Day: março 24, 2020

Ricardo Noblat: Mandetta, ministro da Saúde, uma estrela que cai

Seu afastamento ainda demora

Sentiu falta da sessão fim de tarde onde o ministro Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, disserta por horas sobre o combate ao coronavírus, alerta para a tragédia que se avizinha, e mesmo assim conforta o país e mostra que está no comando?

É possível que a sessão volte a se repetir hoje e nos próximos dias, mas com um Mandetta muito mais tutelado pelo presidente Jair Bolsonaro que, embora tenha dito, ontem, que a vida das pessoas está em primeiro lugar, preocupa-se de fato com a Economia.

A frase dele foi esta, uma pérola de ambiguidade:

“A vida das pessoas em primeiro lugar. Mas a dose do remédio não pode ser excessiva de modo que o efeito colateral seja mais danoso que o próprio vírus”.

Beleza, não? Pena que faltou a Bolsonaro originalidade, uma vez que o presidente Donald Trump havia escrito no Twitter algumas horas antes: “Não podemos deixar que a cura seja pior do que o problema”. Mais ambíguo impossível. Porém, mais conciso.

Trump conta com melhores redatores de frases e de discursos. Os de Bolsonaro são ruins. Falta-lhes imaginação. De resto, Trump domina bem o inglês e é um razoável orador. São conhecidas as dificuldades de Bolsonaro com o idioma e as ideias.

Ainda sob o efeito da recente pesquisa do Instituto Datafolha, que conferiu que a aprovação a Mandetta é maior que a dele, Bolsonaro reuniu-se eletronicamente com governadores do Nordeste e anunciou a liberação de 88 bilhões de reais para os Estados.

Depois promoveu o general Braga Neto, chefe da Casa Civil da presidência da República, à condição de coordenador de todas as ações do governo na guerra contra o coronavírus. O general falou em seguida. Quando chegou sua vez, Mandetta, digamos, miou.

Braga Neto era o chefe do Comitê de Crise criado por Bolsonaro há semanas. Mas para o público externo, era Mandetta que tinha o controle de tudo. Há poucos dias, quando Bolsonaro estreou o uso de máscara, Braga Neto entrou mudo e saiu calado da reunião.

Ciúmes, que decorrem de sua paranoia, e pontos de vista conflitantes. Eis porque Bolsonaro deu início à fritura do ministro da Saúde e valeu-se para isso de um general que tem horror à aproximação física com jornalistas e gosta de cultivar segredos.

O deputado Osmar Terra (PMDB-RS), ex-ministro da Cidadania, poderá suceder Mandetta no cargo. Em entrevista à TV Brasília, emissora local, revelou-se perfeitamente alinhado com Bolsonaro. Sua eventual escolha traria o PMDB de volta ao governo.

Brasil acima de tudo! Economia acima de todos! Deus pode esperar.


Merval Pereira: Comédia de erros

Pensar em flexibilizar o fim do confinamento é precipitado, diante da crise que ainda enfrentaremos

O presidente Bolsonaro tem culpa de não ter lido o texto da Medida Provisória que permitia às empresas suspender por até quatro meses os contratos trabalhistas, sem necessidade de pagar o salário desse período.

Quando se deu conta do estrago que a decisão faria, com trabalhadores em casa sem o salário para sustentar a família, suspendeu a medida provisória que havia promulgado na noite de domingo e até a manhã de ontem defendia.

Mas na defesa, Bolsonaro mostrou que a ideia era outra: “Ao contrário do que espalham, (a MP) resguarda ajuda possível para os empregados. Ao invés de serem demitidos, o governo entra com ajuda nos próximos 4 meses, até a volta normal das atividades do estabelecimento, sem que exista a demissão do empregado”.

Só que não havia esse compromisso do governo no texto da medida provisória, muito menos a garantia dos empregos suspensos. A explicação oficial foi “um erro de digitação”, como justificou o ministro da Economia Paulo Guedes. Erro que também ele não notou antes do protesto de sindicatos e políticos.

Nos bastidores, há quem culpe assessores do ministro Paulo Guedes pelo “esquecimento” de incluir no texto esses compromissos do governo federal, que fazem toda diferença. Uma comédia de erros derivada de uma visão economicista da situação, misturada a um populismo rasteiro por parte do presidente Bolsonaro.

Ele ainda ontem insistia em que “a vida das pessoas está em primeiro lugar”, mas com um porém: “a dose do remédio não pode ser excessiva, de modo que o efeito colateral seja mais danoso que o próprio vírus.” Semelhante ao que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, um espelho para Bolsonaro, escreveu ontem no Twitter: “Não podemos deixar que a cura seja pior do que o problema”. Ele sugeriu que ao final dos 15 dias de isolamento social imposto, o governo pode rever essa decisão.

O presidente dos Estados Unidos, que no início da crise tinha uma posição negacionista como a de Bolsonaro, mudou radicalmente ao sentir que a crise era muito maior do que imaginava. Agora, diante da previsão de catástrofe econômica, ameaça voltar a uma posição mais economicista do que humanitária.

Nos Estados Unidos, com capacidade inigualável de injetar dinheiro na sociedade para mitigar os efeitos da crise, esse debate ainda é possível, embora muitos economistas importantes digam que não é preciso colocar a economia em oposição à defesa da vida.

Entre nós, então, com a deficiência de infraestrutura de saúde acrescida à situação precária em que vive a maioria da população, pensar em flexibilizar o fim do confinamento é precipitado, diante da crise que ainda enfrentaremos, especialmente quando o vírus chegar nas favelas das grandes cidades.

A postura leniente do presidente Bolsonaro, no entanto, tem constrangido até mesmo o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, repreendido por ter abordado o possível colapso do sistema de saúde como tema urgente neste momento. A tal ponto que o ministro, que tem recebido o apoio e o agradecimento da população por seu trabalho sério e ponderado, sentiu-se obrigado a fazer um elogio público ao comportamento do presidente da República.

Ontem, circulou na internet um vídeo do ex-ministro da Cidadania Osmar Terra, que voltou ao cargo de deputado federal, mas é candidato potencial ao ministério da Saúde, até mesmo por ser médico. Terra garante que, com exceção dos idosos e dos portadores de doenças pré-existentes, os demais cidadãos deveriam ter uma vida o mais normal possível, pois o vírus tem um ciclo de vida de 13 semanas que independe do confinamento.

Ele considerou “um absurdo” fechar lojas e shoppings, e disse que a economia vai ficar “destruída” e, com a falta de arrecadação, vai faltar dinheiro para manter o sistema de saúde eficiente. O que, ai sim, poderá provocar mortes.

Música para os ouvidos de Bolsonaro, tanto que o ministro Mandetta ontem, no Palácio do Planalto, pediu “calma e planejamento” para paralisações das atividades econômicas para coibir a disseminação do novo coronavírus. “Há lugares que pararam tanto que não tinham mecânicos para a manutenção de determinadas máquinas hospitalares, necessidades prementes que temos no dia a dia de unidades de saúde, de unidades de manutenção de água e esgoto”.


El País: Sem bússola, Governo Bolsonaro ignora proteção dos mais pobres em pacote e é obrigado a recuar

Apesar de o artigo sobre suspensão dos salários ter sido cancelado, cresce a percepção de que o Governo age de maneira atabalhoada e sem plano claro para manter renda da base da pirâmide

Um anúncio genérico e atropelado de uma medida econômica que deixaria os brasileiros sem salário por quatro meses deixou o Brasil boquiaberto nesta segunda, 23. A publicação de uma Medida Provisória (MP) neste domingo à noite vinha com a boa intenção de ajudar as empresas a preservarem empregos no meio da crise que teve início com o coronavírus. Mas a MP 927 trazia em um artigo a possibilidade de uma empresa suspender a folha de pagamento por quatro meses. O artigo teve o efeito de um míssil para a população, já assustada com a propagação da Covid-19. “A MP 927, que acabo de ler na íntegra, essencialmente põe diante dos trabalhadores a seguinte escolha: a peste ou a fome. Exagero? Imagine ficar 4 meses sem receber salário. Quatro. Meses. Sem. Salário”, alertou a economista Monica de Bolle.

A MP traz medidas trabalhistas a serem adotadas por empregadores. Mas foi um anúncio a seco, sem aviso prévio ou debate com a sociedade, que o presidente Jair Bolsonaro tentou salvar pelo seu Twitter, ao escrever que o Governo iria “entrar com ajuda nos próximos quatro meses” para os trabalhadores, com o intuito de preservar seus postos de trabalho. Nada se soube sobre qual o tamanho da ajuda, e de que maneira seria oferecida, o que deixou o país no escuro. A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) permite negociar redução de salários em situações excepcionais, como a que o Brasil vive agora com a crise do coronavírus, mas no limite de 25%.

O artigo acabou suprimido e o Governo anunciou que será reformulado, mas a percepção de que o presidente Jair Bolsonaro age sem uma bússola, em meio à maior tempestade que caiu no país, foi reforçada. Diante das críticas contra a MP, a hashtag #BolsonaroGenocida liderou o Twitter por algumas horas. O ministro da Economia, Paulo Guedes, buscou amenizar a situação ao final do dia classificando como “erro de redação” o artigo 18. “Isso [suspensão de salário] jamais foi considerado. Houve um erro na redação da MP. O que se queria era evitar as demissões em massa, dando alguma flexibilidade de salário, mas com o Governo complementando, como está sendo feita em várias economias”, afirmou ele ao jornal O Globo. “É assustador pensar que essa proposta tenha saído de alguém que estudou macroeconomia. A mensagem que ele passa é que o custo das empresas irá para zero e o da produção também, já que ficará sem demanda. Ele congela a economia”, afirma o economista Eduardo Correia, do Insper.

Desde o início da crise, o presidente tem batido na tecla de que é necessário blindar a economia. Tem feito diversos anúncios, mas com mais ênfase no socorro às empresas, sem um plano claro para proteger a renda da base da pirâmide da pirâmide —metade do Brasil, ou 104 milhões de pessoas, vive com 413 reais por mês, ou metade um salário mínimo por mês. De tanto pensar nelas, apresentou com a MP uma conta que não fecha. “Salva as empresas, mas elas vão vender para quem? Tem de ir [com medidas] pelos dois lados”, explica Sergio Vale, economista da MB Associados. Os dois lados, no caso, são a oferta de bens e serviços proporcionada pelas companhias, e pelo lado do consumidor, a demanda que requer renda para comprar o que as empresas colocam à venda. É a lei básica das relações econômicas, que vale para tanto para a quitanda da esquina, como para as companhias aéreas que estão à míngua durante a quarentena mundial pelo coronavírus.

Neste domingo, foi anunciado um pacote de 55 bilhões de reais do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para garantir recursos às empresas que ficarão sem receita em função da quarentena forçada que o surto de Covid-19 exige. Com menos gente na rua, há menos consumo de produtos e serviços. Somente mercados, farmácias e bancos estão funcionando normalmente. Mas bares, restaurantes, lojas de roupa, cinemas, etc, estão fechados enquanto os brasileiros se protegem. A intenção do BNDES é garantir empréstimos que podem ser pagos em prazos dilatados, para garantir que as empresas tenham o chamado capital de giro, que serve para pagar os custos fixos de um empreendimento: aluguel, luz, pagamento de fornecedores, uma vez que o caixa das companhias fica comprometido a partir deste mês. A ideia é contemplar pequenas, médias e grandes empresas.

Também o Banco Central anunciou nesta segunda uma redução da taxa de depósitos compulsórios dos bancos para poder injetar 68 bilhões de reais no sistema financeiro. O compulsório é a retenção obrigatória dos recursos dos bancos com o Banco Central, que obedecia um porcentual de 25%, e agora passa para 17%. Ou seja, de tudo que os bancos captam no mercado, eles eram obrigados a manter 25% depositados para o BC. Agora, essa taxa cai para 17%, dando mais margem de manobra às instituições financeiras para fazer empréstimos e repassar crédito na ponta. Outras medidas foram anunciadas para ajudar o setor privado.

A trinca de anúncios desde domingo mostra que o Governo Bolsonaro tem no horizonte de curto prazo um aumento do desemprego significativo, algo que coloca em risco o capital político do presidente, e que parece nortear suas ações neste período. Os primeiros sinais concretos de que o Governo perdeu o controle de uma economia que começava a se recuperar já aparecem. O setor automotivo, por exemplo, já prevê 34 fábricas paradas, segundo levantamento do jornal Valor. As projeções mais pesadas apontam que o desemprego pode quadruplicar. O presidente da XP Investimentos, Guilherme Benchimol, chegou a estimar neste domingo em 40 milhões o número de desempregados (hoje são 11 milhões) sem um plano para injetar recursos no mercado. E o que foi anunciado até aqui, é tido como tímido para economistas. “Parece que o Governo quer tirar o pé da solução e deixar para o setor privado, com uma proposta liberal clássica, num momento de crise como este. Falta noção da política fiscal necessária aqui”, diz Sergio Vale. Em crises de falta de liquidez, cabe ao Governo injetar recursos em ações anticíclicas, como tem proposto Donald Trump nos Estados Unidos e diversos países a Europa. Mas esta é uma escolha difícil para um Governo que se elegeu pregando o enxugamento do Estado.

Istvan Kasznar, professor da FGV, avalia que falta às propostas do Governo colocar o trabalhador que perderá renda em perspectiva. “É importante que o presidente do Banco Central repense o que vai fazer nesse momento dramático da economia, quando as pessoas não tem remuneração e se jogam no crédito, o acelerador de quebra bancária e pessoal é maior. O tsunami de quebra de pessoas físicas pode ser dramática”, diz Kasznar. Antes do coronavírus, o Brasil já somava mais de 60 milhões de endividados. A Federação Brasileira dos Bancos já fez anúncios para atenuar o quadro, dizendo que vai postergar pagamentos de dívida neste período.


Luiz Carlos Azedo: Meia volta, volver

”A estratégia de “mitigaçao”, que servia de modelo, fracassou na Inglaterra. Bolsonaro começa a se dar conta de que aqui também não seria possível”

Não durou 24 horas a medida provisória do governo federal que autorizava os empresários a suspender o pagamento de salários de seus funcionários por quatro meses, sem quaisquer contrapartidas, o que provocou uma avalanche de críticas ao presidente Jair Bolsonaro. A saída foi reconsiderar a questão, cancelar a medida provisória e abrir negociações com os governadores, contra os quais Bolsonaro havia entrado em guerra por causa da adoção da política de distanciamento social. “Determinei a revogação do art.18 da MP 927, que permitia a suspensão do contrato de trabalho por até 4 meses sem salário”, escreveu Bolsonaro em uma rede social. Ficou evidente a falta de sintonia entre a equipe comandada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e a política de combate ao coronavírus adotada pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.

Além da suspensão do contrato de trabalho e do salário, a MP estabelecia outras medidas: teletrabalho (trabalho a distância, como home office); regime especial de compensação de horas no futuro em caso de eventual interrupção da jornada de trabalho durante calamidade pública; suspensão de férias para trabalhadores da área de saúde e de serviços considerados essenciais; antecipação de férias individuais, com aviso ao trabalhador pelo menos 48 horas antes da concessão de férias coletivas; aproveitamento e antecipação de feriados; suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; adiamento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Todas em razão das medidas adotadas para conter a progressão da epidemia e evitar o colapso do sistema de saúde.

A epidemia avança: o total de casos confirmados do coronavírus (Sars-Cov-2), ontem, subiu para 1.891, segundo balanço do Ministério da Saúde, com 34 mortes. O coordenador da campanha em São Paulo, o infectologista David Uip, uma das maiores autoridades médicas do país, no final da tarde confirmou o diagnóstico de que está com a doença. São Paulo concentra 60% dos casos de coronavírus em todo o país. Depois do recuo quanto à suspensão dos salários, Bolsonaro resolveu reduzir o estresse com os governadores, realizando uma teleconferência com todos os mandatários do Nordeste e, depois, do Norte do país. Essas reuniões ajudaram o presidente da República a se reposicionar, conforme ficou patente no final da tarde, ao anunciar as medidas numa entrevista coletiva do comitê de combate ao coronavírus, da qual se retirou antes das perguntas.

Antes deu uma notícia boa: um plano de R$ 85,8 bilhões para fortalecer os estados e os municípios. Serão editadas duas medidas provisórias para transferir recursos para fundos de saúde estaduais e municipais. Segundo o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, o montante chega a R$ 88,2 bilhões, cujas principais medidas são: transferência de R$ 8 bilhões para gastos em saúde; recomposição de fundos de participação de estados e municípios, no valor de R$ 16 bilhões (seguro para queda de arrecadação); R$ 2 bilhões para gastos em assistencial social; suspensão das dívidas dos estados com a União (R$ 12,6 bilhões); renegociação de dívidas de estados e municípios com bancos (R$ 9,6 bilhões); operações com facilitação de créditos, no valor de R$ 40 bilhões. A suspensão do vencimento da dívida dos estados com a União reduziu o estresse de Bolsonaro com os governadores, pois os estados vão receber R$ 12,6 bilhões a mais em caixa para enfrentamento da crise.

Impacto social
Ontem, o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, mudou completamente a estratégia adotada pelo governo contra o coronavírus na Inglaterra. Anunciou que os britânicos só poderão se deslocar para ir ao trabalho, caso não possam realizá-lo remotamente, e para comprar itens essenciais ou para atender necessidades médicas próprias ou de pessoas vulneráveis. Serão fechadas todas as lojas que não vendam itens essenciais, assim como bibliotecas, playgrounds e locais de práticas religiosas, e todas as reuniões de mais de duas pessoas estão proibidas. A estratégia de “mitigaçao”, que servia de modelo para o governo brasileiro, fracassou na Inglaterra. Parece que Bolsonaro começa a se dar conta de que aqui também ela não seria possível.

É inevitável. A economia entrará em recessão com a política de isolamento social, em todo o mundo. Um dos efeitos imediatos será a perda de renda dos trabalhadores informais, microempreendedores e profissionais liberais; quem não tem poupança está no sal. Estamos falando de 70 milhões de pessoas. Outro, o impacto nas finanças dos estados e municípios (principalmente os que têm grande arrecadação de ISS e de impostos compartilhados com a União), que estão arcando com uma demanda exponencial no sistema de saúde, que ninguém sabe ainda qual será o tamanho.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-meia-volta-volver/


Rubens Barbosa: O impacto geopolítico do coronavírus

O mundo pós-pandemia deve emergir com novas prioridades, num novo cenário global

A epidemia do coronavírus – a pior dos últimos cem anos – terá profundas consequências sobre um mundo globalizado, sem lideranças alinhadas e pouco solidárias entre si. O impacto econômico e social vai ser profundo, com o custo recaindo nos mais pobres, fracos e idosos e em países menos preparados e desenvolvidos.

Os efeitos sobre os países e sobre a economia global estão sendo sentidos e deverão agravar-se antes de melhorar.

Como a geopolítica global poderá ficar afetada pela epidemia? O que poderá mudar no cenário global?

Duas observações iniciais. A crise atual mostrou que as fronteiras nacionais desapareceram com as facilidades do transporte aéreo e o imediatismo das comunicações. E que as políticas econômicas domésticas estão intimamente influenciadas pelo que acontece no resto do mundo. Nenhum país ou continente é uma ilha. Por outro lado, a extensão e a repercussão da crise, em larga medida, deriva do peso da China na economia global. No inicio da década, quando se disseminou a Sars, o país representava 4% da economia global, hoje representa 17%. A China é a segunda economia mundial, o maior importador e exportador do mundo e, para culminar, transformou-se num centro de suprimento de produtos industriais para as cadeias globais de valor.

Quais as consequências na relação entre os EUA e a China, as duas superpotências atuais? Nos últimos anos cresceu a competição entre os dois países pela hegemonia global no século 21. Os EUA, ao se isolarem e ampliarem ações confrontacionistas, protecionistas, nacionalistas e xenófobas, dificultam a interdependência dos países, como ocorre com a globalização. Enquanto os EUA apontam a China como adversária estratégica e criticam o governo pela condução da epidemia (vírus chinês), Beijing, ao invés de fechar as fronteiras, como fez Washington, favorece a abertura e a ampliação do comércio externo e manda médicos e equipamentos para a Itália, a Espanha e o Brasil a fim de ajudar a combater o coronavírus. A guerra fria econômica, a nova fase da confrontação, evidencia-se pela iniciativa chinesa da Rota da Seda, pela competição nas redes 5G e por conflitos sobre propriedade intelectual e inovações tecnológicas.

A pandemia poderá também ter efeito relevante no cenário interno dos dois países com consequências geopolíticas. Xi Jinping disse que caso a epidemia se prolongue haverá o risco de instabilidade econômica e social no país. A maneira como, de início, Donald Trump conduziu a crise epidêmica em seu país foi muito criticada e sua popularidade caiu. As prévias do Partido Democrata vêm definindo Joe Biden como o candidato contra Trump, com apoio do centro moderado. Caso essa tendência se firme, pela primeira vez seria possível pensar numa derrota do atual presidente. O resultado da eleição, em novembro, poderá ter efeitos importantes na geopolítica global caso haja uma mudança da atitude do governo de Washington em relação ao mundo.

Outra questão é como países e empresas reagirão para reduzir sua dependência do mercado e da produção de partes e componentes chineses nas cadeias produtivas. A tendência poderá ser uma gradual redução dessa dependência e alguns países mais preparados e organizados, como o Vietnã e alguns outros asiáticos, poderão sair ganhando com investimentos para substituir a China. Em médio prazo, a projeção externa das grandes economias vai depender de sua base produtiva nacional e de sua competitividade.

A estabilidade política e econômica global poderá ser significativamente afetada pela vigilância biométrica, que poderá vir a ser implantada para evitar epidemias futuras. A preocupação com a saúde poderá levar à invasão da privacidade, com possíveis reflexos em políticas totalitárias. Quanto à dramática queda do crescimento dos EUA e da China, as projeções apontam para uma redução norte-americana de 4% no primeiro trimestre e 14% no segundo. Para a China as estimativas de crescimento não são maiores que 3,5% para 2020. Caso os EUA entrem em recessão e as projeções sobre a China se confirmem, não se pode afastar a possibilidade de recessão e, no pior cenário, de uma depressão, talvez mais dramática que a de 1929, por não ficar limitada ao setor financeiro. Como os países emergentes, produtores agrícolas, sairão de um cenário tão dramático como esse?

A Europa está debilitada pela saída do Reino Unido e viu a situação humanitária, social e econômica agravada pela crise em alguns países, como Itália e Espanha. Em cenário dramático como o atual, é possível prever que o continente sairá com seu poder relativo diminuído.

O Brasil, uma das dez maiores economias do mundo, terá de se ajustar rapidamente à nova geopolítica global, sob pena de perder mais uma vez a oportunidade de se projetar como potência média em ascensão.

Em outros momentos da História, movimentos tectônicos transformaram o equilíbrio de poder entre as nações e os rumos da economia. O mundo pós-coronavirus deverá emergir com novas prioridades e com um novo cenário geopolítico, com a Ásia – em especial a China – em melhor posição para ocupar um crescente espaço político e econômico.

*Presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)


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