Dois ingredientes novos surgiram recentemente no caldo da conjuntura política brasileira, ambos com consequências potenciais de longo alcance. Em primeiro lugar, a marcha da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga as responsabilidades nas falhas havidas no enfrentamento da pandemia. Em segundo lugar, a retomada das manifestações de rua por parte das forças de oposição.
O trabalho da CPI trouxe à tona, até o momento, a omissão inacreditável das autoridades à frente do Ministério da Saúde no que se refere à provisão de vacinas em quantidade suficiente e tempo hábil para toda a população brasileira. De quebra, demonstrou sobejamente a tolerância de parte dessas mesmas autoridades com procedimentos de inocuidade comprovada no tratamento da doença, quando não o empenho na sua propaganda. Finalmente, levantou indícios de irregularidades nas negociações de compra de vacinas, indícios que demandam a continuidade da investigação.
O efeito pedagógico da CPI é potencializado pela audiência surpreendente que a TV Senado alcança na transmissão ao vivo de suas sessões. Milhões de espectadores são expostos aos depoimentos, aos argumentos de governistas e opositores, e têm a possibilidade de formar seu juízo sobre os fatos, a partir de informação de primeira mão.
O retorno das oposições às ruas, por sua vez, mesmo ainda que tímido, em razão da pandemia, foi suficiente para mostrar desempenho superior aos eventos convocados semanalmente pelo presidente, desde sua posse. E a tendência parece ser o crescimento do número de manifestantes de oposição nas ruas, à medida que avança o processo de vacinação.
O efeito combinado desses ingredientes, com a crise econômica como pano de fundo, é a queda continuada da popularidade do governo e do presidente nas pesquisas de opinião. Prossegue a migração dos apoiadores indecisos ao campo da reprovação do governo, no qual tendem a ficar apenas os irremovíveis, os convictos que já renunciaram ao exame crítico das próprias opiniões.
No entanto, como já observado, a reação governista à sua vulnerabilidade junto à opinião pública tende a ser a radicalização retórica, com ataques às instituições, a deslegitimação do processo eleitoral e ameaças de golpe.
Nesse quadro delicado, a tarefa das oposições é dupla. De um lado, cuidar das eleições, preparar candidaturas e alianças programáticas, pensar no primeiro e no segundo turno de 2022. De outro lado, é imperativo que permaneçam unidas, em diálogo permanente, em defesa da democracia, do calendário eleitoral e da posse dos eleitos.
O centro da agenda política é a questão democrática. É dever de todas as forças políticas, desse campo, cooperar na mobilização e no esclarecimento progressivo da população, no Congresso Nacional, na imprensa e nas ruas, a respeito desse ponto.