Day: abril 27, 2020
Luís Eduardo Assis: A morte das ideias
Nesta terra onde canta o sabiá, a tese do Estado mínimo está gravemente enferma
A covid-19 não vai apenas ceifar centenas de milhares de vidas. Algumas ideias do pensamento econômico liberal também correm o risco de morrer. O entendimento de que a austeridade fiscal é uma virtude absoluta e incondicional, por exemplo, está sob séria ameaça. Não que a tese gozasse de boa saúde. Ao contrário, ela já estava no grupo de risco desde a crise de 2008, quando os países ricos gastaram o que não tinham para evitar que a recessão fosse ainda mais profunda. Nesta nova crise, mais ampla e mais intensa, novamente os cânones da economia liberal foram mandados às favas em favor de uma ação pragmática. Gastar é tudo o que os governos podem fazer hoje.
O conceito de Estado mínimo já tinha sido conspurcado em dois livros recentes com títulos autoexplicativos, ambos certamente merecedores da ojeriza de nosso ministro da Economia (Austerity, the Great Failure, de Florian Schui, e Austerity, the History of a Dangerous Idea, de Mark Blyth). Para ambos, a austeridade é um mal desnecessário. Ela não funciona e está fundamentada apenas em princípios ideológicos e morais. Atacando por outro flanco, a Moderna Teoria Monetária também corroeu a ortodoxia econômica.
Para a principal porta-voz dessa vertente, Stephanie Kelton, que foi assessora econômica da campanha de Bernie Sanders, o governo não deve se preocupar com o crescimento da dívida pública desde que isso não ameace a inflação. Um Estado soberano que emite sua própria moeda sempre poderá se financiar por meio de novas dívidas. Mesmo o argumento de que as novas gerações herdarão o fardo de resgatar uma dívida pública maior é rechaçado com o exemplo da economia americana no pós-guerra. Os baby boomers nasceram devendo muito, mas ainda assim viveram um longo período de prosperidade que diluiu o ônus da dívida pública emitida pela geração que os antecedeu.
Nesta terra onde canta o sabiá, a tese do Estado mínimo está gravemente enferma. A descoberta de que o governo federal não tem dinheiro, mas ainda assim pode gastar centenas de bilhões é tão atordoante quanto encantadora. Governadores e prefeitos acharam o máximo serem ressarcidos da queda dos impostos sem que tenham de oferecer nenhuma contrapartida. Mas não só eles. O núcleo duro dos militares que cerca o presidente também se empolgou. Se não há o deus da austeridade, tudo é permitido.
O programa Pró-Brasil, anunciado na semana passada, é tosco, foi improvisado e está longe de fazer decolar os investimentos. Marca, no entanto, uma ruptura clara com os ditames austeros do Ministério da Economia. A desarticulação política do próprio governo auxilia no desmantelamento dos princípios ideológicos ultraliberais do ministro Paulo Guedes. É a casa da mãe Joana (e ela saiu para comprar pão).
Resta à equipe econômica abjurar a explosão de despesas e tentar organizar a fila dos pedintes. Desde o início, os economistas do governo aderiram ao aumento dos gastos com o mesmo entusiasmo com que um congregado mariano participa da turma da pipoca no carnaval de Salvador. Essa estratégia é contraproducente porque cria resistências dentro do próprio governo. Sem capacidade de articulação política, o Congresso Nacional vai se embriagar com a possibilidade de aumentar os gastos públicos.
Pode haver muita discussão acadêmica sobre as teses liberais de Paulo Guedes, hoje internadas, moribundas, na UTI. Mas a volta do populismo fiscal seria um preço muito alto a pagar pela incúria de um governo que parecia ter jurado a cruz da austeridade. Quando o mundo não acabar, se o mundo não acabar, será extremamente difícil para um governo acuado pela inépcia retomar os cânticos e louvores ao equilíbrio fiscal.
* Economista, foi diretor de política monetária do Banco Central e professor de Economia da PUC-SP e da FGV-SP.
Cacá Diegues: Sempre demais
Foi como se Moro estivesse reescrevendo um final de filme
Uma das cenas mais comoventes na história moderna do audiovisual brasileiro está na despedida de um jovem casal, na novela “Totalmente demais”, de Rosane Svartman e Paulo Halm, atualmente em reprise, às 19h, na TV Globo. Aquela é a última noite juntos de Eliza (Marina Ruy Barbosa) e Jônatas (Felipe Simas), no amplo salão de poltronas abalroadas, iluminado por luzes frouxas e com cartazes esquecidos pelas paredes, de um cinemão abandonado onde eles vivem. O rapaz dá à moça, como presente de despedida, a primeira sessão de cinema da vida dela, exibindo pedaços de película que achou por ali e juntou, trechos dilacerados de “Luzes da cidade”, filme de Charles Chaplin, o Carlitos.
Como o final do filme não estava entre os restos que Jônatas havia encontrado, ele conta a Eliza um que ele mesmo inventara. Ela o recusa e cria sua própria versão, o desenlace adorável que julga mais coerente com o que vira e imaginara. Naquela noite, eles finalmente transam, a primeira vez de Eliza. Há tempos não me emocionava tanto com uma construção dramática que, materializando um filme possível, poetizasse de tal maneira o cinema como arrebatamento.
Vivemos num país em que 100 milhões de cidadãos não têm esgoto tratado no lugar em que moram, a mais de 35 milhões lhes falta água, 12 milhões estão desempregados, e todos morrem de doenças que, em muitos outros países, já foram até extintas.
Quando o governo oferece, a esses cidadãos, um salário emergencial, para que possam continuar a carregar as pedras da sociedade, paga o vexame de descobri-los invisíveis, sem saber onde vivem ou por onde andam, sem nome e, imagine!, sem CPF. Vivemos num país em que a realidade impede qualquer ilusão, em que o cinema, para ser bom e valer a pena, parece condenado a ser cruel.
Vi a entrevista coletiva do ex-ministro Moro como um rompimento com essa hipocrisia social. Ali, um herói da Lava-Jato, com peito para mandar prender um ex-presidente tão popular, nos dizia que se enganara e que jogara fora, sem volta, seus 22 anos de magistratura tão bem-sucedida, em nome de uma ilusão que jurava sincera. Como se Moro estivesse reescrevendo um final de filme com o qual não contara, sem o mesmo entusiasmo ilusionista de Eliza. Mas certamente com a mesma fé no que bate na tela.
Desta vez, o vilão não apareceu em cena, como tantas outras vezes, em tantos outros filmes. Ele reapareceu mais tarde, em mais uma entrevista coletiva em que ninguém tem o direito de fazer perguntas. O presidente Bolsonaro, cercado por seus ministros, alguns muito tensos, negou quase tudo o que o demissionário dissera de manhã. Mas nem tudo. Por exemplo, deixou no ar a história de que exigia tomar conhecimento das investigações do STF no processo das fake news e no das manifestações antidemocráticas. A certa altura, me lembrei de matéria da “The Economist”, a revista de quem acredita que o capitalismo ainda pode se modernizar, chamando-o de “BolsoNero”. Um blockbuster — de produção caseira.
Todo país tem que honrar suas Forças Armadas. Depois dessa pandemia da Covid-19, então, o mundo será necessariamente muito diferente do que foi antes dela. Nossas Forças Armadas, no estado em que estiverem, terão um papel decisivo na construção do novo normal, para dentro e para fora da nação. Mas nosso capitão parece não entender assim, pois está sempre cobrando delas uma espécie de indiscutível apoio pessoal. Logo ele, que foi reformado tão cedo e chamado pelo general Ernesto Geisel de “um caso fora do normal, um mau militar”.
O Brasil precisa encontrar seu rumo, como Eliza e Jônatas procuraram o seu. Com empenho, mas também com uma certa modéstia para saber recuar ou avançar, conforme o que for necessário. O fundamental é que o país se construa comovente e para todos, como esse audiovisual, que Bolsonaro tanto despreza e prejudica. Somos sempre demais.
Rubem Medina: AI-5. É isso mesmo?
Discordar e não ser preso ou morto era só questão de sorte ou de ser amigo do ‘rei’
Você quer mesmo a volta do AI-5? Você, de fato, deseja o fechamento do Congresso Nacional? Você tem certeza de que o melhor para você e para o país será acabar com o Supremo Tribunal Federal? Você tem certeza? É isso mesmo o que você quer? Pois se é, bom, saiba que o que você deseja e quer muito já aconteceu um dia.
Por causa desse tal AI-5, que você diz amar, eu e meu pai fomos presos. Sabe por quê? Você não acreditaria! Garanto. Meu pai e eu fomos presos naquela época porque a gente se sentia como você se sente agora. Não com relação ao AI-5, mas com relação aos governos da época. A gente não gostava muito deles e resolveu dizer isso, como você faz agora com relação ao Congresso e ao Supremo. Fomos em cana. Sabe por quê? Porque instrumentos como o AI-5 foram criados para prender, torturar e até matar as pessoas que não pensam igualzinho ao ditador de plantão.
Ah!, mas você viveu naquele tempo e não foi preso? Sorte sua. Porque discordar e não ser preso ou morto era só questão de sorte ou de ser amigo do “rei”.
Eu estava no Congresso Nacional quando o ditador mandou fechá-lo. Eu já estava na política, desde muito novo e pela oposição, quando cassaram ministros do Supremo Tribunal Federal e garanto a você, não foi nada bom o que eu vivi naquele tempo: gente que eu gostava, admirava e até líderes que me inspiravam, como foi o caso de Juscelino Kubitschek, que sofreu horrores, vítima de processos imorais que não davam a mínima para essas coisas de amplo direito de defesa. Carlos Lacerda também.
Você deve se lembrar deles, a história é recente. E olha que o Carlos Lacerda pensava como você pensa agora, sabia? Acreditava que a intervenção militar seria coisa passageira, uma ajudinha só para alinhar as eleições. Morreu frustrado. E tinha aqueles que conseguiam enxergar o que de fato acontecia e tentavam contar a história correta mas foram calados pelos porões. Eram os brilhantes jornalistas com suas veias investigativas, questionadoras e inquietas, que, ao invés de serem criticados como podem ser hoje em dia, eram simplesmente apagados.
Você está contrariado com o Congresso Nacional e com o STF porque gosta do presidente da República, que você escolheu? Você está com raiva, em revolta e por isso defende o AI-5? Digamos que você consiga conquistar o que você quer. Como será quando a raiva passar? Você já pensou nisso? Você estará num país onde a raiva e o simples pensar diferente será duramente punido, com prisão, tortura e morte.
Então, minha amiga, meu amigo, vote e vote sempre. Coloque toda a sua revolta e sua raiva no voto, mas faça isso com a consciência de que a voz para mudar será a sua, e não de alguém que pouco se importa com você.
O AI-5 não gosta de voto. Ao contrário, abomina, odeia a ponto de prender, matar e torturar quem gosta de votar. Vote e mude com o seu voto aquilo de que você não gosta. Porque se acabaram com o seu direito de votar, você terá um trabalho enorme, muito desgaste e até poderá perder a vida na luta para que o seu direito retorne.
Está ponderando e argumentando internamente que os ministros do Supremo não são escolhidos pelo voto? Mas são sim! Os presidentes da República que você escolhe seleciona os nomes que quer prestigiar e eles são aprovados pelos senadores que você também, pelo voto, escolheu.
Pense nisso na hora de votar e, por favor, em nome do Brasil, dos seus filhos, netos e de você mesmo, pare com essa bobagem de defender o AI-5. Porque se AI-5 houvesse ainda por aqui, o presidente que você defende não estaria na Presidência, porque naquele tempo capitães e deputados não tinham chance alguma de chegar lá. Nem os operários ou as mulheres. E todos eles se se atrevessem a querer estar lá seriam presos, torturados e corriam o risco de perder a vida. E você também se os defendesse.
Pense bem nisso.
*Rubem Medina é economista e foi deputado federal por nove mandatos
Fernando Gabeira: Alto risco de tragédia
Para viabilizar sua trajetória política, Moro precisará se distinguir de Bolsonaro
Num momento em que todos reprisam, o governo é pródigo em lançar novelas inéditas. Mal acabou a novela Mandetta, entrou no ar a Sergio Moro, e começaram as filmagens da Paulo Guedes. O que está acontecendo na cabeça do presidente Bolsonaro? Ela foi sacudida pelo impacto do coronavírus.
Muitas mudanças estão sendo determinadas, no fundo, pela política escolhida por Bolsonaro para enfrentar este que é o maior acontecimento trágico no mundo moderno. Onde governos conservadores ou progressistas triunfaram, como é o caso da Austrália e da Nova Zelândia, Bolsonaro afundou.
Desde o princípio, tenho apontado a causa. Bolsonaro aderiu à camada de gordura que cerca o vírus e seus fluidos ideológicos e o transformou num tema da guerra cultural. Exatamente o oposto do que fizeram Scott Morrison, na Austrália, e Jacinda Ardern, na Nova Zelândia: despolitizaram o vírus.
Ainda esta semana, o chanceler Ernesto Araújo escreveu um artigo contra o que chama de comunavírus. Ele ficou impressionado com um livro do pensador de esquerda Slavoj Zizek que previa enfim a chegada do comunismo. Depois de sonhar com a classe operária ou mesmo o lúmpen proletariado, alguns teóricos de esquerda concentram suas esperanças no vírus como agente transformador. E os bolsonaristas acreditam.
Desde o princípio, Bolsonaro viu a chegada do vírus como algo que ameaçava seu governo. A única forma de neutralizar sua importância era adotar uma tese que permitisse neutralizar os impactos econômicos. Esta tese foi a de imunização de rebanho: a maioria vai ser contaminada, é melhor que isso aconteça logo para que nos livremos do vírus.
Bolsonaro jamais considerou seriamente o fato de que, se muitos se contaminarem ao mesmo tempo, o sistema de saúde entraria em colapso, muitas pessoas morreriam na porta dos hospitais ou em casa. Um cenário que, de certa forma, se desenhou na Itália e mais tarde, de forma grotesca, em Guayaquil.
Foi por aí que caiu Mandetta. E indiretamente Moro. Bolsonaro sempre pensou em concentrar poderes. Mas a impossibilidade de determinar sozinho uma política contra o coronavírus condensou seu drama. Os governadores e prefeitos tiveram um papel decisivo. O Congresso os apoiou, o STF chancelou essa autonomia local.
A relação com Moro já sofria um desgaste. Mas Bolsonaro, na sua solidão, reclamou da ausência do ministro em sua cruzada contra o isolamento social. Moro, segundo alguns, não só era favorável à política de Mandetta, como pensou em decretar multas para quem rompesse com o isolamento social. O que, aliás, acontece em muitos países da Europa.
Sem o Congresso, STF, ministro da Saúde e da Justiça, Bolsonaro deu um passo decisivo participando de manifestação antidemocrática diante do QG do Exército. Isso resultou num inquérito que acabou se entrelaçando com outro: o das fake news. Os investigados são os mesmos: apoiadores do presidente e, possivelmente, até familiares de Bolsonaro.
Moro teve uma chance de sair depois daquela manifestação. Possivelmente estava incomodado com a posição temerária de Bolsonaro sobre o coronavírus. Mas agora estava diante de uma posição temerária contra a democracia.
Moro não se pronunciou. Num determinado momento de sua trajetória, a mulher de Moro escreveu numa rede social que ele e Bolsonaro eram a mesma coisa.
Ele pode ter sido salvo agora pela maneira como cai. A tentativa de interferir na autonomia da Polícia Federal é algo que não encontra apenas resistência na corporação, mas em muitos setores conscientes da sociedade. É inconstitucional.
Nesse sentido, Moro cai de pé. Mas, para que sua trajetória política tenha viabilidade, será necessário se distinguir de Bolsonaro, algo que não fez quando esteve no governo. O tom de seu discurso de saída é um indício de que compreendeu isto. Pelo menos se distanciou da visão atrasada de submeter o trabalho da PF aos desígnios de um presidente. O que é no fundo um crime de responsabilidade.
Mas Moro indicou claramente que Bolsonaro teme o inquérito no Supremo. Resta agora ao STF assumir seu papel institucional e não amarelar diante da pressão de Bolsonaro.
É um governo que se aproxima de uma situação limite, como foi o caso de Collor e Dilma. Mas num contexto de pandemia que jogou o planeta na maior crise econômica e social da história contemporânea. Alto risco de tragédia.
O Globo: Após acusações de Moro, oposição planeja uma frente ampla anti-Bolsonaro
Impulsionados pela manifestação do ex-presidente Fernando Henrique, partidos de esquerda planejam atrair PSDB, DEM, Novo e Cidadania
SÃO PAULO — Impulsionados pela manifestação do ex-presidente Fernando Henrique em favor da renúncia de Jair Bolsonaro, políticos de esquerda planejam articular a construção de uma frente ampla pelo afastamento do atual presidente da República do cargo. Após as acusações do ex-ministro Sergio Moro, a ideia é atrair, entre outros, o PSDB, o DEM, o Novo e o Cidadania. Mas integrantes dessas legendas ainda são cautelosos.
No final do mês passado, um manifesto pela renúncia de Bolsonaro reuniu nomes como Fernando Haddad (PT), Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL), Flávio Dino (PCdoB) e Alessandro Molon (PSB), mas sem adesão do centro. A articulação inicial foi do ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro (PT).
Na sexta-feira, Tarso, que vinha sendo crítico de Fernando Henrique nos últimos tempos, saudou no Twitter a adesão do tucano ao afastamento de Bolsonaro. “Bem-vindo presidente. É hora de construir a unidade dos principais líderes políticos do país na defesa do estado social de direito. Se Bolsonaro não renunciar, construiremos a maioria política para o impeachment. Bolsonaro está matando o Brasil”, escreveu o ex-governador petista.
Para Tarso, o atual presidente não tem mais condições de comandar o país.
— Temos que unir um campo amplo, não demarcado ideologicamente, mas politicamente com quem está disposto a resgatar o funcionamento republicano do país. Esse é o critério agora de unidade. Temos que fazer um pacto republicano, democrático, recolocar o país dentro da trilha constitucional e apostar num processo de normalização política para chegarmos a 2022.
As tentativas de ampliar a articulação, que devem se intensificar após as denúncias de Moro, já vinham ocorrendo. Na última semana, por exemplo, Fernando Haddad conversou por telefone com Fernando Henrique e com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para discutir a situação da democracia brasileira.
Líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ) é otimista sobre as possibilidades de ampliação da frente pelo afastamento de Bolsonaro. Seu partido, que havia aderido ao manifesto de março, apresentou na sexta-feira um pedido de impeachment do presidente.
— À medida que a situação política do país vai se agravando, a tendência é ampliar o apoio a esse movimento pela renúncia ou pelo afastamento. Não é uma questão ideológica. O atual presidente está conseguindo unir o país contra si. As atitudes dele estão fazendo com que os diferentes acabem abraçando uma mesma tese, que é da impossibilidade da continuidade do mandato — avalia.
Mas fora da esquerda o movimento ainda é visto com ressalvas. O PSDB não pretende se engajar no momento numa frente pelo impeachment. A ideia entre os tucanos é antes ampliar o desgaste do governo Bolsonaro por meio de uma CPMI mista para investigar as acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça.
Candidato derrotado a presidente pelo Novo em 2018, João Amoêdo já se manifestou publicamente pelo impeachment, mas acredita que ainda não é hora para a construção da frente porque isso pode ser usado por Bolsonaro para se vitimizar. No seu entendimento, o presidente poderia dizer que a articulação é uma mobilização do “sistema” .
— O papel inicial que eu vejo é de explicar de forma didática para as pessoas os motivos que me fizeram ter essa posição pelo impeachment. Lá na frente isso pode afunilar. Mas vejo que é preciso caminhar de forma independente no primeiro momento.
Presidente do Cidadania, Roberto Freire entende também que ainda não é hora de levar o pedido de impeachment adiante porque não há mobilização da sociedade contra Bolsonaro. Ele defende, porém, uma articulação com todos os setores ideológicos.
— Só terá condições de sucesso se for amplo. Não há impeachment se não tiver uma ampla maioria, com a opinião pública.
Lula pode atrapalhar
Um outro empecilho para a construção da frente se daria caso o ex-presidente Lula, que vem defendendo o “Fora, Bolsonaro!”, decidir ingressar no movimento. Muitos políticos de centro-esquerda só aceitaram assinar o manifesto de março porque o ex-presidente não participou, apesar da adesão de nomes do PT como Tarso, Haddad e Gleisi Hoffmann, presidente da legenda.
— Quando Lula não assinou aquele manifesto, e eu queria que tivesse assinado, compreendi perfeitamente. Ele está se resguardando. É uma pessoa que ainda está sendo processada, sofre persecução judicial de uma maneira muito ilegal mas muito consistente do ponto vista prático. Então, há determinados requisitos para a sua atuação — disse Tarso.