesquisas e quebrar essa polarização? Ou algum outro candidato o senhor acredita que possa quebrar essa polarização?
Na minha campanha para eleição para prefeito de São Paulo, no mês de junho, eu tinha 3%, e eu ganhei as eleições do Geraldo Alckmin e da Marta Suplicy. Hoje, com os meios de comunicação ágeis, com as redes sociais, nós conseguimos mandar uma mensagem,uma proposta a todo o Brasil em um espaço muito curto de tempo. Eu não vejo nenhum problema e nenhuma necessidade de antecipar o calendário.
Voltando a falar de Alckmin, é seguro dizer, então, que ele não tem vaga no PSD para ser candidato a vice?
A franqueza é muito importante. Nós não vamos deixar uma pessoa do gabarito de Geraldo Alckmin se filiar sonhando com algo que possa não acontecer. Nós temos, no PSD, quadros muito valorosos, que, se por acaso tivesse uma aliança, seriam apresentados para ser o vice, caso tivesse essa aliança. Faço isso de uma maneira muito respeitosa, ele é muito qualificado, mas não vejo a menor chance dele ser vice do Lula pelo PSD.
E se o Alckmin quiser voltar? E ser candidato a governador? Aceita ele de volta?
Se ele tiver um projeto definido. Se já tivermos candidato a essa altura, fica difícil, mas impossível nunca é. Mas tudo será feito com respeito a um projeto que tenha sido colocado com apoio do partido.
Pacheco está vindo aí meio espremido entre o centrão, que faz parte do grupo que ajudou a eleger (e que já está) com Bolsonaro, e a oposição está com Lula. Como vai ser essa atração de partidos? O senhor vislumbra alianças para Rodrigo Pacheco?
Nesse momento, o partido está muito bem estruturado. Nós, a partir do momento que o Rodrigo der o ok ao convite do partido, ele terá uma rede aqui dentro muito importante, e vai ter a disposição dele os meios de comunicação e as redes sociais para levar a sua mensagem, o que levará ele, a ser muito conhecido em pouco tempo, e mais do que ele ser conhecido, as suas propostas serem conhecidas. Ele é muito bem preparado, talentoso, tem tudo para conquistar a confiança do eleitor, como ele conquistou quando foi candidato a deputado federal, como conquistou quando foi candidato a senador, e não será diferente como candidato a presidente.
E como vê a candidatura de João Doria, o senhor que já trabalhou no governo dele, que já esteve mais ao lado do PSDB? Como vê o PSDB hoje e essa pré-candidatura? Há possibilidade de união entre ele e Pacheco num primeiro turno?
Não. O Pacheco vai até o fim, eu espero, e eu acredito que realmente o João Doria está em campanha desde que assumiu a Prefeitura de São Paulo. E depois se elegeu como governador, e não está decolando com uma campanha intensa de praticamente seis anos. Ele está com dificuldades. É uma situação distinta, porque o Rodrigo nem começou a pré-campanha, nem disse ainda se vai aceitar ser candidato.
Em relação ao ex-juiz Sergio Moro, como o senhor vê a candidatura dele?
Assim como o João Doria, ele já está em campanha. Está com um número um pouco mais elevado, acho que a sua pré-candidatura colocada nesse momento atrapalhou um pouco os planos do Doria, porque ele ocupou um espaço que poderia ser do Doria, mas temos que aguardar as próximas semanas para ver se crescerá ou seguirá estagnado.
Em relação a essa união no primeiro turno, o senhor vê perspectiva? A união entre esses candidatos chamados de terceira via?
Acho difícil, e é compreensível. Já são poucos candidatos.
Como vê a candidatura de Bolsonaro? O senhor chegou a dizer que não acreditava na ida do presidente ao 2º turno. Continua pensando assim ou essa sua avaliação já mudou?
Continuo dizendo que se um dos dois não estiver no segundo turno, provavelmente, será o Bolsonaro. Diante das pesquisas, é a avaliação política que faço e da conduta do presidente.
E o senhor criticou o “chute no balde” que ele deu nos tetos de gastos para que pudesse fazer medidas eleitoreiras. Como está vendo o Auxílio Brasil? É uma medida eleitoreira? O brasileiro percebe isso?
Não, o Auxílio Brasil não é uma medida eleitoreira. O governo tem obrigação de colocar à disposição dos menos favorecidos esse recurso, que é do governo. O que eu vejo com muita preocupação, é o descontrole das contas públicas. Não há controle nenhum das contas públicas, o teto de gastos foi para o espaço. Veja se tem sentido, no decorrer do orçamento, o governo mudar de mãos, tirar da economia, para colocar na Casa Civil. São critérios diferentes, pessoas diferentes, cadê a lógica? Como é que pode você, como brasileiro, aceitar que o Congresso invista, gaste, mais de R$ 16 bilhões, no tal do orçamento secreto, que não tem nenhuma vinculação com o planejamento, o desenvolvimento do país. Alguma coisa está errada.
Por falar em orçamento secreto, o senhor acha que isso veio para ficar ou vai ser possível tirar, acabar com essas emendas do relator, que receberam esse apelido?
Na próxima legislatura eu vou estar entre aqueles que vai se manifestar pelo fim dessas emendas, porque realmente, elas atrapalham o país. Você não pode ter R$ 16 bilhões sem vinculação com o planejamento estratégico. Na próxima legislatura, vamos trabalhar para acabar com a coligação majoritária, são duas medidas fundamentais.
Ou seja, cada partido vai ter que ter o seu candidato a presidente então?
No segundo turno, apoia. Caso não tenha segundo turno, por causa das eleições municipais, você, com os vereadores eleitos, você negocia governabilidade, o que acontece em qualquer lugar do mundo.
Acha que isso passa?
Eu vou trabalhar pra passar.
E o senhor falou que o PSD vai defender o fim das emendas de relator. O senhor acredita que o futuro presidente vai ter que fazer um pacto com o congresso pela governabilidade, em relação ao Orçamento, depois dessa captura do orçamento pelas presidências da Câmara e do Senado?
Pela lógica, o Congresso, pela sua disposição e por ter um volume de recursos maior do que o próprio Executivo, isso não tem lógica nenhuma. Cada um dos deputados e senadores fazer o que quiser, basta ir lá bater na porta do do presidente da Câmara e falar “olha, quero esse dinheiro para aquele município”. Eu vou trabalhar para nós retomarmos o Orçamento para o Executivo. Se não for bem sucedido, eu vou estar em paz com minha consciência.
Agora o senhor tem ouvido isso de outros presidentes de partido ou vai como um cavaleiro solitário nessa missão?
Infelizmente estou sozinho. Mas acho que vai aparecer muita gente do bem que vai defender. Os próprios parlamentares, que antes de mais nada querem o melhor para o Brasil, vão acabar se convencendo.
Como é que o senhor vê o Centrão atuando? Até hoje, quem está ali mais organizado para concorrer à reeleição é o presidente Jair Bolsonaro, que já tem o PL, o PP, o PTB, PSC, o Republicanos… Não acha que ele chega bem para se fortalecer para um segundo turno?
O coração da candidatura de Bolsonaro é o PP, o PL e o Republicanos. É um coração forte, o Centrão. Eles vêm carregados de recursos com as emendas que são distribuídas aos municípios. Eu não acredito que o presidente Bolsonaro seja carta fora do baralho para o segundo turno.
O PT está trabalhando para ganhar a eleição em um primeiro turno. O senhor acredita nessa possibilidade?
Não acredito, acho muito difícil. Com a animosidade compreensível da pré-campanha que se inicia em abril, terá um desgaste.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/01/4977824-nao-ha-espaco-para-alckmin-ser-vice-de-lula-pelo-psd-diz-kassab.html
Covid: Pesquisa Datafolha revela dimensão da subnotificação no Brasil
DW Brasil
Pesquisa Datafolha publicada neste sábado (15/01) aponta que um entre quatro brasileiros com 16 ou mais anos de idade afirma ter ter sido diagnosticado com covid-19 desde o início da pandemia no país. Segundo o instituto, um total de 41,95 milhões de pessoas teriam sido contaminadas no Brasil desde março de 2020.
O número representa quase o dobro dos casos oficialmente notificados no país. Segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) deste sábado, 22.927.232 foram oficialmente diagnosticadas com covid-19 no país.
Ainda segundo o Datafolha, o número verdadeiro pode ser ainda mais alto do que os quase 42 milhões detectados na pesquisa, já que o levantamento do instituto engloba apenas casos de pessoas com mais de 16 anos, enquanto os dados oficiais incluem todas as idades.
Para especialistas ouvidos pelo jornal Folha de S.Paulo, a diferença entre as cifras não é nenhuma surpresa, já que o país tem problemas conhecidos na sistematização de dados de infectados, incluindo deficiências na padronização do envio dos dados de testes com resultado positivo a serem contabilizados pelo governo federal. Os problemas persistem mesmo dois anos depois do início da pandemia.
O jornal ainda destaca que há um alto número de testes rápidos de covid-19 feitos em farmácias ou outras unidades que não entraram nas estatísticas oficiais, "problemas dos sistemas de informação entre os municípios, estados e o Ministério da Saúde e até mesmo a falta de estímulo das equipes para a notificação dos casos positivos".
"Os casos oficiais representam apenas a ponta visível do iceberg. A parte submersa, os casos não captados pela estatística oficial, é muito maior. Isso decorre de uma política fracassada de testagem", disse à Folha o epidemiologista Pedro Hallal, coordenador do estudo Epicovid-19. "O dinheiro do povo foi usado para produzir placebo, a cloroquina, e não para investir em testes ou máscaras, que são coisas que realmente funcionam para frear a pandemia", completa.
O Datafolha ainda apontou que a subnotificação tem aumentado no Brasil. De acordo com o levantamento, 3% dos entrevistados afirmaram ter tido covid-19 nos últimos 30 dias. A porcentagem representa 4 milhões de pessoas - o sêxtuplo do número indicado nos dados oficiais coletados no período, que somaram pouco mais de 620 mil novos casos positivos.
A pesquisa foi feita por telefone nos dias 12 e 13 de janeiro, com 2.023 pessoas de 16 anos ou mais em todos os estados do Brasil. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
Para piorar, a pesquisa aponta que 8,1 milhões de brasileiros não conseguiram encontrar testes para diagnosticar a doença em farmácias ou unidades de saúde nos últimos 30 dias.
O levantamento do Datafolha foi feito por telefone nos dias 12 e 13 de janeiro, e ouviu 2.023 pessoas de 16 anos ou mais em todos os estados do país. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/pesquisa-revela-dimens%C3%A3o-da-subnotifica%C3%A7%C3%A3o-de-casos-no-brasil/a-60438535