Day: maio 2, 2020
Morre o filósofo Ruy Fausto, aos 85 anos, um dos principais teóricos do marxismo
Professor emérito da USP e Doutor em Filosofia pela Sorbonne, ele teve um enfarto em Paris, na França
RIO — Morreu nesta sexta-feira, 1, em Paris, o filósofo Ruy Fausto, aos 84 anos, vítima de um enfarto. A informação foi confirmada pela Companhia das Letras, editora de seu último livro, "Caminhos da esquerda: elementos para uma reconstrução" (2017). Um dos principais teóricos do marxismo no Brasil, ele é irmão do historiador Boris Fausto.
Nascido em São Paulo, em 1935, Ruy Fausto formou-se em Filosofia em 1956, na USP. Após o golpe militar de 1964, ele fugiu para o Chile e depois para a Europa. Seguindo carreira universitária na França, fez doutorado em filosofia na Universidade Paris. Frequentou por alguns anos a Paris VIII, onde trabalhavam filósofos importantes como Gilles Deleuze, François Lyotard e François Chatêlet.
Em uma entrevista para a Revista da USP, em 2017, o pensador resumiu as suas preferências na vida acadêmica. "Meus interesses foram sempre dois: lógica e política", definiu.
Apoiando-se nesses dois pilares, tornou-se um dos principais teóricos do marxismo no país. Sua obra mais conhecida é "Marx: Lógica e política", que teve três volumes e é um clássico do pensamento político. Na série de ensaios, que começou a ser publicada em 1983, o filósofo investiga os fundamentos lógicos da crítica da economia política, e a prática derivada do marxismo.
- Ruy Fausto representa toda uma geração de intérpretes do Brasil - diz a historiadora Lilia Moritz Schwarcz. - Ele ficou muito conhecido como um pensador marxista, mas não creio que esse termo faz juz ao seu pensamento. Ruy usou seu conhecimento fundamental do marxismo e o usava com muita crítica para analisar os nossos impasses. Com isso, provocava a interlocução de pessoas dos mais diversos espectros políticos. Era um pensador de esquerda que não cabia numa caixinha, que não se acomodava na lógica de um partido ou de uma ideologia.
Entre a política e a filosofia, Fausto publicou livros que discutem os rumos da esquerda no país, como "A esquerda difícil: Em torno do paradigma e do destino das revoluções do século XX e alguns outros temas" (Perspectiva, 2007) e "Outro dia: Intervenções, entrevistas, outros tempos" (Perspectiva, 2009), entre outros.
Em 2017, ele lançou "Caminhos da esquerda: elementos para uma reconstrução", uma seleta de artigos em que analisa os erros e propõe um novo trajeto da esquerda no país. Na época, o filósofo disse que a esquerda no país "ia de mal a pior". Em sua última entrevista para a revista ÉPOCA, em 2019, Ruy clamou pela criação de uma "frente ampla" que incluísse também o centro - e sem Lula como candidato.
- Precisaríamos pensar, desde já, numa frente de esquerda e para além da esquerda, se for possível - disse o filósofo. - Precisamos urgentemente de uma “geringonça” brasileira. Uma aliança de forças. Só ela poderia nos salvar.
Segundo Sergio Fausto, seu sobrinho, Ruy teve um infarto enquanto tocava piano. Apreciador de jazz, o filósofo costumava dizer que a música o havia salvado algumas vezes. "Sou meio músico amador, medíocre na chamada música “erudita” (que, entretanto aprecio), mas que se vira mais ou menos, na popular", revelou ele em uma entrevista de 2017.
Monica de Bolle: Como uma onda no mar?
Quem prefere encarnar o surfista alienado cuja imagem ficou associada à música que intitula este artigo está, neste momento, agindo de forma imoral
“Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia.” Sem dúvida alguma. E, sim: “tudo passa, tudo sempre passará”. Mas a epidemia não vem em ondas mais ou menos simétricas, como o mar. A epidemia vem em onda forte seguida de outras ainda fortes, em onda moderada seguida de ondas fortes, em onda que tudo varre e ainda pode ser seguida do mais profundo descalabro.
A evolução depende de como os governos se comportam. Também depende de como os governos se comportam dentro da realidade de cada país. Não adianta imitar a Suécia, apostar na imunidade de rebanho e deixar a onda passar. Primeiramente porque não sabemos o que haverá de ser das escolhas da Suécia. Depois, porque o Brasil não é a Suécia. Por fim, porque os suecos estão respeitando o distanciamento social sem quarentena, por conta própria. Trata-se de questão de comportamento.
Muito me preocupam os cenários econômicos. Não por sua extrema gravidade. Eles me preocupam porque muitas vezes se baseiam em premissas equivocadas, como a de que haverá uma primeira onda — essa que estamos atravessando — seguida de onda mais mansa, ou de uma sequência de ondinhas. É este tipo de premissa que escora as projeções do FMI: a onda forte é agora, no segundo semestre haverá outra, mais fraca, e, depois, vida que segue.
Muitos economistas estão seguindo essa linha de raciocínio para justificar suas posições. Alguns resolveram inclusive ignorar já a primeira onda, voltando a apoiar uma agenda de reformas que, francamente, diz respeito a um mundo que não existe mais. Entre esses consta o ministro da Economia brasileiro, que resolveu mudar o tom no momento em que o país entra na fase mais crítica da crise humanitária. Com ele foram os economistas de mercado e todos aqueles que preferem ignorar a realidade. A realidade é que a capacidade hospitalar da cidade de São Paulo está se esgotando.
A realidade é que a taxa de mortalidade no Rio de Janeiro entre os mais pobres já é muito mais elevada do que entre os mais ricos. Quem prefere encarnar o surfista alienado cuja imagem ficou associada à música que intitula este artigo — nada contra a música, gosto muito — está, neste momento, agindo de forma imoral. Queiram os economistas ou não, há uma dimensão moral nesta crise que não será esquecida.
Se alguém parasse para olhar os dados brasileiros — que estão subnotificados —, observaria que o número de casos no país está subindo rapidamente a cada dia. O número de mortos já é maior do que o da China. Quando vocês estiverem lendo esta coluna, já teremos superado a China no número total de casos. Não estamos na crista da onda, prestes a nela deslizar com a destreza daqueles que o fazem de forma incansável nas praias do Rio. Estamos no pé de uma montanha cujo pico nos ilude. E do pé dessa montanha resolvemos, de uma hora para outra, ignorar nossos mortos, nossos doentes, os do presente e os do futuro, voltando à ladainha das reformas.
Porque soberano é o vírus, não o presidente da República ou o ministro da Economia.
Cadê a renda básica emergencial, que não chega nas mãos das pessoas? E as filas criminosas em frente à Caixa Econômica Federal para sacar o benefício? O que dizer da ausência de repasses fundamentais para os estados e municípios? O que falar do desembolso de apenas R$ 5 bilhões para o SUS até agora? Como se pode pensar em defender a redução de tributação sobre os bancos neste momento? E por que cargas d’água vamos querer avançar com medidas de austeridade contidas nas reformas se o que precisamos é de mais endividamento público para ao menos atenuar a depressão econômica?
O Brasil nunca viu uma deflação. O modo-padrão é logo morrer de medo de inflação, é dizer que não podemos nos endividar porque cairemos na espiral inflacionária de eras passadas. Mas não. Essa não é mais a realidade. A realidade é uma espiral de queda de preços extremamente danosa para a economia, para as pessoas. Nos vídeos que tenho feito para o YouTube tenho explicado o que é uma espiral deflacionária. Para os leitores interessados, recomendo assisti-los, pois, para nós, brasileiros, é algo inédito. Mas não é algo que, nós, economistas, desconheçamos, ainda que alguns não a tenham visto de perto.
Como uma onda no mar? Não. Como um tsunami a chegar no oceano de ignorância deste desgoverno.
*Monica de Bolle é Pesquisadora Sênior do Peterson Institute for International Economics e professora da Universidade Johns Hopkins
Coronavírus: Ciência busca vacina para salvar população contra pandemia
Reportagem da revista Política Democrática Online mostra que ameaça é ainda maior para 50 milhões de pessoas no Brasil
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP0
A corrida pela produção de vacina contra o coronavírus faz cientistas do mundo todo aumentarem os esforços em pesquisas para salvar a vida de milhares de pessoas. É o que mostra reportagem da nova edição da revista Política Democrática Online, produzida a editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), em Brasília. Mais de 100 testes de diferentes imunizações foram divulgados desde o início da pandemia. Ao menos sete estão sendo analisadas em pacientes humanos em diferentes países.
Todos os conteúdos da revista podem ser acessados de graça no site da FAP. No Brasil, onde também há testes em andamento, a ameaça é ainda maior para 50 milhões de pessoas adultas, o equivalente a um terço dessa população. Elas sofrem doenças crônicas ou passaram dos 60 anos, conforme mostra a reportagem.
» Acesse aqui a 18ª edição da revista Política Democrática Online!
O texto diz que, apesar de todos os esforços de pesquisa envidados em muitos laboratórios pelo mundo, inclusive no Brasil, a perspectiva mais otimista de contar com alguma vacina ou tratamento eficaz contra o coronavírus deverá tardar, mas não há saída à certificação da ciência.
Pesquisadores da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) realizaram levantamento sobre a quantidade de pessoas no grupo de risco no Brasil, onde a ciência também tem de enfrentar obstáculos ainda maiores devido à politização do combate ao coronavírus, como no caso da exoneração do médico Luiz Henrique Mandetta do cargo de ministro da Saúde. Além disso, o presidente Jair Bolsonaro ganha cada vez mais destaque como líder que estimula parte da população a agir como ele próprio e não cumprir orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), como isolamento social e uso de máscaras.
A reportagem cita as pesquisas mais promissoras para o desenvolvimento da vacina contra o coronavírus no mundo. Os Estados Unidos desenvolveram a primeira proposta contra a Covid-19 a ser testada em humanos. Na China, uma vacina começou a ser testada um pouco depois da americana, mas foi a primeira a alcançar a fase 2 dos testes clínicos.
Pesquisadores da empresa farmacêutica chinesa CanSino recrutaram 500 voluntários neste mês. A técnica é similar à que havia sido usada no desenvolvimento de uma vacina contra o ebola. A CanSino aposta em patógeno modificado, do grupo dos adenovírus, como vetor. A reportagem lista outras vacinas que devem ser testadas em humanos também em outros países.
Leia mais:
» Lilia Lustosa lista filmes sobre universo das pandemias, como a do coronavírus
» ‘Vamos viver de forma dramática com Covid-19 até final do ano’, diz Helio Bacha
» ‘Bolsonarismo ultrapassa clã presidencial’, analisa Marco Aurélio Nogueira
» ‘É urgente enfrentar escalada autoritária de Bolsonaro’, diz editorial da Política Democrática
» Política Democrática: Tragédias do coronavírus e do governo Bolsonaro são destaques
» Acesse aqui todas as edições da revista Política Democrática Online